RIP VAN WINKLE - Conto Clássico Fantástico - Washington Irving


RIP VAN WINKLE
Washington Irving
(1783 – 1859)
Tradução de Monteiro Lobato
(1882 – 1948)


O conto que vamos ler foi encontrado entre os papéis do falecido Diedrich Knickerbocker, velho gentleman de Nova York muito curioso do passado holandês da província e costumes dos descendentes dos primitivos colonos. Suas investigações, porém, se faziam mais entre as criaturas do que nos livros; porque os livros eram lamentavelmente escassos nos assuntos de seu interesse, ao passo que os velhos do lugar, e mais ainda as velhas, mostravam-se ricos de tradições valiosas. E, pois, sempre que descobria uma genuína família holandesa, comodamente enclausurada, em sua casa de campo do teto baixo, com um copado plátano à frente, era como se descobrisse um daqueles livros de fecho, impressos em caracteres antiquados.

Knick entrava a estudar aquela gente com um zelo de rato de livraria. A consequência dessas investigações foi uma história da província durante o governo holandês, que ele publicou. Têm variado as opiniões sobre o valor literário do livro, que a falar a verdade não é nem melhor nem pior do que podia ser. O seu principal mérito é a fidelidade aos fatos, coisa que a princípio foi questionada mas ficou perfeitamente estabelecida; daí o ser aceito em todas as coleções históricas como obra de absoluta autoridade.

O velho gentleman faleceu logo depois da saída do trabalho; e agora que está bem morto e enterrado, creio que lhe não afetará a memória dizer que podia ter empregado muito melhor o seu tempo. Mas Knick lá deu pasto à sua mania como pôde; e embora de quando em vez jogasse poeira nos olhos dos vizinhos, e mesmo ofendesse amigos aos quais dedicava a maior afeição e deferência, seus erros e tontices são recordados "mais com pesar do que cólera", ninguém lhe atribuindo a intenção de ofender ou injuriar. E ainda que sua memória sofra restrições dos críticos, permanece cara a muita gente cuja boa opinião é coisa de valor, principalmente certos fabricantes de biscoitos que imprimem o retrato de Knick como marca de bolos de Ano-Bom, dessa maneira permitindo-lhe uma imortalidade quase igual à da efígie estampada numa medalha de Waterloo ou num vintém da rainha Ana.

Quem já viajou pelo Hudson acima há de lembrar-se da serra da Kaatskill desmembrado contraforte da cadeia apalachiana que se ergue a nobre altura e domina a zona.

Cada mudança de estação, ou de tempo, e mesmo de hora, produz alguma variação nas cambiantes formas daquela montanha mágica; daí o ser tida pelas donas-de-casa como um perfeito barômetro. Quando o tempo está claro e firme, a serra veste-se de azul e púrpura e estampa a intrépida silhueta sobre o luminoso céu da tarde; outras vezes, quando o resto da paisagem está totalmente sem nuvens, os altos da Kaatskill toucam-se de névoas grisalhas - que, quando atingidas pelos últimos raios do sol, brilham como uma coroa de glória.

O viajante que sobe o Hudson vê longe, no sopé dessa montanha encantada as fumacinhas leves duma aldeola; aqueles tetos de madeira em escamas brilham entre as árvores, justamente lá onde o azul da distância se mistura com o verde fresco da vegetação mais próxima. E uma pequenina aldeia muito velha, fundada por algum colono holandês dos primeiros tempos, no começo do governo do bom Peter Stuyvesant (paz à sua alma); há poucos anos ainda se viam lá algumas casas dos primitivos colonos, construídas de pequenos tijolos amarelados trazidos da Holanda — janelas de rótula e fachada triângulo em cima, com ventoinhas de galo no vértice.

Naquela mesma aldeia e numa daquelas mesmas casas (que, para dizer toda a verdade, estavam tristemente surradas e escalavradas pelo tempo) viveu há longos anos, quando este país ainda era uma província da Grã-Bretanha, um homem simples e bonachão, de nome Rip van Winkle. Descendia duns valentes van Winkles dos tempos cavalheirescos de Peter Stuyvesant, que o acompanharam no assédio de Porto Cristina; mas pouco herdara da belicosidade desses heróis; era um vizinho pacato e, como marido, um galo de crista caída. Sim, ao autoritarismo da esposa talvez se devesse aquela sua humildade famosa; porque os maridos com víboras em casa em regra mostram-se muito conciliadores e obsequiosos na rua. O malho e a bigorna da tribulação caseira tornam-lhes maleável e macio o temperamento; para ensinar as virtudes da paciência e da resignação, nada existe de melhor que os sermões-na-cama. E se a certos respeitos uma esposa truculenta pode ser considerada uma bênção, Rip van Winkle era três vezes abençoado.

