ENCONTROS FANTASMAGÓRICOS - Narrativa Clássica Sobrenatural - Thietmar of Merseburg


 

ENCONTROS FANTASMAGÓRICOS

Thietmar of Merseburg

(975 – 1018)

 

Para que nenhum dos fiéis em Cristo duvide da futura ressurreição dos mortos, senão deseje ardentemente as alegrias da bem-aventurada imortalidade, contarei o que soube haver acontecido na cidade de Walsleben — que, no passado, fora destruída pelos eslavos — depois sua reconstrução.

Nas madrugadas, o pároco de Walsleben costumava cantar as matinas na igreja. Certo dia, ao passar pelo cemitério, viu uma multidão rezando à entrada da capela sagrada.

Conservando a firmeza, preparou-se, fazendo o sinal da Santa Cruz. Depois, apreensivo, avançou por entre a multidão. Nela, o pároco reconheceu uma mulher, que tinha acabado de deixar esta vida.

A falecida se aproximou do padre e perguntou-lhe o que ele ali queria. Quando o padre lhe informou a razão da sua vinda, a defunta disse-lhe que já haviam preparado tudo para recepcioná-lo, eis que lhe era iminente partida desta vida.

 Em conformidade com a história contada localmente, esta previsão cumpriu-se pouco tempo depois, já que o padre veio mesmo a falecer.

***

Depois de me terem contado este fato, narrei-o à minha sobrinha Brígida, abadessa do mosteiro de São Lourenço, que, na época, estava acamada.

Ela não ficou nem um pouco surpresa com o que lhe narrei e contou-me a seguinte história sobre o bispo Baudry, que já fora o responsável pela sé de Utrecht.

O bispo tomara providências a que igreja de Deventer, então destruída, fosse reformada e novamente consagrada. Ao mister, encarregou um padre.

Certa manhã, o padre viu mortos, no interior da igreja, celebrando a missa e ouviu-os cantando salmos.

Quando contou ao bispo Baudry o que havia acontecido, foi-lhe ordenado que dormisse na igreja. Na noite seguinte, o padre, e mesmo a cama onde ele repousava, foram expulsos da igreja por arte dos defuntos.

Muito abalado, o sacerdote voltou ao bispo, que lhe ordenou que se munisse de relíquias sagradas e que aspergisse água benta à sua volta. Não podia, todavia, em hipótese nenhuma, abandonar a igreja que estava sob a sua custódia.

Na noite seguinte, conquanto temeroso, o padre, obedientemente, permaneceu acordado na igreja até que os mortos, chegando à hora costumeira, o ergueram e o conduziram ao altar. Depois, acendendo uma fogueira, e mantendo o seu corpo entre as chamas e as brasas, os espectros mataram-no.

Quando o bispo soube do ocorrido, ordenou que se fizesse um jejum penitencial de três dias, em prol do socorro à alma do padre falecido.

A minha sobrinha concluiu que poderia dizer muito mais sobre acontecimentos desta índole, se não estivesse doente.

—Assim como o dia é entregue aos vivos — disse-me ela —, a noite é o domínio dos mortos.

 

Versão em português de Paulo Soriano.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A MÁSCARA DA MORTE ESCARLATE - Conto de Terror - Edgar Allan Poe

O GATO PRETO - Conto Clássico de Terror - Edgar Allan Poe

O RETRATO OVAL - Conto Clássico de Terror - Edgar Allan Poe

OS TRÊS INSTRUMENTOS DA MORTE - Conto Clássico de Mistério - G. K. Chersterton