O CAMPO MALDITO - Narrativa Clássica Sobrenatural - Casimir Puichaud
O CAMPO MALDITO
Casimir Puichaud
(1853 – 19...?)
Tradução de Paulo Soriano
Entre
Clessé, Saint-Germain-de-Longues-Chauraes e Fénéry, num campo dos domínios de
Bonnefontaine, pereceu, não sei quando — tanto tempo que faz! —, um homem,
certamente um pescador, provavelmente assassinado. Desde então, o campo do
crime, onde seu corpo descansa, é amaldiçoado.
Num
dia de inverno, estávamos eu e um amigo caçando em Bonnefontaine, onde temos uma
casinha. Decidimos voltar para casa, onde pernoitaríamos e retomaríamos a
caçada no dia seguinte.
Um
denso e frio nevoeiro nos engolfou no caminho de regresso. Em casa,
acomodamo-nos, descansando os pés sobre o cão da lareira, em frente a um belo
lume. A ceia foi curta e frugal.
Por
volta das oito horas, para nos livrarmos rapidamente da monotonia imposta pela
companhia um do outro, convidamos o fazendeiro a unir-se ao nosso serão.
Um
nevoeiro sucedeu à chuva, que caiu espessa, açoitando o telhado. Soprava um vento
forte. O fazendeiro chegou.
—
Meus senhores, boa noite. Vou contar-lhes uma história. E, você, meu garoto —
disse ele, falando com o filho —, vá dormir. Não precisa ouvir o que vou falar.
Meus senhores — prosseguiu —, sabem vocês que cultivo um campo amaldiçoado,
ali, bem pertinho, em frente a Saint-Germain.
“Em
certos dias, ao cair da noite, ouvem-se ali gritos assustadores. Por horas,
esses gritos se prolongam, intercalados por apelos desesperados e lamentos de
um homem em agonia. Para socorrer o infeliz, a gente, pressurosa, corre ao
campo. Mas não há sinal do homem, e de todos os cantos do prado elevam-se os
suspiros agonizantes, que faz o sangue gelar em nossas veias.
“Certa
Sexta-feira Santa, um grupo de caça passou pelo campo maldito. Os cães foram
atingidos por mãos invisíveis, e com uma violência tal que permaneceram onde
estavam, uivando miseravelmente. É difícil tirá-los vivos daquele lugar
sinistro.”
Ele
mal havia terminado sua história quando o vento redobrou. As venezianas bateram
violentamente. As águas das frágeis calhas caíam em tufos nas janelas.
Ouvíamos
a voz formidável da tempestade, meio entorpecida pela atmosfera cálida,
saboreando com deleite um velho vinho de Anjou, quando, de repente, uma enorme
massa, com um estrondo terrível, descendo da chaminé, invadiu o cômodo. Nossos
cães, tomados de terror, uivavam nos cantos das paredes. A sala, cheia de
fumaça, cobria-se de brasas. E nós, subitamente sacudidos de nosso torpor, vimo-nos
paralisados onde estávamos, olhando um para o outro, emudecidos, pálidos como cadáveres.
O
fazendeiro fez um grande sinal da cruz.
—
Há coisas — diz ele — sobre as quais não devemos falar. Dá azar.
E
partiu, murmurando orações.
Num
instante, para evitar que as camas pegassem fogo, varremos o cômodo, enquanto o
vento, enfurecido, assobiava e soprava cada vez mais forte. Percebemos que uma
rajada arrancara o cume da velha chaminé, e este ruíra, invadindo a vivenda aos
borbotões. Não sei como dormimos naquela noite. Mas, no dia seguinte, a chuva
tinha parado, e fomo-nos embora. Passamos e repassamos, sem nada escutar, pelo
campo mal-assombrado. Estive lá muitas vezes desde então. Ele parece o rouxinol
do poeta... sem palavras.
Fonte: “La Tradition en Poitou et Charentes. Art populaire, ethnographie, folklore,
hagiographie, histoire”.
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