O CAIXÃO NA ESTRADA - Conto de Terror - Maycon Guedes


 

O CAIXÃO NA ESTRADA

Maycon Guedes

 

 

“Aquilo é um caixão?!” — Exclamou Dario, interrompendo a fala de Marisa enquanto caminhavam pela estrada escura e abandonada. Já passava da meia-noite e, o jovem casal, que vinha conversando sobre diversos assuntos, ficaram em silêncio, paralisados, observando o caixão à beira da estrada. O cenário era realmente assustador; a estrada velha que cortava o matagal se estendia numa penumbra aterradora; a noite era fria e silenciosa; graças ao forte vento, podia-se ouvir com exatidão os galhos e as folhas das árvores movimentando-se. O caixão, abandonado à beira da estrada, aterrorizou de vez a noite daquele casal; digo… a última noite daquele jovem casal. Marisa acelerou o passo, e Dario, tremendo de medo, parou para averiguar o macabro caixão.

— Vamos, Dario! O que você está fazendo aí? — Suplicou Marisa.

— Espera! Quero ver se tem alguém dentro do caixão.

— É óbvio que há alguém aí dentro. Vamos embora!

— Só mais um minuto — Dario examinava minuciosamente cada detalhe daquele caixote fúnebre —, veja isso, Marisa; há terra e vermes por toda parte; muito estranho; por algum motivo desenterraram esse caixão do cemitério.

— Dario, por favor, eu estou com medo; podemos ir agora?

— Estou aqui pensando se, talvez… pode ser que o coveiro Tavares tenha deixa o caixão cair do carro funerário, afinal, aquele velhote está sempre embriagado — Dario falava consigo mesmo, não se importando com Marisa, que tremia muito, não só pelo vento frio que soprava, mas também de medo, indignada com a curiosidade do namorado.

Marisa tentava manter a calma diante daquele objeto fúnebre que estava bem próximo a seus pés, mas essa calma não durou muito tempo, pois o pavor tomou posse de seu corpo, que tremia incessantemente, tudo isso porque Dario teve a brilhante ideia de chutar o caixão, fazendo com que seu pé penetrasse dentro da madeira podre, abrindo um buraco suficientemente grande para que um enorme rato negro e cabeçudo saísse de lá, emitindo sons como se fosse um monstro do inferno. A criatura zarpou para o matagal e um cheiro terrível começou a exalar do rombo que ficou no caixão. Dario e Marisa concordaram que era melhor sair daquele lugar, mas já era tarde demais; as coisas só pioraram.

Os olhos do casal jamais se arregalaram tanto como naquele momento; Dario experimentou uma terrível dor no peito, como nunca sentiu antes, e uma enorme dificuldade para respirar, enquanto isso, Marisa estava paralisada da cabeça aos pés. A dupla malfadada observava o caixão movimentando-se sozinho no velho asfalto, debatendo-se como se alguém tentasse sair de lá de dentro. A partir daquele momento, Dario acreditava que poderia existir alguém ali dentro, ainda vivo; deixando o medo de lado, o rapaz se aproximou para abrir de vez a tampa daquele caixão. Marisa ficou de longe, só observando, enquanto Dario quebrava a tampa com os próprios pés. Enfim, puderam ver o cadáver que se encontrava ali dentro, parcialmente podre, emanando cada vez mais um forte cheiro. Marisa se aproximou com um lençol branco que ela tirou da bolsa. O lençol que seria usado para cobrir seu corpo em sua primeira noite na casa de Dario, agora cobria o defunto que estava dentro do caixão.

"Se esse nosso namoro durar, vamos ter uma ótima história para contar no futuro" — Dario pronunciava essas palavras visando acalmar Marisa, ficando perplexo logo em seguida devido ao grito apavorado que ela deu; a pobre moça apontava o dedo na direção do matagal, notificando haver algo terrível naquela direção. Graças ao brilho da Lua, eles avistaram outro caixão, flutuando no ar, rente as árvores, não muito longe da estrada onde eles estavam. Enquanto o casal observava o caixote fúnebre vagando rente as árvores, um som estranho e perturbador manifestava-se bem próximo a eles; então, quando voltaram a atenção para o cadáver que estava na estrada, notaram que aquele ser agora estava sentado, ainda coberto pelo lençol, respirando intensamente, fazendo com que o pano branco se movesse lentamente enquanto o defunto soltava o ar pela boca. Em seguida, o ser cadavérico começou a dizer essas estranhas palavras: "Dois velórios! Dois velórios!" — E conforme ele repetia, sua voz ficava cada vez mais "rasgada", emitindo agora sons parecidos com o de um porco no abate; e o maldito ser continuava, em sincronia com a sua risada maléfica: "Dois velórios! Dois velórios! Dois velórios!" — O defunto se levantou e o lençol deslizou lentamente até o chão, deixando à mostra aquela face sorridente e medonha; era o próprio rosto de Satanás na forma de um cadáver.

