UM RELATO DAS TREVAS - Conto de Terror - Victor Nascimento
UM RELATO DAS
TREVAS
Victor Nascimento
I
O
céu, que antes, no fim de tarde, tinha uma esplêndida coloração alaranjada, foi
vagarosamente encoberto pelas fantasmagóricas sombras da noite.
Eu observava isto acontecer, pela janela do
bar. E quando enfim a noite caiu, virei-me e fui beber mais um pouco antes de
ir embora.
II
Saí
cambaleando do bar, extremamente embriagado, com uma visão embaçada, vagando em
passos morosos pelas ruas escuras e vazias, com aquele jeito febril afetado de
um homem ébrio, atônito.
Logo então, perdi qualquer noção de tempo e
destino, minha mente se encontrava em estado turvo; não tenho nenhuma lembrança
nítida depois de ter saído do bar, apenas alguns fragmentos vagos de ruas
percorridas, mas é só isto nada além até que…
Subitamente, voltei-me à consciência, e
deparei-me com algo que me fez arregalar os olhos de tanto assombro. Uma
sensação de desorientação tomou conta de mim. Minha mente estava em branco,
abismada, incapaz de reconstruir os passos que me levaram àquele lugar, mas
ainda tentando entender.
Como eu havia chegado ali? Eu fiz esta
pergunta a mim mesmo naquele momento, e faço até hoje.
O luar irradiava tenuemente os arredores
daquela densa floresta, era uma iluminação frágil e instável, mas era graças a
essa tênue claridade que eu conseguia enxergar em meio àquele breu súbito.
E, ocasionado por esta luz, no chão, havia-se
projetado um emaranhado de sombras — suaves e assustadoras — que oscilavam
agitadamente. E eram as sombras das árvores, altas e imponentes, que dançavam
ao sopro do vento. Mas eu também notei algo naquelas sombras; uma delas não era
de uma árvore, uma tinha um formato humanoide.
Eu então comecei a caminhar cautelosamente
para trás. O'Que eu queria era correr, sair o mais rápido possível dali, mas eu
estava bem amedrontado e ainda abismado, não conseguia efetuar quase nenhuma
ação com o terror me pressionando.
Meus olhos estavam bem arregalados —
arregalados de horror, um horror crescente, que floresceu mais ainda quando
senti encostar em algo atrás de mim, algo áspero.
Lembro-me nitidamente do medo incontrolável
que senti. Apenas de encostar no que quer que fosse, minha mente começou a
imaginar mil coisas, e nenhuma delas eram boas.
Minhas pernas bambearam tanto que mal consegui
me manter de pé. Meu coração começou a saltar velozmente, tanto que achei que
iria ter um infarto, era como um tambor frenético dentro do meu peito. O horror
havia finalmente me dominado por completo. Eu então sufoquei um grito, um grito
que quase escapou - um grunhido foi o'que saiu — e me virei.
Pelo que vou continuar agora, deve achar que
enlouqueci. Eu mesmo acho que enlouqueci. Mas não, eu acredito no que vi. Não
acho que estou louco e nem que tive uma alucinação; eu sinto que naquela
floresta, algo maléfico habita. E eu suspeito que é esta coisa que está sendo
responsável pelos desaparecimentos.
O'Que eu vi ali, foi a minha esposa; algo
disfarçado dela. E estava bem atrás de mim.
E, pra quem não sabe, minha esposa morreu a 5
anos por tuberculose.
Aquela
criatura abriu a boca, liberando uma névoa branca com um odor vegetal, e disse:
"Leve-me para casa, querido, eu
voltei…" — a coisa então esboçou um sorriso macabro, que deixou a mostra
os dentes esverdeados, podres e traiçoeiramente afiados. Tenho constantemente
pesadelos com aquela visão.
Eu então soltei um grito estrondoso de pânico,
meu coração ainda batia descompassado, meu corpo todo tremia, parecia que a
qualquer momento eu iria desabar no chão.
Mas, milagrosamente, encontrei forças para
correr. E corri, corri muito rápido.
Então lancei um olhar rápido para trás, e vi
que ela ainda esboçava aquele sorriso alargado — um terrível sorriso.
E uma onda de adrenalina invadiu meu corpo, e
corri ainda mais e, ao olhar novamente, ela já não tinha mais a aparência de
minha esposa; havia se transformado em uma velha de nariz longo e pontudo, com
o rosto enrugado. E aquela velha riu, riu e riu, apontando o dedo indicador
para mim. Sua risada era aguda e assustadora, ecoando pavorosamente pela
floresta.
III
E
continuei andando rapidamente até finalmente reencontrar a cidade, aquela
floresta densa parecia não ter um fim. Cada passo dado era acompanhado pela
sensação amedrontadora de estar sendo observado.
E eu continuava a percorrer o emaranhado de
árvores e arbustos, em meio à escuridão, quando abruptamente, meus olhos se
fixaram em algo que me espantou: havia uma pequena casa emergindo da vegetação,
e ela era feita inteiramente de doces. Exalava um aroma tentador de doces, um
aroma que quase me convidava.
Havia também um estreito caminho de terra até
a casa, e neste caminho, eu vi algo que me deixou e continua me deixando
inquieto; em meio àquele caminho, repousava um objeto que instantaneamente me
encheu de apreensão: era um sapato, um sapato certamente de criança, com marcas
de sangue.
IV
7
crianças desaparecidas, todas em idades de 8 a 11 anos, parece que todas
desapareceram perto de uma floresta.
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