O CONDE ENFEITIÇADO - Narrativa Clássica Fantástica - Heinrich Kramer e James Sprenger
O
CONDE ENFEITIÇADO
Heinrich
Kramer (c. 1430 – 1505) e James Sprenger (1435 – 1495)
Certo
conde de nobre estirpe, do distrito de Westerich, diocese de Estrasburgo, casou
com uma nobre donzela de igual berço. Mas, depois da celebração das bodas, não
pôde, durante três anos, conhecê-la carnalmente, devido, conforme se
demonstrou, a certo feitiço que o impedia de consumar o casamento.
Com
grande ansiedade e sem saber o que fazer, chamou em voz alta os santos de Deus.
E aconteceu que foi ao Estado de Metz, para realizar certos negócios, e,
enquanto passeava pelas ruas e praças da cidade, acompanhado por seus criados,
encontrou-se com certa mulher que havia sido outrora a sua amante.
Ao
vê-la, e sem pensar no encantamento que atuava sobre ele, lhe falou com
delicadeza e espontaneidade, em consideração à antiga amizade que tiveram, e
perguntou-lhe como ia e se estava bem.
Ela,
ao ver a cordialidade do conde, a seu turno indagou-lhe muito particularmente
sobre a sua saúde e negócios. Quando ele respondeu que estava bem e que
prosperava, ela se assombrou, e guardou silêncio por uns instantes.
O
conde, ao vê-la surpresa, convidou-a a conversar com ele. De modo que ela
perguntou por sua esposa e recebeu uma resposta parecida, a de que ela estava
bem em todos os aspectos.
Então
a mulher lhe perguntou se tinha filhos e o conde respondeu que tinha tido três
filhos, um nascido a cada ano.
Diante
de tal resposta, ela se assombrou mais ainda, e voltou a guardar silêncio.
O
conde lhe perguntou:
—
Porque, minha querida, fazes tais perguntas? Estou certo de que me felicitas
por meu sucesso.
Ela
replicou:
—
Por certo que te felicito, embora maldiga a velha mulher que disse que
enfeitiçaria o teu corpo para que não pudesses ter relações com tua esposa. Em
prova disto, há um pote no poço, no meio de seu pátio, que contém certos
objetos malignamente enfeitiçados. E foi posto ali para que, enquanto o seu
conteúdo permanecesse intacto, tu fosses incapaz de manter relações com tua
mulher. Mas, como vês, tudo foi em vão, e me alegro!
Ao
retornar a casa, o conde não demorou em esvaziar o poço. Quando encontrou o pote,
queimou todo o seu conteúdo, com o que recuperou imediatamente a virilidade
perdida.
Por
isso, a condessa voltou a convidar todos os nobres a uma nova celebração de
casamento, e disse que agora era realmente a senhora do castelo e daquelas
terras, depois de haver permanecido virgem durante tanto tempo.
A
bem da reputação do conde, não convém revelar o nome desse castelo e dessas terras,
mas relatamos esta história para que se conheça a verdade sobre assunto, e para
que seja publicamente execrado tão terrível crime.
Fica
evidente que as bruxas utilizam diversos métodos para aumentar o seu número.
Pois a mulher mencionada, por haver sido suplantada pela esposa do conde,
lançou sobre este um feitiço com a ajuda da bruxa. E assim é como uma bruxaria
arrasta consigo muitas outras pessoas às suas hostes.
Tradução indireta: Paulo Soriano.
Nota do editor: A
presente narrativa é um episódio do “Malleus
Maleficarum”, também conhecido como “Martelo das Bruxas”.
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