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KALI - Conto Clássico de Horror - Guy de Maupassant

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KALI 1 Guy de Maupassant (1850 – 1893) Tradução de autor anônimo do séc. XIX O almirante de la Vallée, que parecia dormitar no seu cadeirão, pronunciou na sua voz de velho: — Tive uma pequena aventura de amor, muito singular; querem que a conte? E falou, sem se mexer do fundo da sua ampla cadeira, conservando nos lábios esse sorriso enrugado que nunca o abandonava, sorriso à Voltaire que o fazia passar por um espantoso cético. I — Tinha eu então trinta anos e era tenente de marinha, quando me encarregaram de uma missão astronômica na Índia Central. O governo inglês proporcionou-me todos os meios necessários para levar a minha empresa a cabo, e entrei com uma comitiva de alguns homens nesse país estranho, surpreendente, prodigioso. Seriam necessários vinte volumes para contar essa viagem. Atravessei regiões inverossimilmente magníficas; fui recebido por príncipes de uma beleza sobre-humana e vivendo numa incrível magnificência. Pareceu-me, durante dois meses, que marchava ...

A CASA MAL-ASSOMBRADA - Narrativa Clássica Verídica Sobrenatural - Plínio, o Jovem

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  A CASA MAL-ASSOMBRADA Plínio, o Jovem 1 (61 ou 62 – 114 d. C.)     Havia em Atenas uma casa ampla e confortável, mas de má reputação e perniciosa à saúde.  No silêncio da noite, ouviam-se  ruídos  de ferro e, se se prestava bem atenção, escutava-se o estrépito de correntes, que a princípio parecia vir de longe, mas que,  depois,  se aproximava paulatinamente.  Em seguida, surgia o fantasma de um velho consumido pela fraqueza e pela miséria,  de barba longa e cabelos eriçados. Tinha grilhões nos pés e correntes nos pulsos, que ele agitava e sacudia terrivelmente. Em razão da aparição, os moradores da casa passavam, amedrontados, em vigília, tristes e terríveis noites.  A prolongada insônia trazia a enfermidade, e esta, intensificada pelo medo, causava a morte, pois, malgrado o espectro não aparecesse durante o dia, a sua memória ficava impressa nos olhos e, assim, o terror se prolongava além das próprias causas. P...

A NOIVA DE CORINTO - Conto Clássico de Terror - Amado Nervo

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A NOIVA DE CORINTO Amado Nervo (1870 – 1919) Tradução de Paulo Soriano Havia na Grécia, em Corinto, uma família composta pelo pai, pela mãe e por uma filha de dezoito anos. A filha morreu. Passaram-se os meses e seis já se tinham transcorrido quando um jovem, amigo dos pais, foi passar alguns dias na casa deles. Deram-lhe um quarto relativamente separado dos demais e, certa noite, uma jovem de rara beleza bateu discretamente à sua porta. O jovem não a conhecia; mas, seduzido pela beleza da donzela, teve a cautela de não lhe fazer impertinentes indagações. Um amor delicioso nasceu daquele primeiro encontro, um amor em que o jovem saboreava uma estranha sensação de profundidade, de mistério, mesclada a um pouco de angústia… A jovem ofereceu-lhe o anel que usava num dos seus longos dedos de marfim. Ele retribuiu com outro… Muitas coisas ingênuas e suaves brotaram dos lábios dos dois. Na Amada havia um tênue resplendor e melancolia e uma espécie de seriedade prematura. Nas s...

A MANCHA INDELÉVEL - Conto Clássico Insólito - William Dean Howells

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A MANCHA INDELÉVEL William Dean Howells (1837 – 1920) Tradução de Luciano Barreto Todos que haviam cruzado a porta antes de mim, haviam entregado suas cabeças, e eu as via colocadas em uma longa fileira de vitrines que estavam encostadas à parede, em frente. Seguramente nessas vitrines não entrava ar contaminado, pois as cabeças se conservavam em forma admirável, quase como se estivessem vivas, ainda que lhes faltasse o fluxo do sangue debaixo da pele. Devo confessar que o espetáculo me causou um medo súbito e intenso. Durante verdadeiro tempo senti-me paralisado pelo terror. Mas era o caso que ainda incapacitado para pensar e para atuar, eu estava ali: tinha passado o umbral e tinha que entregar minha cabeça. Nada poderia evitar essa macabra experiência. A situação era, em verdade, aterradora.  Parecia que não existia distância entre a vida que tinha deixado atrás, do outro lado da porta, e a que iria se iniciar nesse momento. Fisicamente, a distância seria de três metros,...