A CABEÇA CORTADA - Conto Clássico de Terror - Wu Shu
A CABEÇA CORTADA
Wu Shu
(947 – 1022)
Quando
Cheng Yu-wen servia como oficial do estado-maior em Hungchow, a janela de sua
casa dava para a rua principal.
Certo
dia chuvoso, estando ele sentado à janela, observando a rua enlameada, viu
passar um menino maltrapilho, vendendo sapatos.
Um
jovem patife, esbarrando no menino, derrubou-lhe os sapatos na lama. Chorando,
o garoto implorou por alguma reparação, mas o canalha recusou-se a fazê-lo,
lançando-lhe impropérios.
—
Porque em casa nada temos o que comer, era preciso vender estes sapatos. Mas,
agora, por sua culpa, eles estão sujos.
Um
estudante, que por ali passava, apiedou-se do garoto e lhe deu algum dinheiro.
Com
raiva, o valentão gritou:
—
Esse menino pedia-me dinheiro! Você não pode cuidar da própria vida?
Depois,
praguejou contra o acadêmico, que pareceu profundamente indignado.
Admirando
o senso de justiça do estudante, Cheng convidou-o a entrar e, muito
impressionado com sua conversa, manteve-o lá durante a noite.
Continuaram
conversando até que Cheng teve que passar um tempo nos aposentos internos; mas,
quando voltou, notou que o estudante havia desaparecido. Dele, não havia rastro
algum, malgrado o portão externo já estivesse fechado.
Logo
o acadêmico voltou e disse:
—
Hoje, não aguentei aquele patife. Assim, cortei-lhe a cabeça.
Dizendo
isto, atirou a cabeça decepada ao chão.
Chocado,
Cheng protestou:
—
O sujeito era agressivo, é verdade. Todavia, você não irá causar-me problemas
se andar por aí cortando cabeças e derramando sangue?
—
Não se preocupe — disse o estudante.
Então,
agarrando a cabeça decepada com uma mão, com a outra espalhou uma pequena
quantidade de uma estranha substância sobre ela. Prontamente, a cabeça liquefez-se.
—
Não tenho como retribuir sua hospitalidade — disse a Cheng —, mas poderia
ensinar-lhe esta arte.
—
Na minha posição social — retrucou-lhe Cheng —, a tanto eu não me atrevo.
Então,
o acadêmico fez uma profunda reverência e se foi, desaparecendo ao transpor
cada uma das portas em seu caminho, que já estavam fechadas e trancadas.
Versão em português de
Paulo Soriano.
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