Vinha daí ser muito querido entre as donas-de-casa da aldeia, as quais, como é de uso no sexo amável, tomavam parte em todas as briguinhas de família — e quando mexericavam a respeito das desordens dos van Winkles nunca deixavam de dar a ele toda a razão e nenhuma à dama sua esposa. A meninada da aldeia também pulava de alegria ao vê-lo aproximar-se. Van Winkle assistia aos esportes da meninada, fazia brinquedos para um e outro, ensinava-os a empinar papagaios e jogar a bolinha, e ainda lhes contava histórias de fantasmas, feiticeiras e índios. Sempre que ele se esgueirava pela aldeia, um bando de garotos o seguia, e penduravam-se nele, puxavam-lhe a roupa, pregavam-lhe mil peças com a maior impunidade; e cachorro nenhum latia ao vê-lo rondar pelas vizinhanças.

O grande erro na constituição de Rip estava na sua invencível aversão por qualquer trabalho proveitoso. Não que lhe faltasse assiduidade e perseverança, POIS que se sentava numa pedra, com uma vara pesada e comprida como lança tártara, e ali ficava pescando o dia inteiro sem uma queixa, embora nenhum Peixinho lhe beliscasse a isca. Levava a tiracolo a espingarda de caça durante horas, através do mato e de brejais, ou morro acima e perambeiras abaixo, para caçar uns tantos esquilos ou pombas-rolas. Nunca se recusava a assistir um vizinho, mesmo em trabalhos duros; e era o primeiro da zona nos mutirões para descascar milho ou erguer vedos de pedra solta; as mulheres da aldeia também costumavam empregá-lo como leva-e-traz, e em certos trabalhos que os maridos pouco serviçais refugavam. Em resumo, Rip estava sempre pronto para ajudar nos negócios dos outros, só não ajudava nos seus próprios; aquilo de cumprir os deveres de chefe de família e conservar em ordem o patrimônio, ah, isso não era com ele.

E chegou a proclamar a inutilidade de qualquer esforço naquele chão, pois se tratava da terra mais pestilenta de todo o país; tudo ali saía errado; e prosseguia errado por mais que ele fizesse. As cercas viviam caindo; a vaca, ou tresmalhava ou invadia a horta atrás das couves; o mato crescia muito mais depressa que nas propriedades dos outros; e as chuvas timbravam em cair justamente quando ele tinha algum trabalho a fazer ao ar livre; de modo que embora o seu patrimônio houvesse minguado de acre em acre até reduzir-se a quase uma simples horta de milho e batatas, mesmo assim era o mais maltratado das redondezas.

Seus filhos andavam esfarrapados e largados como se não pertencessem a ninguém. O pequeno Rip, um perfeito retrato do pai, prometia ser um herdeiro completo — das roupas velhas e dos maus hábitos paternos. Geralmente era visto trotando como potrinho atrás de Dame Winkle, metido num calção velho do pai, que ele segurava com uma das mãos como em dia de lama na rua fazem as mulheres com as saias.

Rip van Winkle, entretanto, era um desses felizes mortais de disposição relaxada que encaram o mundo com bonomia, comem indiferentemente pão branco ou preto onde quer que o apanhem com o mínimo esforço e preferem passar fome de mãos metidas nos bolsos vazios a terem-nos cheios de libras à força de trabalho. Deixado sobre si mesmo, Rip teria passado a vida a assobiar, muito contente de tudo; mas a esposa não cessava de o atenazar com sermões sobre a preguiça, o relaxamento e a ruína a que estava arrastando a família. Da manhã à noite aquela língua não parava de dar e dar; e tudo quanto ele dizia ou fazia era pretexto para as maiores tempestades de eloquência caseira. Rip só tinha um meio de responder aos sermões, o qual, com a continuação, fez-se-lhe hábito. Dava de ombros, sacudia a cabeça, fechava os olhos — e não abria a boca. Isto, porém, provocava novos acessos de invectivas da mulher, e o remédio então era esgueirar-se para fora de casa — o último recurso, na verdade, dos maridos muito bicados pelas esposas.

