UMA ESPOSA FANTASMAGÓRICA - Conto Clássico de Terror - Lal Behari Day
UMA ESPOSA
FANTASMAGÓRICA
(Lenda indiana)
Lal Behari Day
(1824 – 1892)
Tradução de Paulo Soriano
Um
brâmane se casou e levou a mulher para morar com ele e sua mãe. Perto da casa
havia um tanque, em cuja margem havia uma árvore, e, nela, vivia um fantasma da
espécie chamada sankchinni[1].
Certa
noite, a esposa do brâmane foi ao tanque e, ao voltar, roçou o corpo no sankchinni,
que estava por perto.
Ora,
o fantasma ficou muito aborrecido com a mulher. Agarrou-a pelo pescoço, subiu
em sua árvore e a enfiou em um buraco que havia tronco.
Lá,
a mulher ficou quase morta de medo. O fantasma vestiu as roupas da esposa e
entrou na casa do brâmane. Nem ele e nem sua mãe suspeitaram da mudança. O
brâmane pensou que sua esposa havia voltado do tanque, e a mãe pensou que aquela
era a sua nora.
Na
manhã seguinte, a sogra notou alguma mudança na nora que, como sabia, por ser de
frágil e lânguida compleição, demorava-se muito nas tarefas domésticas. Mas ela,
aparentemente, havia se tornado uma pessoa bem diferente do que costumava ser.
De repente, tornou-se muito ativa. Agora, a moça fazia o trabalho da casa em um
tempo incrivelmente curto.
Sem
de nada suspeitar, a velha nada comentou com o filho e com a nora. Pelo
contrário, ela simplesmente exultou por ver a sua nora tão mudada. E a sua
surpresa ficava cada dia maior. Os alimentos da casa eram preparados em muito
menos tempo do que antes. Quando a sogra pedia que a jovem lhe trouxesse qualquer
coisa do cômodo ao lado, esta levava muito menos tempo do que o necessário para
ir de um cômodo ao outro. O fantasma, em vez de entrar na sala seguinte, esticava
bem um braço pela porta — pois os fantasmas podem alongar ou encurtar qualquer
membro de seus corpos — e apanhava o que queria.
Certa
feita, a velha viu o fantasma proceder daquela forma estranha. Ela havia ordenado
que a jovem lhe trouxesse um recipiente, que estava a uma boa distância, e o
fantasma, inadvertidamente, estendeu a mão a vários metros de distância e o
trouxe em um instante.
A
velha ficou maravilhada com a visão. Não disse nada a ela, mas contou ao filho
o que vira. Mãe e filho começaram a observar o fantasma com maior atenção.
Certo
dia, embora soubesse que não havia fogo na casa e, bem assim, que a nora não havia
saído para pegá-lo, a velha senhora percebeu que, estranhamente, o fogão estava
em chamas. Ela entrou na cozinha e, para sua infinita surpresa, descobriu que a
nora não usava lenha para cozinhar, senão que mantinha o pé enfiado no forno, e
este ardia intensamente.
A
velha mãe contou ao filho o que vira, e os dois concluíram que a jovem na casa
não era a verdadeira esposa. Era, sim, um fantasma.
O
filho testemunhou as mesmas façanhas que sua mãe já havia visto. Mandaram,
portanto, chamar um ojha[2].
Chegando, o exorcista procurou verificar, primeiramente, se a jovem era uma mulher
real ou se era um fantasma que lhe tomara a forma. Para isso, acendeu um pedaço
de açafrão e o colocou embaixo do nariz da suposta mulher. Bem, este foi um
teste infalível, já que nenhum fantasma, seja homem ou mulher, pode suportar o
cheiro de açafrão queimado. No momento em que se lhe aproximaram o açafrão
aceso, ela deu um grande grito e saiu correndo da sala. Agora estava claro que
ela era um espectro ou uma mulher possuída por um fantasma. A mulher fora
subjugada por uma força mais poderosa, e, perguntada sobre a sua real natureza,
ela, a princípio, se recusou a fazer qualquer revelação. Então o ojha
pegou os chinelos e começou a espancá-la. Só assim o fantasma se pôs a falar
com um forte sotaque nasal — pois todos os fantasmas falam pelo nariz —,
dizendo que ela era um sankchinni que vivia em uma árvore ao lado do
tanque. Disse que havia agarrado a jovem esposa, metendo-a, depois, no buraco
de sua árvore, porque, numa noite, ela a havia tocado. Disse ainda que, se alguém fosse até o buraco,
a mulher seria encontrada.
A
verdadeira mulher foi trazida da árvore quase morta. O fantasma foi novamente
espancado. Despois disto, tendo solenemente declarado que não faria mais mal ao
brâmane e à sua família, foi libertado do feitiço do ojha e mandado
embora.
A
esposa do brâmane se recuperou lentamente. O brâmane e sua esposa viveram
muitos anos felizes juntos e geraram muitos filhos e filhas.
Ilustração: Warwick
Goble (1862 – 1943).
Gosto muito dos contos indianos.
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