O ENVENENADOR - Conto Clássico Cruel - Rodolphe Briger
O ENVENENADOR
Rodolphe Briger
(1869 – 1943)
Tradução de Antônio Andrade Júnior
(Séc. XX)
Cansado de viver com sua cara metade, que, entretanto, era a mais doce criatura deste mundo, e repugnando-lhe o divórcio pelo que ele tem de imoral e de contrário aos princípios religiosos, o senhor Taupin tomou a doce resolução de envenenar a sua mulher!
Como no ciclo dos seus estudos nada havia predestinado Taupin às sábias toxicologias, lastimando ter-se perdido a fórmula do veneno dos Bórgia, atirou-se burguesmente sobre os ácidos arsenicais.
Dispendendo alguns níqueis, comprou na farmácia mas próxima, algumas gramas de arsênico e, com uma sábia dosimetria, salpicou-o delicadamente nos alimentos absorvidos pela delicada e débil Madame Taupin, entregando-se pelo que acontecesse nas mãos da divina Providência!
O efeito do arsênico não tardou a se fazer notado no débil organismo da esposa; com efeito, Mme. Taupin, não demorou em engordar!… É verdade que a sua pele cobriu-se de uma certa palidez, mas ela jurou que nunca se sentiu tão bem!
Maldizendo os arseniatos que haviam enganado as suas esperanças mais caras, Taupin depositou toda a sua confiança nos bicloretos de mercúrio, certo como estava dos seus “maravilhosos” efeitos.
Graças a astúcias de apache, por algum dinheiro adquiriu na farmácia mais próxima alguns centigramas do sublimado corrosivo, que dissolveu n’água. Esta solução, ele adicionou, daí por diante, nas bebidas da doce Mme. Taupin.
Ora, vejam só o que aconteceu… Os arsênicos, tendo dado`à cara esposa bastante apetite, Mme. Taupin começava a sentir os pródromos de uma enfermidade gástrica que o sublimado corrosivo curou radicalmente, fazendo às vezes de calomelano e de licor de Van Swieten.
E Mme. Taupin passava encantadoramente, de tal forma que, na vilazinha onde moraram, começava-se a gabar a sua maravilhosa saúde!
Então, anatematizando os impotentes bicloretos de mercúrio, Taupin se decidiu a um grande golpe. Lançou mão dos derivados do ópio.
O farmacêutico mais próximo forneceu-lhe, sem mais aquela, e por uma módica quantia, algumas gotas de láudano que, sem se deter esta vez, ele misturou brutalmente aos alimentos de sua doce costela, sem mesmo dar-se ao cuidado de os dosar sabiamente!
Os opiados curaram radicalmente as insônias que Mme. Taupin vinha sofrendo há algum tempo: mostrava-se melhor ainda e todo o mundo andava boquiaberto de a ver engordar diariamente!
Isso era um motivo para bater com a cabeça na parede!
Pobre Taupin!… Infeliz marido!…
Proclamando a falência da toxicologia, não sabia mais a qual veneno se atirar, quando, uma noite, sua mulher sentiu as pernas bambas e caiu com um desmaio.
— Alea jacta est! — exclamou Taupin.
E, não tendo confiança alguma nos venenos, armou-se de um punhal que havia em cima da mesa e desferiu um golpe formidável na mulher!
— Pois é isto, meu pobre amigo, — disse-lhe o médico, que a criada tinha corrido para buscar, ao ver a patroa desmaiar, — pode-se dizer que o senhor tem presença de espírito! Sem essa felicíssima sangria que o senhor não hesitou em fazer em sua cara esposa, a pobre estaria bem perdida, vítima de um ataque de apoplexia!… Além disto, eu o tinha previsto, a sua mulher estava passando muito bem: isso não era natural!
Então, compreendendo que, cada tentativa que fazia contra a vida de sua mulher prolongava os seus dias por mais alguns dias, certo de sua impotência, entregou-se ao destino e confiou a sua cara esposa aos cuidados esclarecidos do seu medico, suplicando-lhe de fazer o impossível para levantá-la.
O médico jurou sobre Esculápio que, antes de um mês, Madame Taupin estaria de pé e, oito dias depois, estava morta!
Fonte: “Primeira”/RJ, edição 25 de março de 1928.
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