A BELA E O URSO - Narrativa Clássica Fantástica - Olaus Magnus
A BELA E O URSO
Olaus Magnus
(1490 – 1557)
Havia um homem rico no campo sueco que teve uma filha muito bela.
Tendo ido a moça a um recreio campestre com suas criadas, saiu-lhe um grande e mui espantoso urso; e, com a turbação, apartaram-se as suas companheiras em fuga por diversas partes no campo.
E o urso arrebatou a donzela. O mais brandamente que pôde, tomou-a em seus braços ferozes e a levou à sua cova, onde começou a tocar-lhe os membros e partes de seu formoso corpo com um novo gênero de codícia, para mais gozar de seus doces abraços que ofender a sua pessoa.
E a presa que teve em seu poder, para fartar a sua fome, converteu-a em satisfação de seu amoroso desejo, a ponto de convolar-se a ladra fera em leal amante.
E gozando da satisfação de sua fome, recompensou o ardor da gula com a fartura de Vênus.
E, para que mais regaladamente sustentasse a nova e querida hóspede, saía em busca dos gados que ali havia, trazendo de quando em quando alguma rês. E aquela que estava acostumada a comer regalados manjares, em poder do feroz amante, acostumou-se à comida tosca e cheia de sangue.
E a formosura da cativa tanto falou à dura ferocidade de seu raptor que, tendo-o primeiro temido como cruel executor de sua vida, vertedor de seu sangue, reconheceu-o depois por seu amante. E de sua mão — a de quem a princípio pensou ser devorada — recebia o manjar de seu alimento.
Por fim, o urso caiu em certos laços que lhe armaram. E, preso com cães e dardos, foi morto.
Então a natureza — benigna artífice — juntou estas duas matérias discordes. Com a amplitude da semente, deu calor às disformes bodas: e ela pariu, ao fim dos nove meses de sua prenhez, um menino que, por conta de sua geração, era monstro. E recebeu o sangue silvestre com os lineamentos e forma do corpo humano.
E, nascido o filho, seus parentes puseram-lhe o nome conforme o pai.
Uma vez criado, como soube a verdade de sua procriação, matou os matadores de seu pai, cujo filho, chamado Trugilo Sprachaleg, não foi menos brioso. E este engendrou a Ulfon, de quem descendeu Sueno e os demais reis da Dinamarca, como derivados de um princípio; e se continuaram na sucessão por muito largo tempo, segundo escreve Saxo.
Versão em português de Paulo Soriano a partir da tradução espanhola de Lorenzo de San Pedro (séc. XVII).
Fonte: “Historia de las Gentes Septentrionales” (manuscrito do séc. XVII - livro XVIII, capítulo 25).


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