O único amigo de Rip ali na casa era o cão Wolf, outra vítima da excelente lher porque Dame van Winkle tinha-os aos dois como companheiros de vagabundagem, e olhava para Wolf com olho mau, como se fosse o culpado da maudade do marido. Em todos os pontos era Wolf um animal perfeito, e nenhum mais corajoso corria à aventura por aqueles matos: mas que coragem pode resistir ao martelamento duma língua de mulher? Tão valente lá fora, assim que entrava em casa punha-se de crista caída, cauda baixa ou entre as pernas, e esgueirava-se por ali com ar de criminoso; e ao menor movimento de Dame van Winkle na direção do cabo de vassoura ou da colher de pau, sumia-se porta afora ganindo preventivamente.

As coisas foram indo de pior em pior à medida que os anos matrimoniais passavam; um temperamento azedo não se edulcora com a idade, e língua afiada é o único instrumento de corte que não fica embotado com o uso. Por longo tempo Rip consolou-se, quando posto fora de casa, com uma espécie de clube de sábios, filósofos e outros vadios da cidade, em sessão permanente num banco externo da pequena taverna assinalada por um rubicundo retrato de Sua Majestade Jorge III. Sentavam-se lá à sombra, nos longos, preguiçosos dias de verão, e mexericavam displicentemente sobre os diz-que-diz-ques da aldeia, ou contavam sonolentas histórias sem fim sobre coisa nenhuma.

Mas seria de grande valor para um estadista ouvir as profundas discussões em que às vezes se empenhavam, quando algum jornal velho, deixado na hospedaria por um viajante, lhes caía nas mãos. com que solenidade o grupo ouvia a leitura engrolada por Derrick van Bummel, o mestre-escola, um lépido homenzinho sabido que não se assustava com o mais crespo vocábulo do dicionário; e como sabiamente eles deliberavam, com alguns meses de atraso, sobre os grandes acontecimentos políticos.

As opiniões daquela junta eram controladas por Nicholas Vedder, um dos patriarcas da aldeia e dono da taverna, na porta da qual ficava da manhã à noite, só se movendo o suficiente para evitar o sol e conservar-se na sombra da árvore fronteira: de modo que os vizinhos podiam saber a hora certa com um simples olhar para a sua posição.

É verdade que raro o ouviam falar, mas não tirava da boca o cachimbo. Apesar disso, seus aderentes (porque todos os grandes homens tem seus aderentes) compreendiam-no muito bem e sabiam como lhe adivinhar as opiniões.

Quando o que era lido ou contado o desagradava, as baforadas lhe saiam da boca com mais veemência, com mais frequência, e projetavam-se mais longe; quando agradado com o que ouvia, Vedder tragava lenta e tranquilamente e soltava a fumaça em leves e serenos rolos; e às vezes, tirando o cachimbo da boca e deixando a fumaça sair pelo nariz, gravemente balançava a cabeça no clássico movimento de aprovação.

Pois até daquela fortaleza acabou Rip van Winkle expungido pela tremenda esposa, a qual irrompeu certa vez inesperadamente e descompôs a todos; nem mesmo o augusto personagem que era Nicholas Vedder livrou-se da língua da megera, que o acusou de fomentar os hábitos de preguiça do marido.

O pobre Rip já estava quase reduzido ao desespero; seu único recurso para escapar ao trabalho da horta e às celeumas da esposa reduziu-se a passar a mão na espingarda e afundar na floresta. Lá sentava-se ao pé duma árvore e repartia o conteúdo da bolsa com Wòlf, o fiel companheiro de desditas. "Pobre Wolf", dizia ele, "tua patroa dá-te uma vida de cão; mas não te incomodes, meu caro, porque enquanto eu for vivo, não te faltará companheiro." Wolf sacudia o rabo e olhava fixamente para aquele rosto resignado; e se os cães sentem piedade, sinceramente creio que ele sentia pelo amo o mesmo que o amo sentia por ele.

Num desses passeios pela floresta, por um belo dia de outono, Rip distraidamente alcançou um dos pontos mais altos da Kaatskill. Fora à caça dos caxinguelês, o seu esporte predileto, e aquelas silenciosas solidões ecoavam os seus tiros. Arquejante e exausto deixou-se cair, tarde já, num tufo de erva à beira dum desbarrancado.

