OS HOMENS-LOBOS DE NEUROS - Narrativa Clássica de Terror - Antonio de Torquemada



OS HOMENS-LOBOS DE NEUROS
Antonio de Torquemada
(c. 1507 – 1569)


Na terra dos moscovitas há uma província chamada Neuros, cujos homens, em certos meses do verão, se convertem em lobos, e depois tornam novamente a se converter em homens.

Se algum fundamento de verdade isto pode ter, assim o é em razão de que todos os autores modernos afirmam: que, como nesta província há tantos encantadores e feiticeiros, estes têm seus tempos determinados em que se juntam e fazem as suas congregações, e para isto todos tomam a figura de lobo. Embora não declarem as causas por que o fazem, é de se crer que têm algum ajuste ou pacto com o Demônio, para que, em  alguns dias assinalados,  lhe rendam obediência sob esta figura, como o fazem os bruxos e as bruxas, e dali levem, de tão bom mestre, aprendidas as coisas que lhes aproveitem para a sua nigromancia. E nos dias em que estas diabólicas gentes se transfiguram, são tantos os danos e excessos que causam, que os lobos verdadeiros parecem mansos em comparação a eles. Mas, de toda forma, não há que duvidar de que façam mesmo esta transfiguração.

Para a averiguação disto, eu poderia trazer alguns exemplos de coisas que têm acontecido, mas um só vos darei. É que, não faz muito tempo, um imperador da Rússia, fazendo prender alguém que tinha a fama de ser um dos que se transfiguravam, fê-lo apresentar-se diante de si metido em correntes. E, perguntando-lhe se era verdade que podia mudar a sua figura para a de lobo, disse-lhe que sim. E o duque, o imperador, lhe mandou que se transformasse prontamente, e o homem, metendo-se em uma câmara, onde tinha pouco espaço, saiu convertido em lobo e ainda preso às correntes. O imperador, de argúcia, havia, entretanto, feito trazer dois mastins muito ferozes, os quais, quando o viram, tomando-o por verdadeiro lobo, arremeteram contra ele e, mui cruelmente, o fizeram em pedaços, sem que o desventurado pudesse valer-se ou defender-se.

Narrativa constante do Jardín de Flores Curiosas, 1575.




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