O FANTASMA - Conto de Terror da Antiguidade Clássica - Luciano de Samósata



O FANTASMA
Luciano de Samósata
(c.125 – c.181)

A casa – disse Arignoto – permanecia desabitada há muito tempo por causa de espantosas aparições. Se alguém nela se instalava, logo fugia aterrorizado, perseguido por um espectro terrível e turbulento. A casa estava em ruínas, com o telhado caindo, e ninguém se atrevia a adentrá-la.

Quando ouvi estas coisas, peguei os meus livros (tenho muitos tratados egípcios sobre essa matéria) e me dirigi à casa na hora do primeiro sono, em que pesem as tentativas de meu anfitrião em dissuadir-me. A este só faltou agarrar-me assim que soube aonde eu ia:  à minha  irremissível perdição, segundo pensava.

Com uma tocha, entrei sozinho. Depois instalar o lume na sala principal, pus-me a ler tranquilamente, sentado no chão. Neste ínterim, apareceu-me o fantasma que, acreditando que eu era uma pessoa comum, esperava aterrorizar-me, conforme fazia com os demais. Exibia-se imundo, com desgrenhada cabeleira, e mais turvo que a escuridão. Colocou-se junto a mim e tentava me atacar por todos os lados, procurando subjugar-me de todas as maneiras. Transformava-se em cão, touro e leão. Então, empreguei o mais terrível esconjuro e, encantando-o com palavras egípcias, logrei acuá-lo em um canto sombrio da sala. Tendo finalmente notado o lugar para onde ele fugira por sob o chão,  deitei-me e dormi pelo resto da noite.

Pela manhã, quando todos já haviam pedido as esperanças e acreditavam que me encontrariam morto, como todos os demais, saí inesperadamente à presença das pessoas e segui ao encontro de Eubátides, a quem disse que, doravante, poderia habitar a casa, agora purificada e livre dos seres aterrorizantes.

Acompanhado por ele e muitos outros que me seguiam, atraídos pelo extraordinário acontecimento, chegamos ao local onde o espectro se metera e ordenei que cavassem com pás e enxadas. Assim o fizeram e encontraram, a cerca de uma braça da superfície, um cadáver bem antigo, cuja figura era composta apenas de ossos. Nós o recolhemos  e lhe demos sepultura. Desde então, a casa deixou de ser assombrada por espectros.


 Versão em português (tradução indireta): Paulo Soriano.
Imagem: Jasmin Kay

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