O GATO VAMPIRO - Narrativa Clássica de Horror - Lord Halifax


 

O GATO VAMPIRO

Lord Halifax

(Charles Lindley Wood)

(1839 – 1934)

Tradução de Paulo Soriano

 

Eu preciso contar-lhe uma história extraordinária, que ouvi recentemente, e que, antes que me esqueça de qualquer pormenor, imediatamente participo-lhe.

Eu estava sentado, depois do jantar, fumando um cigarro e tomando meu café, quando um amigo, a quem não via há algum tempo, apareceu e conversou comigo, abordando diversos assuntos. Por fim, disse-me ele que acabara de viver uma aventura muito singular.

No domingo passado — creio — ele foi a Eastbourne passar o fim de semana com alguns amigos, pretendendo tomar um pouco de ar fresco e descansar. Vivera um período de trabalho um tanto árduo, que lhe causara uma forte insônia. No sábado à noite, quando chegou, encontrou-se em meio a uma animada festa e felicitava-se por ter conseguido evadir-se de Londres.

Antes de subir e se vestir para jantar, atraiu-lhe a atenção o comportamento de um grande gato preto, que correu ao seu encontro quando ele entrou no salão e começou a demonstrar enfáticos sinais de afeto, esfregando-se em sua perna e tentando subir ao seu ombro. Isto pareceu ao meu amigo muito estranho e — de um modo que ele dificilmente poderia explicar —, bastante repulsivo, pois sempre tivera uma irracional uma repugnância por gatos. Porém, como o animal lhe parecia inteiramente devotado, permitiu que o seguisse escada acima; contudo, ao chegar quarto, fechou a porta. Ao sair, viu que o gato ainda permanecia ao lado da porta; depois, seguiu-o à sala de jantar, onde sua aparente devoção foi motivo de muita zombaria.

Aquele ritual repetiu-se na hora de dormir, quando, novamente, ele tomou as cautelas necessárias a que o gato ficasse do lado de fora. Durante todo o domingo, o gato continuou a se comportar dessa maneira estranha, fazendo tentativas quase desesperadas de subir ao pescoço do meu amigo. No domingo à noite, quando foi para a cama, teve que impedir, à força, que o gato o seguisse até o quarto.

Meu amigo, beneficiando-se, sem dúvida, da brisa marítima e do ambiente tranquilo, caiu imediatamente num sono profundo e sem sonhos, algo que não lhe ocorria há muitas semanas. Despertou-o uma curiosa sensação, típica de estado de tensão, que promanava de algum lugar ao seu lado. Em suas próprias palavras, ele sentia como se “estivesse a respirar apenas de um lado do corpo". Ao mesmo tempo, experimentou uma sensação de fraqueza e languidez, que o estimulou a virar-se e dormir novamente. Sentiu, todavia, uma aguda pontada no coração, que o fez colocar a mão ao lado do corpo; ali, sentiu algo quente e peludo. Ele se levantou e viu o gato pressionado contra ele, com a cabeça enterrada sob o braço e todo o lado de seu pijama encharcado de sangue.

Saltou da cama e disse alguma coisa ao gato, que, imediatamente parou de ronronar, foi até a ponta da cama e começou a bufar para o meu amigo com um ódio que excedia aquela anterior afeição. Desnecessário dizer que foi preciso apenas um instante para expulsar a criatura do quarto.

As investigações subsequentes explicaram como o gato havia entrado no quarto. Meu amigo dera instruções para ser chamado mais cedo, pois desejava tomar um trem. O empregado da casa, porém, confundiu-se com a hora: chegou ao quarto uma hora antes — às seis, em vez das sete horas —, e ao abrir a porta, notou que havia deixado o gato penetrar no quarto, mas não conseguiu expulsá-lo novamente. Eram sete e meia quando meu amigo acordou; o gato teve, assim, a seu nuto, cerca de uma hora e meia ininterrupta, tempo durante o qual conseguiu sugar-lhe uma boa quantidade de sangue. Circunstância extraordinária foi que, embora lhe tivesse tirado muito sangue, chegou ainda a lamber a camisa de dormir. Toda a pele do lado esquerdo do corpo do meu amigo estava enrugada para cima e para baixo, deixando marcas exatas à da língua do animal.

Foi uma experiência extremamente desagradável e a horrenda e imediata afinidade imediata do gato ao meu amigo torna a história ainda mais terrível. Quando ele regressou a Londres, consultou dois médicos que, assegurando-lhe que a ferida estava perfeitamente curada, dissiparam quaisquer receios que pudesse ter sobre a sanidade do gato.

 

Fonte: The Ghost Book of Charles Lindley, Viscount Halifax.


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