UM FANTASMA PERSISTENTE - Narrativa Sobrenatural - Anônimo do Séc. XIX


 

UM FANTASMA PERSISTENTE

(Anônimo do séc. XIX)

Tradução de Paulo Soriano

 

(Cincinnati Enquirer, 30 de setembro de 1884)

GRANTSVILLE, VIRGÍNIA OCIDENTAL, 30 de setembro. — O fantasma da fazenda de Betts nunca dorme. Há cerca de um ano, o Enquirer publicou um relato sobre um influxo ou manifestação oculta na casa da fazenda do Sr. Collins Betts, situada a cerca de três milhas desta cidade, na qual delineou-se uma série de casos estranhos e singulares de manifestações fantasmagóricas, verificados pelo testemunho de cidadãos honestos, corajosos e confiáveis, cujos nomes foram mencionados. Essa história circulou nos jornais de outros Estados e fez com que o proprietário do local recebesse centenas de cartas de todo o país.

Posteriormente, a velha casa foi demolida e a família do Sr. Betts erigiu uma nova em outro local da fazenda. Acreditava-se que, assim silenciariam, para sempre, as manifestações e estranhas ações daquele mistério inexplicável. Mas tal não ocorreu. Desde que o edifício foi demolido, a misteriosa manifestação tornou-se visível em outros lugares, às vezes bem distante da cena originária.

A uma distância de várias centenas de metros da velha casa dos Betts, um fazendeiro vizinho construiu uma casa, na qual pretendia residir e, de fato, lá morou por um curto período. Todavia, o "fantasma de Collins Betts" — como a manifestação é comumente chamada num círculo de muitas milhas — permaneceu alheio à distância e às pessoas. Aquelas manifestações, que surgiam em momentos tão inconvenientes, aborreceram e assustaram tanto o fazendeiro e sua família que ele mudou de casa — agora situada no lado oposto da fazenda —, abandonando, pois, o seu jardim, o seu pomar e todas as benfeitorias normalmente realizadas num lar rural.

Tal, por si mesmo, já era considerado bastante estranho, mas o visitante fantasmagórico não parou por aí. A estrada principal, que se estende a certa distância da fazenda, tem sido palco de inúmeras cenas de sustos e terríveis aparições. Entre os que, recentemente, viram o fantasma está um jovem chamado Vandevener, cujo pai, certa vez, quase morreu de medo, conforme relatado em uma carta anterior. O jovem Vandevener costumava zombar dos temores do velho pai; contudo, deixou de fazê-lo. Na verdade, o jovem está disposto a fazer uma declaração juramentada de que a história do pai foi fielmente elaborada.

Certa noite, o rapaz conduzia silenciosamente a sua carroça a cerca de meia milha da casa dos Betts, quando viu uma entidade estranha. À luz pálida da Lua, pensou que a entidade seria um homem caminhando à frente de seus cavalos. Alguns minutos depois, o homem — ou o que quer que fosse — acercou-se, sem fazer barulho, e, contornando as cabeças dos cavalos, subiu na carroça, sentando-se ao seu lado.

O jovem Vandevener disse que o homem o acompanhou várias centenas de metros. Disse, também, que conversou com ele. Primeiro, o estranho disse-lhe para não ter medo, pois não pretendia feri-lo minimamente. O que ele mais falou não se contará, salvo que admoestou o jovem a não falar nada sobre o que se passava. Depois de falar com o estranho, Vandevener afirmou que a figura se levantou, correu para a floresta e desapareceu. Declarou que a forma da aparição correspondia à de um homem sem cabeça, e que, enquanto estava com ele, perpassou-lhe um forte calafrio, embora a noite fosse tépida. Registrou que aquela sensação friorenta não o abandonou após o desaparecimento do espectro.

Desde então, Vandevener não sai de casa após o anoitecer. Ainda persiste na mesma história e, como é um jovem honesto, as pessoas que o conhecem estão convencidas de que ele realmente viu o que afirmou ter visto.

Na semana passada, outro jovem, Henry Stephens, passando pelo mesmo lugar, viu uma peculiar aparição surgir da mata, ao lado da estrada, e avançar à sua carroça. Stephens apeou, pulou, juntou um punhado de pedras e jogou-as em direção ao espectro. Algumas das pedras pareciam atravessá-lo e não pareciam afetá-lo minimamente. A entidade continuou a flutuar a uma curta distância; então, Stephens, amedrontado, subiu à carroça e chicoteou seus cavalos até que os rocins voassem numa marcha de dois minutos, correndo pela estrada. A entidade perseguiu Stephens por uma boa distância, acompanhando-o até uma considerável distância da cena de sua primeira aparição. Depois, desapareceu como uma nuvem vaporosa.

Existem outras dezenas de histórias peculiares e autênticas do assustador fantasma de Betts.

Parece que, desde o abandono da herdade Betts, o fantasma passou a fixar-se perto da estrada, aparecendo a pessoas que geralmente zombaram e riram das histórias anteriores. Que seja ele à prova de balas, não há dúvidas, já que o fantasma se manifesta numa região que, há anos, é conhecida, por seus destemidos pares, como a dos Dusky e outros corajosos fazendeiros, e estes ostentam, desde a última guerra, a fama, de âmbito nacional, de atiradores de elite, batedores etc. Nenhum desses homens conseguiu calar a aparição. Diz-se que, no passado, alguns homens foram assassinados ou desapareceram naquela vizinhança, e que o fantasma é o espírito inquieto de um dos mortos. Contudo, não há nenhuma prova substancial que alguém realmente tenha sido morto naquelas paragens.

Não há dúvida de que o condado de Calhoun ostenta um mistério que nem o tempo, nem as balas, nem a coragem, nem a filosofia podem afastar ou explicar. Chegou para ficar. Se você encontrar um habitante da região mencionar o incidente, ele lhe dirá que o "fantasma de Betts" é um uma pertença do condado, e que todos terão o prazer em dela se desfazer a qualquer preço.

Fonte: “The Best Ghost Stories”, Boni & Biveright, Inc., Nova York, 1919.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O GATO PRETO - Conto Clássico de Terror - Edgar Allan Poe

O RETRATO OVAL - Conto Clássico de Terror - Edgar Allan Poe

A MÁSCARA DA MORTE ESCARLATE - Conto de Terror - Edgar Allan Poe

BERENICE - Conto Clássico de Terror - Edgar Allan Poe