O TELEGRAMA - Conto Cruel - Mário Terrabatava



O TELEGRAMA
Mário Terrabatava

O Sr. Ono convocou ao seu escritório dois de seus mais valorosos subalternos.

O Sr. Yamamoto era inteligente e sagaz. Cumpria as suas tarefas com rapidez e precisão. Mas não poria a mão no fogo por ele.

 O Sr. Fujimura era o mais antigo, dedicado e fiel de seus funcionários. Não era tão brilhante e competente quanto Yamamoto, mas era confiável.

Yamamoto era jovem e solteiro. Vivia com o pai, comerciante de chá. Fujimura já passara dos cinquenta anos. Era casado e pai de oito filhos, quatro deles ainda pequenos.

O Sr. Ono passara a noite em claro, mas não conseguira tomar a decisão. Agora, diante daqueles homens, teria que deliberar. A diretoria ordenou que dispensasse um dos dois.

Os dois funcionários, silenciosos, esperavam a decisão.

— Senhores — disse o Sr. Ono —, vocês sabem que eu não tenho outra opção. Devo dispensar um de vocês. Eu sofro muito com isso... Temo ser injusto... Vivemos tempos difíceis... A decisão que tomo... A escolha que faço, nada tem de pessoal...

Neste instante, o Sr. Ono foi interrompido pela Srta. Saito.

— Sr. Ono, chegou um telegrama urgente da matriz.

— Srta. Saito, aguarde um momento.

— Chefe, é um expediente urgente da diretoria.

— Nada é mais urgente que a deliberação que estou tomando agora. Estes homens merecem respeito. Não lhes quero prolongar a agonia.

A Srta.  Saito entregou o telegrama e se retirou.

— Sr. Ono, seria bom que o senhor lesse o telegrama —aconselhou gentilmente  o experiente Fujimura. – Pode ser algo importante e inadiável.

— Ele pode esperar, amigo – respondeu o chefe. — Preciso encerrar logo tudo isto.

Se dependesse do coração do Sr. Ono, o leal Fujimura permaneceria na empresa. O que seriam dele, esposa e filhos menores? Como conseguiria um novo emprego, com a idade avançada, naqueles difíceis tempos de pós-guerra? Mas estes mesmos tempos difíceis exigiam presteza e eficiência, não lealdade.

Havia lágrimas nos olhos do Sr. Ono quando ele anunciou:

— Lamento, Sr. Fujimura. Lamento muito.

Os homens apertaram as mãos. Fujimura e Yamamoto saíram da sala sem se olhar.

Somente então o Sr. Ono lançou os olhos no telegrama. Leu-o duas, três vezes.

Correu para a porta. Precisava alcançar Fujimura imediatamente.

Neste mesmo instante, chegaram os gritos ao seu gabinete.

 — Oh, não! —  O Sr. Ono deixou escapar dos lábios este uivo lastimoso.

É que o Sr. Fujimura acabara de se jogar da janela do 8º andar.

Desesperado, o Sr. Ono correu à janela. Viu o corpo do fiel funcionário estatelado no chão. Ao debruçar-se, chocado e cheio de remorso, deixou cair o telegrama. Após flutuar pachorrentamente no ar, o papel pousou com delicadeza na poça formada pelo sangue que ainda fluía, aos esguichos, do ouvido estourado do infeliz suicida.

“FAVOR DESCONSIDERAR ORDEM ANTERIOR PT AMBOS FUNCIONARIOS DEVERÃO SER MANTIDOS QUADROS EMPRESA PT PERMANECIA IMPRESCINDIVEL PT. HORI TAKETO VG DIRETOR DE PESSOAL”, dizia o telegrama.

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