Dario e Marisa nunca imaginaram que poderiam correr tão rápido como naquela noite. Correram muito, ficando cada vez mais longe do local onde o caixão estava; Dario deu uma ligeira olhada para trás e pôde ver o ser flutuante vindo em sua direção; o defunto seguia o casal, levitando a um metro de distância do chão, com os braços na mesma posição que fora enterrado, gargalhando e repetindo aquelas estranhas palavras. Ao olhar de volta para a estrada, sem parar de correr um segundo sequer, Dario reparou que o caixão que estava flutuando no ar agora vinha em sua direção, em alta velocidade, encurralando o casal - à frente, um caixão sinistro, pelas costas, um defunto assombroso levitando no ar.

Marisa, que estava há alguns passos à frente de Dario, parou de correr repentinamente quando o caixão se espatifou em sua frente, colidindo com o velho asfalto, quebrando-se em pedaços, disseminando madeira, terra e pedaços de carne podre para todos os lados. Dos destroços saíram grandes ratos negros cabeçudos, com olhos ardendo em chamas; as infames criaturinhas partiram para cima de Marisa, arrancando pedaços de todo o seu corpo em questão de segundos - como piranhas devorando a sua presa - deixando os poucos restos da moça esparramados pela estrada. Ao ver aquela terrível cena, Dario deu meia-volta e correu de volta para o lugar de onde veio, preferindo enfrentar o defunto flutuante ao invés daqueles malditos ratos sedentos por carne.

Desnorteado, Dario se perdeu em seus próprios passos, não sabendo para onde correr, e logo foi surpreendido pelo defunto que o agarrou pelas costas, suspendendo-o, tirando os seus pés do chão e fazendo com que ele também flutuasse no ar, sendo carregado por um cadáver que não parava de dar malditas gargalhadas. Dario foi arremessado para dentro do caixão que estava na estrada, e de alguma forma, todo seu corpo ficou paralisado. Sem movimento e dentro de um miserável caixão, o jovem só podia ficar observando o defunto que também tentava entrar ali dentro, junto a ele, num caixão que foi feito nas medidas para caber uma única pessoa.

O defunto ficava agressivo a cada tentativa frustrada de entrar no caixão em que Dario estava. Desesperado, Dario gargalhava feito um louco, mas, seu estado eufórico não durou muito, e seus risos transformaram-se em gritos de desespero enquanto seu corpo era desmembrado pelo defunto; o jovem estava sendo comido vivo, perdendo muito sangue, enquanto vários pedaços do seu corpo eram arremessados para longe. Dario queria morrer o mais depressa possível, e não podia, pois aquele caixão o mantinha vivo mesmo após perder grande parte de seu corpo pelas dentadas do defunto. Agora, com um pouco mais de espaço dentro do caixão, após ter tirado boa parte do corpo de Dario lá de dentro, o defunto finalmente conseguiu entrar, se juntando ao que restou do corpo estraçalhado do jovem. Enfim, o caixão começou a levitar, conduzindo os restos de Dario e o defunto para bem longe do solo, com o jovem agonizando de dor, impossibilitado de morrer, apenas observando o defunto saborear o que restou do seu pobre corpo.

O destino do caixão flutuante era óbvio: o cemitério daquela maldita cidade. Enquanto o caixão vagava em meio às árvores do matagal, o defunto ia se livrando do pouco que restou do corpo de Dario, ficando apenas com a cabeça do jovem e atirando o resto do seu corpo para fora do caixão, enfeitando os pinheirais com pedaços de carne sangrando. Dario só conseguia focar na terrível dor de ter seu corpo separado de sua cabeça e ainda assim continuar vivo; a dor era insuportável e ele gritava implorando pela sua morte. Quando o caixão se aproximou do cemitério, a cabeça de Dario foi erguida para que ele pudesse ver o que acontecia naquele local, ficando abismado com a quantidade de caixões flutuando no interior do cemitério. Alguns caixões saíram apressados de lá, indo em direção à velha estrada, em busca de mais vítimas.

Assim que o caixão de Dario pousou dentro do cemitério, o defunto saiu carregando sua cabeça, caminhando entre os túmulos e deixando que o jovem pudesse ver e ouvir os mais variados gritos de desespero. Dario não era o único a estar naquela situação, ao seu redor, diversas pessoas desmembradas eram carregadas por defuntos. Era inacreditável a quantidade de caixões flutuando, a quantidade de defuntos gargalhando maleficamente, e a quantidade de pessoas sofrendo de dor por terem seus corpos destroçados, restando-lhes apenas a cabeça. Caixões subiam aos céus enquanto outros chegavam carregando restos de mais pessoas - aquilo era uma sinistra coleta fúnebre! No centro do cemitério, uma enorme cova estava sendo aberta e, ao redor dela, os defuntos repetiam em sincronia um estranho dialeto, enquanto arremessavam as cabeças, incluindo a de Dario, para dentro daquela cova gigante e profunda. Nada se via ali dentro, era apenas a escuridão, e naquele momento, em meio a tantas lamentações e berros desesperados, Dario finalmente compreendeu que não havia fuga daquela enorme cova, e que dividiria o sofrimento eterno com aquelas pobres pessoas.

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