Por entre as frestas do arvoredo podia ver todo o vale lá embaixo, em milhas de extensão. Longe, bem longe, o majestoso Hudson serpenteava silenciosamente, aqui refletindo uma rósea nuvem do céu ou a vela duma preguiçosa barca, ali e acolá dormindo nos remansos, e por fim perdendo-se no azul distante.

Do outro lado daquele topo de montanha corria uma pequena rechã, selvática, solitária, toda pedrouços rolados das encostas e apenas iluminada de raspão pelos últimos raios do sol moribundo. Por algum tempo absorveu-se Rip no quadro; começava a escurecer; as montanhas distendiam sobre os vales suas grandes sombras violáceas; e como já não pudesse alcançar a aldeia antes da noite, Rip deu um profundo suspiro ao imaginar a recepção da terrível esposa.

Começou a descer, súbito, uma voz, longe: "Rip van Winkle! Rip van Winkle!" Ele olhou em torno e nada viu além dum corvo solitário a riscar o céu. Considerou-se enganado pela imaginação e prosseguiu na descida - mas a mesma voz repetiu: "Rip van Winkle!" ao mesmo tempo que Wolf, colado ao amo e com olhos medrosos fixos na rechã, arrepiava-se todo e uivava. Uma vaga apreensão arrepiou Rip ao olhar na mesma direção e ver uma estranha figura lentamente galgando as pedras, arcada ao peso da carga trazida às costas. Rip surpreendeu-se de dar com um ser humano ali naquele deserto; mas imaginando que fosse alguém morador das vizinhanças necessitado de assistência, foi-lhe depressa ao encontro.

Vendo-o de mais perto, surpreendeu-se ainda mais com a esquisita aparência da criatura. Era um tipo forte e atarracado, muito cabeludo e de barba grisalha. Vestia-se à velha moda holandesa — gibão de pano atado à cintura —vários calções, o exterior muito largo e lateralmente enfeitado com carreiras de botões.

Trazia ao ombro um pesado barrilete, aparentemente de gim, e fez sinal a Rip que viesse ajudá-lo a carregar aquilo. Embora desconfiado, Rip assentiu, com a sua habitual bonomia; e, revezando-se, os dois se foram de barrilete às costas por uma ravina estreita, com aspecto de leito seco de velha torrente na montanha. À medida que subia, ia Rip ouvindo, a espaços, um rebôo distante como de trovão, saído duma grande fenda aberta nas altas rochas e para a qual aquele acidentado caminho conduzia.

Entreparava por alguns instantes, mas supondo que fosse ronco dos rápidos aguaceiros que costumam irrigar aos altos das montanhas, prosseguia. Por fim chegaram a uma depressão em forma de pequeno anfiteatro, rodeada de altos paredões, por sobre os quais pendiam ramagens de árvores, pouco céu deixando ver lá do fundo. Durante todo o tempo Rip e o companheiro haviam caminhado em silêncio; porque embora Rip estivesse curiosíssimo de saber a razão daquele subir morro de barrilete às costas, a estranheza do desconhecido sofreava-se a familiaridade.

Ali no anfiteatro novos objetos de estranheza o surpreenderam. Num ponto nivelado, bem no centro, um grupo de esquisitos seres humanos jogava o nove paus. Vestiam-se  exoticamente, alguns com gibão curto e compridas facas à cinta, e quase todos com larguíssimos calções como os do guia. Caras também muito peculiares: um com barba toda, rosto largo e olhinhos de porco; outro parecia só nariz, com um chapéu em pão-de-açúcar em cima, enfeitado de um vermelho rabo de galo. Todos barbados, e barbas de várias formas e cores. Um parecia o chefe - um velho gentleman forte, de cara queimada pelo sol e os ventos; trazia gibão bem atacado, cinto largo, espada de marinheiro, chapéu alto com pluma, piugas vermelhas e sapatos de salto alto com rosetas. Rip lembrou-se dos personagens dum velho quadro flamengo existente na sala de Dominie van Shaick, o pároco da aldeia, trazido da Holanda no tempo da colonização.

O que a Rip mais estranheza causou foi que eles evidentemente se divertiam, embora muito sérios e em misterioso silêncio, formando o grupo de festeiros mais melancólico que ele jamais vira. Nada quebrava a quietude da cena a não ser o barulho das bolas de pau, cujo rolar ecoava na montanha como um reboo de trovão.

