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Mostrando postagens de fevereiro, 2023

O QUE A LUA TRAZ CONSIGO - Conto Clássico de Terror - H. P. Lovecraft

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  O QUE A LUA TRAZ CONSIGO H. P. Lovecraft (1890 – 1937) Tradução de Paulo Soriano   Eu odeio a Lua – e a temo – porque, quando ela ilumina certas cenas familiares e queridas, às vezes as converte em coisas estranhas e repugnantes.    Foi no verão espectral que a Lua brilhou no velho jardim por onde eu vagava. Era o espectral verão de flores narcóticas e mares úmidos, de folhagens que evocam sonhos selvagens e multicoloridos. E, enquanto eu caminhava à beira do riacho raso e cristalino, vi estranhas ondulações pontilhadas de luz amarela, como se aquelas águas plácidas fossem arrastadas por correntes irresistíveis para estranhos oceanos que inexistentes neste mundo. Silenciosas e faiscantes, brilhantes e funestas, aquelas águas amaldiçoadas pela Lua corriam de encontro a um destino ignoto; e isto enquanto, nas margens onduladas, flores de lótus brancas flutuavam, uma a uma, ao vento opiáceo da noite, e caíam desesperadamente sobre o riacho, rodopiando, horrivelmente, sob o arco da ponte

A DAMA DA MORTALHA - Conto de Terror - Paulo Soriano

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A DAMA DA MORTALHA Paulo Soriano     O bebê de tarlatana rosa emborcara no chão  com a caveira voltada para mim, num choro que lhe arregaçava o beiço,  mostrando singularmente abaixo do buraco do nariz os dentes alvos. João do Rio   — Ah, meu jovem Saul! Você é advogado e sabe muito dessa coisa injusta à qual chamamos Direito — disse-me o velho Roberval, numa Terça-Feira de Carnaval. — Deve ter estudado História do Direito, não é mesmo? — Somente um pouco de Direito Romano, confesso. — Sim, sim! — prosseguiu Roberval. — Os jovens não estudam mais essas coisas enfadonhas e antiquadas. Mas estou certo de que você pouco sabe da real “prática jurídica” de outrora. — Isso é verdade. Mas o que tem isto a ver com o Carnaval? — indaguei. — Bem — prosseguiu o ancião, bebericando a cervejinha —, tudo aconteceu, justamente, numa Terça-Feira Gorda. O bloco descera a Federação e passava, agora, à frente do  Campo Santo, o cemitério mais circunspecto de Salvador. Nessa ép

O BEBÊ DE TARLATANA ROSA - Conto Clássico de Horror - João do Rio

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O BEBÊ DE TARLATANA ROSA João do Rio (1881 – 1921)     — Oh! uma história de máscaras! quem não a tem na sua vida? O carnaval só é interessante porque nos dá essa sensação de angustioso imprevisto... Francamente. Toda a gente tem a sua história de carnaval, deliciosa ou macabra, álgida ou cheia de luxúrias atrozes. Um carnaval sem aventuras não é carnaval. Eu mesmo este ano tive uma aventura... E Heitor de Alencar esticava-se preguiçosamente no divã, gozando a nossa curiosidade. Havia no gabinete o barão Belfort, Anatólio de Azambuja de que as mulheres tinham tanta implicância, Maria de Flor, a extravagante boêmia, e todos ardiam por saber a aventura de Heitor. O silêncio tombou expectante. Heitor, fumando um gianaclis autêntico, parecia absorto. — É uma aventura alegre? — indagou Maria. — Conforme os temperamentos. — Suja? — Pavorosa ao menos. — De dia? — Não. Pela madrugada. — Mas, homem de Deus, conta! — suplicava Anatólio. — Olha que

DESFILE FÚNEBRE - Conto de Terror - Maycon Guedes

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  DESFILE FÚNEBRE Maycon Guedes     A terra das covas movimenta-se, abrindo passagem para que os pútridos defuntos retornem à superfície depois de anos de sono lúgubre. A população de Franco da Rocha, cidade marcada por inúmeros mistérios, foi avisada sobre uma maldição carnavalesca: jamais festejar o carnaval durante a noite de Quarta-Feira de Cinzas. O problema é que, de geração em geração, a tal lenda foi ficando esquecida, e cá estamos, nesse relato onde a mais fúnebre das festas aconteceu. No centro da cidade, três escolas de samba se preparam para começar o desfile, enquanto que, no cemitério não muito longe dali, defuntos macabros se aprontam para a nefasta folia.      Ninguém poderia imaginar que uma linda noite fresca, de céu tão limpo e repleto de estrelas, reservava um acontecimento amedrontador que faria o mundo virar pelo avesso, trazendo o inferno e seus demônios às ruas para participarem do primeiro dia de Quaresma. Folia na cidade; show de horrores no cemitério. Entre a

O MESTRE E SEU APRENDIZ - Conto Clássico de Terror - Joseph Jacobs

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O MESTRE E SEU APRENDIZ Joseph Jacobs (1859 – 1926) Tradução de Paulo Soriano   Vivia, no Norte do país, um homem muito instruído. O mestre conhecia todas as línguas sob o Sol, além de todos os mistérios da Criação. Tinha ele um grande livro, encadernado com pele de bezerro negro, com bordas e ferrolho de ferro, que permanecia sempre acorrentado a uma mesa presa ao pavimento. Para ler aquele livro, o mestre o abria com uma chave de ferro, e somente ele — e mais ninguém — acedia à obra, pois esta continha todos os segredos do mundo espiritual. O livro dizia quantos anjos havia no céu, como eles marchavam em suas fileiras, como entoavam as suas canções, quais eram os seus múltiplos misteres e qual era o nome de cada poderoso anjo. E falava, também, dos demônios, dizendo quantos deles havia, e quais eram seus vários poderes, seus afazeres, seus nomes, como poderiam ser invocados, como era possível impor-lhes tarefas e como os demônios poderiam ser acorrentados para servirem de