O FANTASMA DO MORDOMO - Narrativa Clássica Sobrenatural - Sir Edward William

O FANTASMA DO MORDOMO

Sir Edward William

(1856 – 1937)

Tradução de Paulo Soriano


Há alguns anos, no início de janeiro, minha esposa e eu fomos para A—, onde chegamos numa quinta ou sexta-feira no final da tarde.

Terminado o jantar, nosso anfitrião, que nos alugava um quarto, nos disse que a casa era assombrada pelo fantasma de um mordomo que cometera suicídio. Acresceu que a irmã de nossa anfitriã o vira. Contou-nos que, noutra ocasião, dois homens, ali hospedados para as corridas de Doncaster, e alojados em quartos contíguos, acusaram, na mesa de café, um ao outro, de ter andado pelos corredores durante a noite, na qual abrira e fechara portas, quando, em verdade, na ocasião, nenhum dos dois saíra do apartamento. Disse-nos ainda o nosso hospedeiro que não gostava que o assunto fosse discutido, pois as criadas costumavam ficar assustadas e se punham a fofocar sobre a aparição.

No sábado ou domingo, percorremos a casa e, no decorrer do nosso passeio, fomos levados ao corredor que — cria-se — o fantasma frequentava, ao quarto em que a irmã de nossa hospedeira o tinha visto, e a um grande quarto no final do corredor, que, conforme nos disse o anfitrião, não era ocupado sempre que possível, porquanto era o apartamento predileto do espectro.

O quarto e o camarim designados para minha esposa e eu ficavam um pouco longe desse corredor e a ele chegávamos subindo três ou quatro degraus, transpondo um curto corredor, que dava par outro mais comprido.

Não pensei muito sobre a história, mas, durante toda a nossa visita, dormimos mal. Naquela naquela noite, ouvimos, ou pensamos ter ouvido, barulhos estranhos. Durante a primeira noite de nossa estadia, os únicos homens na casa, além do meu anfitrião e eu, eram o mordomo — um homem idoso de longos bigodes brancos — e um jovem lacaio que, suponho, tinha cerca de dezessete anos.

Na segunda-feira, meu anfitrião e eu caminhamos até uma mina de carvão vizinha. Por conta do passeio, não voltamos para o almoço até tarde — estimo que entre duas e meia e três horas da tarde. A chegada de um carregamento de mantimentos — ou algo assim — atraiu a minha atenção depois do almoço; depois, segui sozinho até o correio para postar uma carta. Retornando por volta das quatro horas, fui direto para meu camarim e troquei de roupa antes do chá. Lembro-me de que havia luz suficiente para fazê-lo sem nenhuma vela ou lampião.

Ao sair do meu quarto, tropecei levemente nos degraus que levavam ao corredor e, ao fazê-lo, vi, passando por ele, um homem de estatura mediana, de cerca de quarenta anos, com costeletas curtas descendo até a metade da face e usando, além de um boné, um casaco curto e escuro.

Fiz alguma observação no sentido de que estava ficando bem escuro, mas não obtive resposta. O homem seguiu, à minha frente, na mesma direção que eu tomara no corredor, em cujo final havia uma escada curta, que descia até a sala de fumantes. Era para lá que eu seguia e, se bem me lembro, ficava quase em frente a uma porta de baeta que levava aos aposentos dos empregados, e, creio — embora disso eu não tenha muita certeza —, em direção ao corredor que, conjecturava-se, o fantasma costumava enfaticamente transitar. De todo modo, quando cheguei ao topo da escada, perdi de vista o homem que seguia. Supondo que ele houvesse passado pela porta de baeta, julguei que, provavelmente, tratava-se do mordomo, que havia saído para uma caminhada à tarde.

No entanto, ao descer as escadas, e entrar na sala de fumantes, lá encontrei meu anfitrião com o mordomo, que estava fechando o ambiente e, evidentemente, tinha acabado de trazer a lâmpada.

Só depois que o homem deixou o lugar é que me ocorreu que não poderia ter sido o mordomo que eu vira antes, e, com esse pensamento, a história de fantasma retornou à minha mente.

Ainda assim, sabendo o quão era a história desagradável para meu hospedeiro, e a ponderar que a minha mulher ficara profundamente perturbada com os barulhos em nosso quarto à noite, decidi não contar nada sobre isso a ninguém antes de nossa partida, que se deu na manhã seguinte. Somente participei a experiência à minha esposa quando nos dirigíamos à estação.

Muito tempo depois, contamos a história ao nosso anfitrião e esposa, quando os encontramos em Londres, mas deles não esperei uma explicação razoável. Posso dizer que, embora os fatos que relatei sejam verdadeiros, sou completamente incapaz de acreditar na existência daquele fantasma ou de explicar a impressão vívida da cena, que ainda permanece comigo.


Fonte: Lord Halifax’s Ghost Book, Robert MacLehose and Company Ltd., The University Press, Glasgow, 1936.

 

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