O VAMPIRO DE VILA VALQUEIRE - Conto Humorísitico de Terror - Jober Rocha
O
VAMPIRO DE VILA VALQUEIRE
(Jober Rocha, classificado no Concurso Literário
Bram Stoker de Contos de Terror)
Em Vila Valqueire, um bairro pobre do
subúrbio da cidade do Rio de Janeiro, onde residi com os meus avos durante a
infância, conheci um menino com o qual costumava brincar em uma pequena pracinha
situada perto de casa.
Ela era uma criança bastante diferente
das demais, razão pela qual, frequentemente, brincava sozinha e de forma isolada
em um canto mais escuro do jardim; já que, as demais crianças a evitavam.
Por sermos vizinhos de rua acabamos nos
tornando amigos e fiquei, assim, conhecendo toda a sua história, que a
continuação passo a relatar.
Desde que nascera sempre havia sido uma
criança muito sensível, destas que não podia ver sangue nem pessoas feridas.
Não que aquilo lhe causasse medo, mal-estar
ou nojo, porém, pelo contrário, o sangue e os ferimentos o atraiam. Ao ver
sangue sentia enorme vontade de bebê-lo. A luz do sol também o incomodava,
obrigando-o a cerrar as cortinas do quarto e a usar óculos escuros, mesmo
estando dentro de casa.
Seus pais nunca suspeitaram de nada e o
tratavam como uma criança normal; muito embora a sua mãe, logo que o trouxera
da maternidade, tendo feito um corte junto ao seio, ao colocar o bebê para
mamar notou que ele, ao invés de sugar o seio, sugava o sangue do ferimento.
Sua infância transcorreu normalmente,
sem nenhum fato importante que chamasse a atenção dos demais familiares e
amigos, a não ser que, sempre que alguma criança, brincando, se machucava de
sair sangue, ele logo se oferecia para lamber o ferimento, afirmando que fazendo
aquilo o ferimento parava de sangrar instantaneamente.
Seus pais sempre foram pobres e, com o passar
do tempo, quando o filho atingiu a puberdade, os genitores não podiam comprar,
todos os dias, as carnes suculentas que o jovem solicitava; fato este que
originava, por vezes, discussões e brigas no seio da família.
Em certa ocasião os pais notaram que os
dentes dele foram ficando pontiagudos, sendo que os caninos projetavam-se para
fora da boca.
As orelhas dele ficaram maiores e
afilaram na parte superior. As unhas também ficaram maiores e afiadas, como
garras de algum animal ou ave.
Nasceram-lhe grossos pelos no corpo e as
sobrancelhas ficaram grandes e cerradas. Sua aparência física foi, cada vez
mais, ficando parecida com a de um morcego.
Por essa época ele quase não saía mais
de casa e havia emagrecido muito, já que nenhum alimento, a não ser carne
sangrenta e o próprio sangue, lhe caía bem no estômago.
Seus pais, embora ignorantes, a certa
altura, premidos pela necessidade financeira, resolveram expô-lo à curiosidade
pública (evidentemente cobrando ingressos) em uma grande gaiola de metal,
especialmente mandada construir sob medida para ele.
Com o dinheiro arrecadado, a partir de
então, sua alimentação melhorou e ele já podia, agora, tomar quantos litros de
sangue bovino quisesse e mastigar grandes pedaços de carne crua e suculenta.
Para tanto, bastava que descesse do
poleiro (onde ficava pendurado pelos pés, de cabeça para baixo e meio adormecido
a maior parte do dia) e abrisse a geladeira que se encontrava dentro da gaiola,
dentro da qual haviam várias garrafas com sangue bovino e grandes pedaços de
carne de vaca.
Na atualidade a família dele toda vive
feliz na pequena casa de Vila Valqueire, já que a afluência do público é grande
e o preço das entradas tem acompanhado a alta da inflação.
Redes de TV e companhias
cinematográficas já ofereceram contratos para entrevistas; para trabalhos em
novelas de terror; para cenas de ‘dublê’ do ‘Batman’, do ‘Wolverine’; para
refilmagens das estórias do Conde Drácula, da Família Adams, etc.
Estes contratos, atualmente, estão
sendo analisados pelos advogados da família, que já solicitaram ao Ministério
das Relações Exteriores e ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente - IBAMA,
autorização para viagens do morcego ao exterior, desde que bem acondicionado em
uma gaiola no porão das aeronaves.
Neste particular, seus pais foram bem mais
inteligentes que os pais de Gregório Samsa, personagem do conto de Franz Kafka
‘A Metamorfose’, que, ao verem o filho se transformar em uma grande barata,
acabaram por conduzi-lo à morte, sem tirar nenhum proveito financeiro desta
feliz e rara oportunidade...
Natural do Rio de Janeiro, Jober Rocha é economista, doutor pela Universidade
de Madrid/Espanha e escritor com alguns prêmios recebidos em concursos
literários nacionais.
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