O VAMPIRO DA SÉRVIA - Narrativa Clássica Verídica de Terror - L. de Beloz
O VAMPIRO DA SÉRVIA
L. de Beloz
(Séc. XVIII)
Tradução de Paulo Soriano
Para satisfazer às demandas do senhor abade dom Calmet acerca dos vampiros, o subscritor tem a honra de assegurar que não há nada mais verdadeiro e certo do que aquilo que ele, induvidosamente, leu nos atos públicos e impressos, insertos nos jornais de toda a Europa; mas, dentre todos esses atos públicos que apareceram, o senhor abade deve ater-se, como um fato verdadeiro e notório, ao que resultou da delegação de Belgrado, constituída por Sua Majestade Imperador Carlos VI, de gloriosa memória, e comandada por sua Alteza Sereníssima o finado Duque Carlos Alexandre de Württemberg, à época vice-rei ou governador do reino da Sérvia; mas não posso, agora, citar o ano, o mês, ou o dia, por não dispor dos documentos correspectivos.
O citado príncipe enviou uma delegação de Belgrado, constituída, meio a meio, por civis e oficiais militares, para que, juntamente com ao auditor-geral do reino, se dirigisse a uma vila, onde um famoso vampiro, falecido há vários anos, causava excessivos malefícios à sua gente — note-se que é apenas em sua família, e entre seus próprios parentes, que esses sugadores de sangue comprazem-se em destruir a nossa espécie.
A delegação era composta por pessoas e súditos reconhecidos por sua moral e sabedoria, gente irrepreensível e mesmo douta em ambas as classes da comitiva. Os membros da delegação prestaram juramento e foram acompanhados pelo tenente dos granadeiros do regimento do príncipe Alexandre de Württemberg e por granadeiros do indigitado regimento.
Todas as mais honestas pessoas, que estavam em Belgrado, incluindo o próprio duque, juntaram-se a esta delegação para serem testemunhas oculares da verdadeira prova que estava prestes a ser feita.
Chegando ao lugar, constatou-se que, no período de quinze dias, o vampiro, tio de cinco sobrinhos e sobrinhas, já havia matado três deles e mesmo um irmão seu. Chegara a vez da quinta vítima, uma linda jovem, sobrinha sua, e o vampiro já a sugara duas vezes, quando a triste tragédia foi evitada com as medidas a seguir relatadas.
Não muito longe de Belgrado, e acompanhada pelos comissários que haviam sido nomeados, a comitiva seguiu publicamente até a vila, quando já anoitecia, e chegou ao túmulo do vampiro. A minha fonte não me soube precisar as circunstâncias da época em que os mortos anteriores foram sugados, nem me participou os detalhes do assunto. Mas, sabia-se — tão violento que lhe fora o tormento —, que a pessoa ali sepultada, uma vez sugada, reduzira-se a um lastimável estado de langor, fraqueza e cansaço. O cadáver já estava enterrado há cerca de três anos. Via-se, em seu sepulcro, uma luz semelhante à produzida por uma lamparina, malgrado não tão intensa.
Aberto o túmulo, encontraram um homem tão íntegro e saudável quanto qualquer um de nós presentes. Tinha os cabelos, os pelos corporais, as unhas, os dentes e os olhos — estes semicerrados — tão firmemente presos ao corpo quanto estariam nos do que ainda viviam e existiam. O seu coração palpitava.
Então, tiraram-no do sepulcro. Embora não fosse verdadeiramente flexível, àquele corpo não faltava parte nenhuma, quer na carne, quer nos ossos. Então, traspassaram-lhe o coração com uma espécie de lança de ferro encurvada e pontiaguda. Uma substância esbranquiçada e fluida saiu mesclada ao sangue, que predominava naquela mistura, mas sem exalar mau cheiro. Depois, cortaram-lhe a cabeça com um machado semelhante ao usado nas execuções da Inglaterra; dela também fluíram substância e sangue — à semelhança das que acabei de descrever —, mas mais em maior quantidade ao fluido que verteu do coração.
Finalmente, o cadáver foi lançado de volta à tumba, e coberto com bastante cal viva, a fim de que se decompusesse mais rapidamente.
A partir de então, a sobrinha, que havia sido sugada duas vezes, passou a sentir-se melhor.
Forma-se, na parte do corpo onde as vítimas são sugadas, uma mancha muito azulada; mas a sucção não se opera sempre no mesmo lugar: pode ocorrer em uma ou em outra parte do corpo.
Este é um fato notório, atestado pelos atos mais autênticos e passado diante dos olhos de mais de 1.300 pessoas, todas dignas de crédito.
Fonte: Augustin Calmet, Dissertations sur les apparitions des anges, des démons et des esprits, et sur les revenants et vampires de Hongrie, de Bohême, de Moravie et de Silésie.
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