OS FANTASMAS QUE CAPTURAM ALMAS - Conto Clássico de Terror - Yuan Mei
OS FANTASMAS QUE
CAPTURAM ALMAS
Yuan Mei
(1716 – 1797)
Um
homem chamado Yu gostava de caçar grilos.
Todas
as noites, no outono, saía pelo portão de Feng, levando consigo alguns frascos,
em busca de grilos, e só regressava quase ao anoitecer.
Um
dia, atrasou-se no regresso e viu que o portão da cidade já estava trancado.
Consternado, e sem ter como voltar, Yu andava de um lado para o outro à beira
da estrada. Foi quando reparou que dois homens, vestidos de preto, à distância,
se aproximavam, com os sapatos batendo fortemente na estrada a cada passo.
—
A nossa casa não é longe daqui — disseram-lhe. — Por que não vens passar a noite
conosco?
Yu
acompanhou-os de bom grado.
Quando
chegaram à casa, pertencente a um escriturário, as folhas da porta estavam
abertas. Havia, lá dentro, alguns livros velhos, um vaso de porcelana e um
incensário de cobre.
Yu
segurava a sua dúzia de frascos de grilos, sentindo-se esfomeado. Então, sentou-se
ao lado de um candeeiro. Naquele ínterim, os dois homens de preto entraram com
comida e vinho. Comeram todos juntos, sentados frente a frente.
De
súbito, Yu ouviu os gemidos abafados, como se de alguma pessoa enferma, seguidos
de uma agitação. Quando perguntou o que se passava, os homens disseram:
—Um
dos vizinhos está em estado terminal.
A
quinta vigília da noite aproximava-se.
—
É hora de trabalhar — sussurrou um dos homens ao outro.
Um
deles retirou um documento da bota e disse a Yu:
—Por
favor, expire sobre o papel.
Yu
limitou-se a sorrir e a obedecer.
Tendo
feito isto, os homens pareceram tomados por uma súbita emoção e, esticando as
pernas, prontamente subiram ao telhado, pondo-se a dançar. Seus pés,
semelhantes aos de galinhas, tinham agora mais de três metros de comprimento.
Yu
ficou aterrorizado. Estava prestes a pedir uma explicação, quando os dois
homens desapareceram. Naquele instante, ouviram-se súbitos e estrondosos gritos
vindos de fora da sala.
Foi
então que Yu entendeu que aqueles a quem acabara de conhecer não eram seres
humanos, mas fantasmas que capturavam almas.
Ao
amanhecer, Yu abriu a porta para sair. No entanto, esta estava firmemente
trancada pelo lado de fora.
Incapaz
de sair, Yu pôs-se a chamar, aos gritos, pela família cujo ente querido havia
falecido na noite anterior. Surpresos,
os membros da família destrancaram a porta, mas tomaram Yu por um ladrão e, por
isso, se dispuseram a atacá-lo.
Mas Yu contou-lhes o que tinha acontecido,
apontando para os frascos de grilo, e dizendo-lhes:
—Será
que um ladrão roubaria alguma coisa enquanto carregava consigo objetos tão
pesados?
Um
dos membros da família reconheceu Yu, que, então, foi libertado. Os pratos e
travessas utilizados no jantar da noite anterior pertenciam todos àquela
família. Mas era um mistério como aqueles objetos haviam chegado à sala, e nem
Yu sabia como havia adentrado aquele ambiente, já que estivera sempre trancado por
fora.
Versão em português de
Paulo Soriano.
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