LENDA DO FLAUTISTA ÍMPIO - Narrativa Clássica Sobrenatural - Padre Manuel Bernardes

LENDA DO FLAUTISTA ÍMPIO

Padre Manuel Bernardes

(1644 – 1710)


Já que experiências convencem melhor que autoridades e razões, ajuntarei outros casos portentosos, em confirmação de como este mau costume de dançarem homens e mulheres, sem respeito aos lugares sagrados, agrada aos demônios, e por eles o castiga Deus severissimamente.

Refere Tomás Cantipratense1 que em certa vila do Brabante, em Flandres, por ocasião da festa da dedicação de um templo, concorreram a dançar muitos mancebos e donzelas.

Entre eles, um tocou uma flauta e bailou com tanta desenvoltura e lascívia que a todos provocava a cantares pouco honestos.

Sobre a tarde, recolhendo-se todos a suas casas, levantou-se de repente uma horrível tempestade; porém o tangedor, sem medo algum, caminhando continuava o seu delírio.

Eis que uma nuvem negra dispara um raio, o qual lhe decepou cérceo um braço e lhe tirou a vida. Os da companhia, fugindo a toda a pressa, se esconderam em umas matas; e pouco depois viram vir dois cães ferozes, que levaram o braço daquele desgraçado.

Quiseram os amigos dar sepultura ao cadáver, e o pároco, que estava repugnante, veio enfim, por causas que alegaram, a admiti-lo no alpendre da igreja; porém, ao outro dia, acharam a sepultura aberta, e o corpo menos; deixando-nos presumir que os demônios, havendo já embolsado o principal, que é a alma, vieram arrecadar o resto, que é o corpo.


Nota:

1 Teólogo e hagiógrafo valão, que viveu entre 1201 e 1272.

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