NOVAS RECEITAS - Conto de Ficção Científica e Horror - Ricardo Manzanaro


 

NOVAS RECEITAS

Ricardo Manzanaro

Tradução de Paulo Soriano

 

Zárate inspecionou ansiosamente o ambiente pelo olho mágico. A sala de jantar estava lotada. Reconheceu a maioria das pessoas sentadas às mesas: severos críticos gastronômicos, afamados chefs, proprietários de vinícolas, importantes homens de negócios e conhecidos gourmets da cidade. O melhor dos melhores, a elite dos seletos. Há mais de vinte anos comandava o seu restaurante e quase cem por cento de suas criações gastronômicas fizeram um sucesso retumbante. Porém, não conseguia reprimir a angústia cada vez que introduzia novos pratos no cardápio.

— Está tudo preparado, patrão — avisou-lhe o chefe de cozinha.

Celeremente, Zárate examinou o carrinho com a comida, suspirou e sussurrou:

— Bem, aqui vamos nós.

As portas da cozinha abriram-se e o famoso chef entrou na sala de jantar principal do restaurante. O público aplaudiu e Zárate dirigiu-se ao centro do salão, cumprimentando alguns dos presentes e fazendo uma ligeira vênia em sinal de reconhecimento aos aplausos. Finalmente, chegou ao microfone.

— Caros amigos: tenho o prazer de lhes apresentar as novas receitas que incluímos no cardápio para a próxima temporada. Como os senhores já sabem, a cozinha do nosso restaurante centra-se nos produtos pré-históricos. No entanto, ao contrário de outros estabelecimentos, onde se privilegia a quantidade e as poções excessivas, nós buscamos a qualidade. Por isso, nas nossas viagens temporais, selecionamos os animais das zonas que, após uma observação exaustiva das suas características, hábitos e alimentação, nos parecem adequados. E tudo isto foi, posteriormente, confirmado na degustação. Este rigoroso procedimento permitiu-nos oferecer os melhores assados de tricerátops, os requintados lombos de tiranossauro e as mais suculentas carnes grelhadas de velociraptor. Com esta filosofia de melhoria contínua e de busca da excelência, tenho o prazer de lhes apresentar a grande novidade do cardápio desta temporada. Descobrimos um pequeno mamífero que viveu no Cretáceo, cuja carne é muito saborosa. Convido-lhes a provar as receitas que preparamos com esta matéria-prima.

As travessas com as iguarias foram distribuídas entre as mesas.  Serviu-se a comida e os comensais puseram-se a dar boa conta da delícia.

Sucederam-se os pratos, enquanto se ouviam, continuamente, os comentários e os elogios sobre as maravilhosas qualidades da carne daquele animal e dos pratos elaborados.

Zárate rumou à cozinha, transbordando felicidade. No entanto, assim que entrou, reparou que algo de grave ali se passava. Havia uma grande agitação.

— Ele desapareceu!  Esfumou-se! — gritavam os cozinheiros.  — Carlos... o maître... esfumou-se... de repente.

— O quê?  O que você está dizendo?

Subitamente, um homem irrompeu na cozinha, vindo de fora. Zárate não o reconheceu. Era um dos paleontólogos. Extremamente angustiado, lançou-se aos ombros do cozinheiro.

— O novo animal, o novo animal! Você o serviu?

— Sim... O que está acontecendo?

— Nããão! Nããão! Quantos foram caçados?  Quantos foram caçados?

— Você já sabe. Vários milhares. Temos que aproveitar a viagem, que...

Uma garçonete, aterrorizada e lívida, entrou gritando.

— Estão sumindo! As pessoas, os clientes...

Dois cozinheiros volatizaram.

— Este animal sobreviveu ao meteorito que matou os dinossauros! Deu origem a todos os mamíferos posteriores!  E agora vocês deram cabo de quase todos eles...

O homem despareceu. E três garçons. E o restante dos clientes. Um último pensamento perpassou a mente de Zárate. “Que pena. O quão excelente me pareceram as receitas”. Depois sumiu e, em sequência, esfumou-se toda a vida superior existente no planeta. 

 

 

Este conto foi publicado originariamente, em português e espanhol, na revista Relatos Fantásticos. Para acessá-la, clique AQUI.


 

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