Ao verem chegar o companheiro com aquele desconhecido, largaram do jogo e puseram-se a olhar para Rip com tanta fixidez de estátua e tais caras que coração deste conturbou-se e seus joelhos fiectiram. O homem do barrilete despejou o conteúdo em várias pichorras e fez-lhe sinal para que servisse aos homens. Rip, a tremer, obedeceu em silêncio; e no maior silêncio os jogadores emborcaramas pichorras, voltando em seguida ao jogo.

Aos poucos foi amortecendo em Rip o medo. Chegou até a provar da bebida, num momento em que ninguém tinha os olhos do seu lado; viu que era um excelente gim holandês.

E sua alma naturalmente sequiosa foi tentada a repetir o gole. E tantos goles repetiu que a tonteira veio, os olhos turvaram-se-lhe, a cabeça foi descaindo — e afinal desabou por terra, tomado de profundo sono.

Quando acordou, viu-se no ponto de onde pela primeira vez vira o homem do barrilete — e linda manhã de sol fazia. Passarinhos saltavam e regorjeavam nas árvores, e a águia descrevia curvas muito altas, inebriando-se com as brisas montanhesas. "É claro que não passei aqui a noite inteira", pensou consigo Rip — e pôs-se a recordar as ocorrências anteriores à camoeca. O estranho sujeito com o barrilete de gim - o masmurro jogo de bola - a pichorra... "Oh, aquela pichorra, aquela maldita pichorra!", pensou Rip. "Que desculpa irei dar a Dame van Winkle?"

Olhou em roda em procura da espingarda, mas em vez de sua bem areada e azeitada caçadeira, só viu ali um caco-velho de cano enferrujado, gatilho caindo e coronha comida de caruncho. Não havia dúvida que aqueles esquisitões da montanha lhe tinham pregado alguma peça - posto narcótico no vinho e furtado a espingarda. Também Wolf desaparecera - com certeza andava atrás dalgum esquilo ou perdiz. Assobiou, gritou-lhe o nome, mas inutilmente, o eco repetia os apelos, mas o cachorro não dava sinal de si.

Rip resolveu voltar ao sítio do jogo para perguntar àqueles homens pela sua espingarda e o cão. Ao erguer-se sentiu-se de juntas emperradas e sem a normal agilidade de movimentos. "Estas camas da montanha não me fazem bem", murmurou consigo, "e se de tudo me resultar um ataque de reumatismo,vou ter um tempo-quente com Dame van Winkle." Foi com dificuldade que desceu à rechã; encontrou logo a ravina que na véspera subira com o homem do barrilete, mas com espanto verificou que por ela corria uma torrente, a espadanar-se de pedra em pedra e a encher o ar do rumor das corredeiras. Rip foi varando pela margem comesforço, por entre os troncos das bétulas, sassafrases e aveleiras, tropeçando, enganchando-se na cipoeira silvestre que lançava rebrotos e gavinhas de árvore em árvore e assim retrancava o seu caminho.

Alcançou por fim o ponto em que a antiga ravina se alargava em anfiteatro.

Mas... onde a passagem? Nem sinal da abertura havia. As rochas formavam um paredão impenetrável, pelo qual vinha a torrente até a profunda e larga bacia imersa na sombra da floresta circundante. E Rip ficou sem saber o que fazer. Ainda assobiou e chamou pelo cachorro, só tendo como resposta os crocitos dum bando de corvos numa grande árvore morta junto a uma barranqueira batida de sol; bem seguros no alto poleiro, os corvos olhavam e mofavam das atrapalhações do homem. Que fazer? O sol já ia alto e o estômago de Rip tinha exigências. Que pena perder a espingarda e o cachorro! Mas não podia ficar ali toda a vida a procurá-los. E, sacudindo a cabeça, Rip levou ao ombro o caco-velho e de coração ansioso fez-se de volta.

Ao aproximar-se da aldeia, cruzou com várias pessoas que nunca vira. Como? Pois não conhecia todos os moradores daquela terra? E gente vestida de outra moda. Olhavam-no com a mesma surpresa com que ele as olhava, e invariavelmente todos levavam a mão ao queixo. A repetição daquele gesto fez que Rip, sem querer, fizesse o mesmo — e com grande espanto percebeu que estava com uma barba de quase dois palmos de comprimento.

