BIZORRO E O CAIXÃO - Conto Humorístico de Terror - Luiz Raimundo

 


BIZORRO E O CAIXÃO

(Luiz Raimundo)

 

         Lendo esta semana no excelente livro do meu amigo Padovani – Os dois lados do rio, um texto (Ajuda que veio do inferno, pág. 26) falando de uma personagem — pode-se dizer, folclórica de nossa cidade, o Besouro, que prestou serviço na Delegacia de Trânsito de Ponte Nova por muitos anos —, o fato narrado me lembrou outro, que passo a compartilhar com vocês que me dão a honra da sua leitura.

         Mas aqui vamos nos referir a ele como “Bizorro”, pois era assim que todo mundo o chamava.

         Bizzorro era um homem de porte baixo e um tantinho atarracado, andava meio de banda, cara grande e olhos esbugalhados, possivelmente por causa de uma anomalia da tireoide mal curada. Esse mal, segundo a literatura médica, pode causar deslocamento do globo ocular para frente. Isso se dá pelo aumento dos músculos oculares e pelo acúmulo anormal de gordura na porção orbitária atrás dos olhos. Como a órbita é uma caixa óssea com tamanho limitado, ocorre assim o deslocamento do globo ocular para fora. Ele trazia sempre o óculos, com lentes muito grossas, na ponta do nariz; a boca, de grossos lábios, meio torta para a direita e uma voz grave, cavernosa, como se saísse do fundo de uma gruta. Entretanto, apesar de sua aparência um pouco bizarra, era uma pessoa de fino trato, educado, gentil e super prestativo, e sem nenhum complexo por conta de sua aparência.

         Lá pelos idos dos anos de 1970, estava ele à espera de uma carona, no fim do dia, já com o sol posto, próximo de onde está aquele semáforo (que não existia na época) próximo ao Banco Itaú, para seguir para Oratórios. Eis que vem um caminhão International, que ele conheceu pela cor ser de um conhecido seu, e sinalizou para o mesmo, que atendeu ao seu pedido de carona. Como a boleia estava ocupada, restou-lhe subir para a carroceria do veículo.

         Na carroceria estava um caixão. Caixão mesmo, revestido daquele tecido roxo, comum na época, não essas urnas “chics” de hoje. Mas isso não o perturbou.

         Antes de chegar próximo à fazendo dos Resende (defronte ao Dream´s Motel), começou uma chuvinha fininha. Bizorro não se fez de rogado e entrou no caixão para se proteger. A viagem seguiu junto com a chuvinha. E o nosso passageiro adormeceu.

         Ao chegar no entroncamento que levava à Ana Florência/Oratórios, o caminhão parou para que subisse na carroceria umas oito pessoas que iram para o velório, onde o “de cujus”, no distrito de Oratórios, esperava o seu invólucro para descer à tumba. Ninguém se incomodou com o caixão e nenhum notou que ele estava ocupado, pois o negrume da noite já cobria tudo em volta. Aglomeram-se num canto da carroceria, com seus guarda-chuvas formando uma improvisada barraca.

         A viagem seguia tranquila e sacolejante por aquela maltratada estrada de terra, com o caminhão jogando pra trás placas de barro em decorrência das águas mansas que caíam do céu.

         Passados alguns quilômetros, a tampa do caixão se abre de pronto, e Bizorro, como uma assombração, se mostra para os outros caroneiros e pergunta: Já parrrou de choverrr?

         Pernas, pra que te quero?... Não ficou um na carroceira, pularam todos aterrorizados com aquela figura, que iluminada pela lúgubre luz da lua, parecia ainda mais assustadora, uns por cima dos outros se estatelaram na estrada, resultando em braços quebrados, narizes estropiados, joelhos danificados e um grito uníssono e quase que ensaiado: valei-nos Nosso Senhor Jesus Cristo!

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