UMA PRISÃO - Conto Clássico Sobrenatural - Ambrose Bierce
Ambrose
Bierce
(1842 - 1913?)
Tendo assassinado o cunhado, era Orrin Brower,
de Kentucky, um fugitivo da Justiça. Da cadeia do condado, onde havia sido
confinado, à espera do julgamento, ele havia escapado golpeando o carcereiro
com uma barra de ferro, furtando-lhe a chave da porta que dava para o exterior
e desaparecendo na noite. Porque o carcereiro estava desarmado, Brower fugira
sem qualquer arma com que defender a liberdade recém-recuperada. Assim que se
viu fora da cidade, cometeu a loucura de embrenhar-se numa floresta. Isto foi
há muitos anos, quando aquela região era mais selvagem do que é hoje.
A
noite estava muito escura, sem lua ou estrelas visíveis. E como Brower jamais andara
por aquelas redondezas, e nada sabia sobre a configuração do lugar,
evidentemente não tardou a se perder.
Ele
já não poderia dizer se se afastava da cidade ou se caminhava de volta a ela – e
este era um assunto de grande importância para Orrin. Sabia que, em ambos os
casos, uma legião de cidadãos, com uma matilha de cães farejadores, logo
estaria ao seu encalço, e que suas chances de escapar eram mínimas. Mas ele não
queria cooperar em sua própria captura. Por uma hora que fosse a mais de
liberdade, valia a pena a perseverar.
De
repente, saiu da floresta e desembocou numa velha estrada, na qual viu,
indistintamente, a silhueta de um homem, imóvel na escuridão. Já era tarde
demais para recuar. O fugitivo sabia que, no primeiro movimento que fizesse em
direção ao bosque, seria, como ele explicou mais tarde, “crivado de balas”. E
assim ficaram lá os dois, estáticos como árvores, sentindo-se Brower quase sufocado
pelas batidas do próprio coração. O outro — ora, não há, quanto a este, registro
algum de suas emoções.
Um
momento depois —pode ter sido uma hora —, a lua navegou por um pedaço de céu
sem nuvem, e o homem perseguido viu que a visível encarnação da Lei erguia um
braço, e apontava significativamente para um lugar além dele. Ele entendeu.
Virando as costas para o seu perseguidor, caminhou, submisso, na direção
indicada, sem olhar para os lados, mal ousando respirar, a cabeça e as costas já
padecendo a profecia de uma bala.
Brower
era o mais corajoso dos criminosos que já sobrevivera para ser enforcado. Isto
era evidenciado pelas terríveis condições de perigo a que se expusera ao matar
friamente o seu cunhado. É desnecessário relacioná-las aqui. Tudo viera a lume
durante o seu julgamento, e a revelação de toda a tranquilidade com que enfrentou
toda aquela situação quase livrou o seu pescoço. Mas o que querem vocês? Quando
um homem valente é vencido, tem que se submeter.
Assim,
eles seguiram em direção à cadeia, percorrendo a velha estrada, ao longo da
floresta. Apenas uma vez Brower atreveu-se a olhar para trás. Somente uma vez, quando
estava mergulhado numa sombra profunda, e sabia que o outro permanecia ao luar,
virou-se para olhar. Seu captor era Burt Duff, o carcereiro, pálido como a
morte, exibindo ainda na fronte a marca lívida da barra de ferro. Orrin Brower não
quis saber de mais nada.
Por
fim, entraram na cidade, que estava toda iluminada, malgrado deserta. Somente
mulheres e crianças haviam ficado lá, mas não estavam nas ruas. O criminoso
tomou o seu caminho, diretamente para a cadeia. Dirigiu-se à entrada principal,
pousou a mão sobre a maçaneta da pesada porta de ferro, e a empurrou, sem que
ninguém ordenasse. Entrando, deparou-se com uma meia dúzia de homens armados. Então
se virou. Ninguém mais entrou.
Sobre uma mesa, no corredor, jazia o corpo morto de Burton Duff.
Versão em português de Paulo Soriano.
Ambrose Bierce é demais. Muito bom o conto e a tradução também. Parabéns👏👏👏
ResponderExcluirMuito obrigado!
ExcluirAbraços.
Paulo