A MISTERIOSA DAMA DE NEGRO - Narrativa Sobrenatural - B. N. S.



A MISTERIOSA DAMA DE NEGRO

B. N. S.

(Séc. XX)

17 de março de 1928.

O professor Miguel Couto[1], o médico eminente que todo o Brasil conhece, foi, neste último dia,  figura  central de uma  história que  a cidade inteira comentou.

Um cidadão qualquer, não se sabe se dando larga à sua imaginação ou se repetindo, de boa-fé, o que lhe fora transmitido, escreveu a "O Jornal", uma carta por esse matutino  publicada e na qual  continha, em resumo, o seguinte:

“Certa noite, enfermo, e tendo dado ordem ao seu criado particular  para que não  lhe fosse trazido à presença nenhum estranho, o professor Miguel Couto foi procurado pelo seu empregado que, por entre escusas, lhe anunciara uma visita.

Em vão, dissera à visitante que o seu amo estava doente e lhe havia dado ordens expressa para não anunciar qualquer pessoa. Quem ali estava, não se retiraria sem falar ao médico e, revelada tal disposição, o criado se dispusera a comunica-lo ao Dr. Miguel Couto.

Este, impressionado com a insistência, mandou entrar a visitante.  Era uma jovem, vestida de preto, pálida, aflita e que logo reclamou para a sua progenitora serviços do famoso clínico. A mãe morreria se ele não a visse e receitasse, pois nenhum outro médico poderia salvá-la.

O professor Miguel Couto alegou a sua doença e negou-se a sair de  casa. Seguiu-se a insistência da misteriosa dama de negro, cada vez mais afita, suplicante e já chorosa. O médico, cujo  coração não endurecera ao longo do largo contato com a morte, acabou cedendo e, com a moça, tomou um automóvel que conduzia os dois a uma ‘avenida de gente paupérrima’.

Ao saltar, acompanhado pela moça, o Dr. Miguel Couto penetrou na ‘avenida’ e, a certo trecho, voltou-se para a sua companheira, a fim de saber em que casa estava a enferma.

A jovem, contudo, desaparecera, e o médico, embora intrigado, dirigiu-se a um grupo de moradores que lhe deu as informações pedidas. A enferma, ao ver entrar o professor Miguel Couto, a quem conhecia de vista, mostrou-se surpresa pela visita, dizendo não haver mandado chamá-lo, declarando, além do mais, que não tinha filha. Mas isso tudo foi secundário para o médico que, à beira do leito de um padecente, tratou logo de cumprir o seu dever, excedendo-o até, pois, juntamente com a receita, deixou o necessário para o preparo do medicamento.

Ao sair, porém, os olhos do médico se fixaram, por acaso, num retrato que pendia da parede. Era o da moça que o conduzira. Voltou ao quarto da enferma e questionou-a, ouvindo da velha senhora que aquele retrato era de sua filha... falecida já havia três anos...

 

Fonte: “Diario de Pernambuco”, edição de 3 de abril de 1928.



[1] Miguel Couto (1865 – 1934), famoso médico, político e professor fluminense.


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