UM SONHO DE VAMPIRA - Conto de Terror - Maísa Vilanova




UM SONHO DE VAMPIRA


Lorena chegou a casa e se passou direto para o quarto. Abriu o guarda-roupa, retirou uma toalha limpa e entrou no banheiro. Enquanto a água deslizava pelo seu corpo, ela relembrava o que tinha se passado na noite anterior.

            Ela havia ido ao seu encontro marcado virtualmente, pois estava louca para conferir se a pessoa da foto era a mesma que iria encontrar, pois não acreditava no que via no perfil. Enquanto dirigia pela rua erma, ela olhava para as casas, todas estranhas, com aspecto sombrio. Ela nunca tinha ouvido falar daquele bairro em São Paulo. Logo mais adiante, a rua mergulhava numa escuridão quase que total, se não fosse a iluminação da lua cheia. Ela chegou ao final da rua e se deparou com uma casa enorme que ficava bem de frente para a rua, anunciando que ali era a parada final. Então, Lorena achou melhor dar a marcha à ré e sair dali, mas quando olhou de novo para a frente, viu a imagem de uma mulher que foi iluminada pelos faróis do carro. Lá estava ela, a loira do perfil, alta, exibindo um corpo de dar inveja em qualquer mulher. Lorena ficou muda. A loira se aproximou e bateu no vidro, sorrindo sem mostrar os dentes, e pediu que ela entrasse com o carro.

            Ao deixar o carro no jardim, Lorena acompanhou a loira para a entrada da casa. O coração de Lorena começou a bater desordenado. E, para aumentar sua aflição, a loira lhe perguntou se ela pretendia fugir. Lorena meneou a cabeça negativamente. Então, a loira abriu a porta da casa e a convidou a entrar.

            Lorena sentiu um arrepio assim que entrou na sala de estar. Os sofás eram da cor preta e vermelha, as cortinas eram compridas e escuras também. De repente, Lorena soltou um grito e a loira sorriu em seguida. Era apenas um gato preto que havia se enroscado nas pernas da Lorena. A loira se agachou e pegou o bichano no colo. Logo depois, o gato se soltou dos braços dela e saiu correndo em disparada, como se tivesse visto alguma caça. A loira se voltou de novo para Lorena e perguntou se ela queria beber alguma coisa. Ela fez que sim. E enquanto a loira se dirigia para a cozinha ou adega, Lorena se assustou com o vento que entrou por uma das janelas, fazendo com que a cortina balançasse. E o barulho do vento fez seu corpo gelar. Mais uma vez, ela sentiu vontade de ir embora. E, ao se virar para a saída, se deparou com um quadro enorme, que ficava ao lado da porta. Como não tinha percebido ele, assim que entrou? Ela levou um susto e deu um passo para trás, ouvindo o miado do gato logo em seguida, pois quase tinha pisado no bichano, que passava por ela. Mas que diabo de gato! Ao se virar de novo para o quadro, ficou como que fascinada pela pintura. Parecia uma dessas pessoas que tinha vivido séculos atrás. Ela se aproximou e percebeu que a mulher da pintura, tirando os cabelos negros, se parecia muito com a loira. Só poderia ser uma ancestral sua. De repente, ela piscou os olhos, achando que estava vendo coisas, pois a pintura dos olhos tinha assumido a cor vermelha. Lorena piscou e olhou de novo. E agora a cor dos olhos da pintura era preta, diferente do verde dos olhos da loira. Lorena achou que estava imaginando coisas, passou a mão pelos cabelos, jogando-os para cima e se virou de novo para perscrutar o resto da sala. Não eram só os sofás e as cortinas que eram esquisitos, os móveis também eram. Pareciam ser de outros séculos.

            A loira surgiu de novo, trazendo duas taças com vinho, sorrindo, ainda sem mostrar os dentes, andando igual uma serpente pronta a dar o bote. Ela estendeu uma das taças para Lorena e a olhou, levantando as sobrancelhas arqueadas. Mas que mulher é essa! Pensou Lorena. Como que hipnotizada, ela ergueu a mão direita e pegou uma das taças, levando-a em seguida à boca. Nisso, um estalo cortou os ares, assustando Lorena. Era um relâmpago que rasgava o céu. Logo depois, foram estrondos de trovões. E então começou a chover. Mais uma vez a cortina balançou. A loira se passou para a janela que estava aberta e a fechou.

            ¾ Vamos para o quarto?

            Aquilo não foi uma pergunta, foi uma intimação. E, como que hipnotizada, Lorena a seguiu, admirando seus quadris largos, suas nádegas polpudas e sentindo o perfume que exalava dela. Antes mesmo de chegar ao quarto, Lorena já estava totalmente inebriada, como se tivesse sido dopada.

            Lá dentro, ela teve a sensação de estar sendo observada. A loira pediu licença para trocar de roupa e sumiu por uma das portas, que deveria ser do closet ou do banheiro. Lorena continuou com a sensação de estar sendo observada e se virou para uma das paredes. Lá estava mais um quadro que parecia ter séculos de existência. Ela se aproximou dele e, logo em seguida, deu um grito histérico. Uma caranguejeira tinha caído bem em seu ombro. Ainda paralisada pelo medo, ela apenas continuou gritando. A loira apareceu, pegou um pente e espantou a caranguejeira do ombro da Lorena.

            ¾ Essa época de chuvas atrai muitos aracnídeos! É por isso que a Sofia não sossega atrás deles.

            ¾ Quem é Sofia?

            ¾ Minha gata! Aquela que você viu na sala. Não precisa ter medo, a caranguejeira já foi embora.

            Nada parecia abalar a loira, que continuava calma e insinuante. Lorena, mais uma vez, sentiu vontade de ir embora, mas antes que esboçasse qualquer coisa, a loira falou.

