A FÊMEA PODEROSA - Conto de Terror - Paulo Valença
A FÊMEA PODEROSA
Paulo Valença
1
O
idoso à cadeira de balanço.
O
rosto branco, pálido, ferido por rugas; os lábios finos, cerrados; o olhar
perdido; os gestos lentos; o mutismo...
O
retrato da velhice.
Como
filho, ele, Eduardo, sensibiliza-se e, indaga-se: Um dia, encontrar-se-á também
velho, entregue ao próprio mundo íntimo, numa fuga? Como saber o amanhã, que, é
uma incógnita, aliás, necessária, pois quais as consequências se soubéssemos de
já, o que passaríamos?
Sim,
tudo com a sua lógica.
Então,
ergue-se do sofá e fala à mãe, no outro sofá:
—
Mãe, vou dar uns “giros” por aí.
—
A essa hora tarde da noite? Vá, mas, tenha cuidado. A noite tá muito violenta!
Ele
sorri, tentando lhe apaziguar o espírito:
—
Tenho cuidado, mãe. Fique tranquila.
A
idosa, Dona Carmem, nada responde.
Eduardo
está cada vez mais parecido com o pai. O sorriso, a voz...
O
rapaz chega ao terraço e, para o velho:
—
Pai, vou sair um pouco.
—
Está muito tarde... Mas, vá, Eduardo. Você é novo ainda, precisa se distrair.
Deixe pra ficar em casa eu e sua mãe, que estamos velhos e o lugar certo pra
gente é mesmo ficarmos em casa.
O
filho afasta-se.
A
cabeça tombada sobre o ombro esquerdo. As pernas abertas em arco. Os braços
longos, secos. A cabeleira ondulada, negra...
—
A cópia do Amaro.
A
voz baixinha de Dona Carmem e, o sorriso irônico.
2
Dirige
o carro, que, ante a hora avançada da noite, tem o trânsito de veículos e
pedestres reduzido e, assim, facilita o movimento do carro na avenida.
Os
edifícios altos, modernos, bonitos iluminados. As varandas desertas. As
calçadas com um ou outro transeunte. A moto que com o escape aberto,
barulhenta, passa em velocidade. A praia à esquerda, de coqueiros que agitam as
folhas ao vento frio da madrugada que nasce, e que faz o rapaz sentir-se bem,
nesse quase deserto no qual está integrado. Ir para aonde? E avista, à direita,
o bar-restaurante com casais às mesas na calçada, carros estacionados ao
meio-fio, no oitão deste, a agitação dos que curtem a bebida, a “paquera” das
conquistas...
Aproxima-se
e estaciona o carro entre outros, no oitão do estabelecimento.
Abre a porta e salta.
Tomar
umas cervejas com “tira-gosto” e, se possível, conquistar uma bela morena para
os prazeres do sexo num motel próximo.
Curtir
o presente, porque o amanhã é incerto, com alegrias e tormentos.
3
Os
cabelos lisos, negros, longos; o rosto moreno de traços bem definidos; os olhos
grandes, negros; o sorriso de covinhas, num convite...
O
rapaz, então, se erguendo da mesa, aproxima-se, numa decisão amadurecida
durante segundos.
—
Boa noite.
—
Boa noite, quero dizer... Madrugada.
Sorriem
e ele ocupa a cadeira a frente da bonita jovem.
—
Aceita um copo de cerveja geladinha?
—
Aceito, com prazer.
Ela
continua sorrindo. Esse não resistiu ao seu “charme” de poderosa fêmea e...
Converte-se em nova vítima do seu desejo de sangue.
4
No
leito o corpo semidespido.
No
rosto pálido, os olhos abertos, ante a perplexidade do que sofreu...
Envergando-se,
o sargento Marcelo observa os dois furinhos paralelos, já arroxeados, ao lado
esquerdo do pescoço e, após rápida análise, voltando-se ao seu auxiliar, o
soldado Mateus, fala o que deduz:
—
Mais uma vítima dos furinhos no pescoço... É como se o sujeito tivesse sido
atacado por um animal, que lhe sugou o sangue!
O
auxiliar reflete. Um animal que suga o sangue... Mas, será que realmente
existem vampiros?
Calados,
os policiais permanecem lado a lado, intrigados ante o mistério do ataque
sofrido pelo rapaz.
Ao
centro do quarto a janela aberta, pela qual fugiu o... Vampiro?
Prático,
profissional, o sargento pelo celular se comunica com os colegas, chamando-os:
—
É, outro morto com os furinhos misteriosos. Anote aí o endereço do motel.
Devagar,
o soldado encaminha-se à janela, onde estende a atenção ao que há fora.
Edifícios.
O céu azul, de nuvens brancas preguiçosas. O movimento nervoso do trânsito, dos
veículos e pedestres, que se assemelham a formiguinhas integradas ao traçado
dos seus destinos... Tudo seguindo uma ordem
de continuação, porque haja o que houver, a marcha prossegue...
—
E... As mortes também.
Conclui
Mateus o que pensa.
Ilustração: Fagner Bezerra
Para
ler a coletânea de contos “Os Vampiros
Estão Soltos”, de Paulo Valença,
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