O DEMÔNIO IMITADOR - Narrativa Clássica Sobrenatural - Walter Map
O DEMÔNIO
IMITADOR
Walter Map
(1130 – c. 1210)
Um
cavaleiro descobriu que o seu primogênito, filho de uma mulher digna e nobre,
que lhe era muito querida, tivera a garganta cortada no berço, na primeira
manhã após o nascimento. O mesmo aconteceu com o segundo filho, um ano mais
tarde, e com o terceiro, no terceiro ano, em que pesem os cuidados e a atenção
que ele mesmo e os seus amigos lhes dispensavam. Por isso, ele e a sua mulher
esperaram, lacrimosos, com muitos jejuns, esmolas e orações, a chegada do
quarto rebento. Quando nasceu um menino, colocaram fogueiras e luzes ao redor e
vigiaram cuidadosamente a criança.
Nessa
ocasião, chegou-lhes um estrangeiro, cansado de uma longa viagem. Buscando
hospitalidade em nome de Deus, o estrangeiro foi acolhido com muito entusiasmo
e juntou-se a eles para a vigília. Ele foi o único que, após a meia-noite, permaneceu
acordado. Foi quando viu uma velha senhora debruçar-se sobre o berço e agarrar
a criança, como se lhe fosse cortar a garganta.
O
homem saltou para a frente e agarrou a intrusa. Quando os demais se aproximaram,
muitos deles reconheceram-na como a mulher mais nobre e respeitável da cidade.
Ela,
todavia, se recusou a confirmar o seu nome ou a responder às suas perguntas que
se lhe faziam.
O
pai da criança, assim como as demais pessoas na multidão, interpretaram este
fato como uma prova de sua vergonha e pediram libertação da mulher. Mas o estranho
não a deixava ir, declarando que ela era um demônio. Ainda segurando-a com
força, marcou-lhe o rosto, como sinal de sua maldade, com uma das chaves de uma
igreja próxima. Depois, ordenou-lhes que fossem, imediatamente, buscar a mulher
com quem ela se parecia e que eles julgavam que era. Enquanto a mantinha cativa, a outra mulher foi
trazida. Verificaram que ambas se pareciam em todos os sentidos, e até mesmo a
marca que tinham era igual.
Então,
o estrangeiro disse aos outros, que ficaram boquiabertos de espanto:
—Na
minha opinião, creio que a senhora, que acaba de chegar, é virtuosa e amada por
Deus. Pelas suas boas ações, provocou a inveja dos demônios e, por isso, este
seu mensageiro vil, este instrumento terrível de sua ira, foi moldado à
semelhança da boa mulher, de modo a lançar a desgraça das más ações sobre a sua
nobre alma. Mas tende fé e vede o que acontece quando eu o soltar.
Quando
solta, a criatura voou pela janela, com grande choro e lamentação.
Versão em português de
Paulo Soriano.
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