            ¾ Eu não vou deixar você ir!

            E a puxou para a cama, toda oferecida. A sensação de estar sendo observada ainda assustava Lorena, que não parava de olhar para os lados. Ao mesmo tempo em que sentia medo, estava excitada sexualmente por estar com uma mulher tão linda.

            A loira a fez encará-la e ofereceu a boca para ser beijada. Então, Lorena viu sangue escorrer pelos cantos dos lábios dela e se assustou. Mas a loira a segurou e se agarrou a ela, grudando sua boca na dela, fazendo-a engolir um líquido quente. Depois falou, olhando-a com desejo.

            ¾ É só vinho. Fica bem quentinho.

            Lorena sentiu aquele líquido quente atravessar sua garganta, passar pelo seu estômago e ir parar em sua vagina, esquentando-a, preparando-a para o sexo. Então, a loira a jogou na cama, tirando a roupa dela. Logo em seguida também tirou a sua, deixando Lorena mais excitada ainda. E após tê-la feito cair em êxtases, a loira aproximou o rosto do dela e sorriu, mostrando dois caninos bem afiados, antes de mordê-la na jugular. E então, Lorena desmaiou.

            Ela despertou e sentiu um cheiro forte de cachorro mal lavado. Ao se virar para o lado, se deparou com uma criatura peluda, da altura de um homem, com a boca de lobo, babando que nem cachorro. Lorena gritou, mas a criatura abafou seu grito e se jogou em cima dela. Ela gritou mais ainda. Foi então que a loira surgiu de novo, usando uma camisola esvoaçante. Novamente o vento entrava pela janela, os relâmpagos pareciam estar em guerra, e os trovões pareciam gritar mais que antes. E Lorena gritando, tentando se livrar daquele monte de pelos que insistia em ficar em cima dela, tentando lambê-la.

A loira se passou para a criatura e a puxou por uma das pernas. Então, Lorena viu o vermelho dos olhos dela. E quando a loira gritou com a criatura peluda, Lorena viu os dois caninos bem salientes que ela tinha. E foi com uma força descomunal que a loira puxou o lobisomem de cima da Lorena.

¾ Eu já disse para tu não voltares! Eu não te quero mais!

E depois os dois travaram uma luta. Lorena piscava os olhos, se perguntando se o que via era verdade ou alucinação. Só poderia ter alguma coisa naquela bebida que a loira havia lhe servido. Aquilo não estava normal. Ela viu a loira subir pelas paredes literalmente, se armando para dar uma voadora no lobisomem. O bicho mostrou as garras para a loira e tentou rasgá-la, mas a loira, agora, parecia flutuar pelo quarto. Lorena se mantinha paralisada, boquiaberta, sem acreditar no que via. E então, as pinturas dos quadros da parede começaram a se mover. Logo depois, Lorena viu a cama ficar cheia de caranguejeiras. Então, ela desejou que a Sofia aparecesse para espantar aqueles bichos dali. E a gata realmente apareceu, mas foi para pular na cara do lobisomem, arranhando-o todo. E aí, o teto sumiu e o céu surgiu cinzento e tenebroso. Lorena olhou para o alto e viu as nuvens girando em torno da lua cheia. Estava tão paralisada que sequer conseguiu se mexer. Então, ela sentiu a loira cair na cama também. Ela tinha sido empurrada pelo lobisomem. E quando ele se preparou para dar o bote, a loira abriu seu bocão e o mordeu no pescoço, arrancando um pedaço de sua carne. O bicho recuou e caiu próximo a uma parede. E aí, a loira se levantou, abriu a gaveta de um móvel, tirou de lá um objeto que parecia uma estaca e a enfiou no lobisomem. Lorena desmaiou de novo.

Quando o dia amanheceu, Lorena acordou e se viu na cama, sozinha. Na sua cabeça ainda vinha tudo o que ela tinha presenciado na noite anterior. Enquanto tentava colocar os pensamentos no lugar, sentiu um monte de pelos em seu colo e logo deu um grito, lembrando-se do lobisomem da noite anterior. Mas era apenas a gata Sofia, que vinha lhe dar bom dia. Em seguida, a loira também apareceu, lhe trazendo o café da manhã. E aí, Lorena não entendeu mais nada.

¾ Bom dia! Dormiu bem?

Ainda sonolenta e confusa, ela respondeu.

¾ Tive a impressão que tinha um... Um... Lobisomem aqui ontem.

A loira sorriu.

¾ Ele até parece um bicho mesmo, pois é muito peludo. Mas foi apenas meu ex-marido que apareceu aqui sem ser convidado. Ele não se conforma com o fim do nosso relacionamento.

E encerrou o assunto, beijando a Lorena na boca.

Lorena tomou o café, depois se vestiu e olhou para o quarto, que parecia bem diferente do da noite anterior. Aí, ela ficou mais confusa ainda e chegou à conclusão de que realmente havia alguma coisa na bebida ingerida à noite. Ela se despediu da loira e caminhou em direção à porta. Antes de sair, ela se lembrou de algo.

¾ Engraçado. Mas eu ainda não sei seu nome. Só te conheço pelo nome do perfil: loira.

E a loira sorriu, sem mostrar os dentes.

¾Tione Adrastéia, minha linda! Te espero à noite de novo!

Maísa Vilanova é formada em jornalismo e autora de oito livros, lançados no formato e-book pelas amazon.com e saraiva.com (Inocência e Pecado, Verdades e Mentiras, Caminhos Cruzados, Toda forma de amar, Vida de escritora erótica, Algumas de minhas partes e os infanto-juvenis Mariazinha e a chuva e Zequinha e o gato Zoroastro). Leu mais de duzentos livros, conhece vários lugares do Brasil e já viajou para a Europa.


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