E com isso alcançou a aldeia. Um bando de crianças desconhecidas logo se formou, a segui-lo, gritando e apontando para a sua grande barba grisalha. Os cães também, nenhum deles de seu conhecimento, latiam-lhe à passagem. Tudo diferente na aldeia. Crescera o número de prédios e o movimento das ruas. Quanta casa que ele não vira nunca —e onde as velhas baiúcas amigas? Tabuletas com dizeres estranhos — tudo estranho... Rip começou a ficar com medo, a pensar que talvez ele e tudo mais estivesse enfeitiçado. Mas não havia dúvida de que aquela aldeia era a sua velha aldeia, a mesma que deixara na véspera.

Lá estava a serra do Kaatskill - lá longe deslizava a fita de prata do Hudson —e os morros vizinhos e o vale ele os via como sempre foram. Rip, sempre perplexo, atribuiu tudo ao gim. "Aquela pichorra de ontem me estragou duma vez a pobre cabeça", era o pensamento que mais lhe acudia.

Com algum esforço descobriu o caminho de sua casa, e dela aproximou-se caladinho e de coração suspenso, à espera do temporal tremendo — mas a casa estava em ruínas, de teto desabado, janelas escangalhadas, portas fora dos gonzos. Um cão pele-e-ossos esquivava-se por ali. Rip chamou-o, "Wolf, Wolf!" mas o feio bicho arreganhou os dentes, rosnou e foi saindo. Aquilo lhe doeu. Será que até meu cachorro se esqueceu de mim?", suspirou o pobre Rip.

Entrou na casa que, seja dito entre parênteses, Dama van Winkle sempre trouxera muito limpa. Vazia!... Aparentemente abandonada. Aquela desolação se sobrepôs a todos os temores e Rip chamou em voz alta pela mulher e os filhos. Os cômodos desertos vibraram ao som de sua voz e tudo voltou de novo ao silêncio.
Rip saiu ansiosamente à procura da velha hospedaria - e nada que a lembrasse encontrou. Em seu lugar uma velha construção de madeira, vidraças quebradas mal remendadas ou com velhos chapéus e saias velhas enfiadas nos buracos; em cima, um letreiro "Hotel União, de Jonathan Doolittle". Em vez da grande árvore fronteira, um mastro nu com uma espécie de carapuça vermelha no topo — e nesse mastro afiava uma bandeira com um singular desenho de listras e estrelas... tudo estranho e incompreensível. Mas Rip reconheceu na insígnia do hotel a cara rubicunda do Rei Jorge III, debaixo da qual ele havia cachimbado tanto; mas a própria efígie do rei estava transformada. O capote vermelho passara a azul e  amarelo camurça; em vez de cetro, o rei trazia espada e tinha na cabeça um chapéu de dois bicos; embaixo estava escrito GENERAL WASHINGTON.

O ajuntamento ali era como outrora, mas Rip já não reconheceu ninguém. O próprio caráter do povo parecia mudado. Gente irrequieta e animada, em vez de fleumática e sonolenta. Em vão seus olhos procuravam o grave Nicholas Vedder, de cara cheia, papadinha e eterno cachimbo na boca, pronunciando nuvens de fumo em vez de ociosos discursos; ou van Bummel, o mestre-escola, a escorropichar tópicos de jornais velhos. Em vez desses amigos, um sujeito magro e bilioso, com os bolsos cheios de impressos, arengava veementemente sobre os direitos dos cidadãos — eleições — membros do congresso — liberdade — Bunker Hill — heróis de 76 — e outras coisas sem a menor significação para o estonteado van Winkle.

O aparecimento de Rip com aquela comprida barba grisalha, o enferrujado caco-velho ao ombro, a roupa antiquada e um bando de meninos e mulheres atrás, atraiu a atenção dos espoletas eleitorais ali da taverna. Rodearam-no e examinaram-no com grande curiosidade dos pés à cabeça. O orador dirige-se a ele e indaga de que lado ia votar. Rip encarou-o com ar idiota. Outro sujeito, um pequenitote e ativo caça-votos, puxou-o pelo braço e, erguendo-se na ponta dos pés, perguntou-lhe ao ouvido:

"Federal ou Democrata?" Rip não compreendia coisa nenhuma. Súbito, um velho gentleman muito importante de chapéu de dois bicos, varou a multidão a ombradas e plantou-se diante dele com a mão esquerda à cintura e a direita apoiada no bengalão; e com olhos penetrantes, e aquele chapéu a varejar a alma de Rip, indagou emtom severo:

— Que história é essa de comparecer às eleições de espingarda ao ombro e multidão à cola? Pretende porventura provocar desordens aqui?

— Ah, senhor! — exclamou Rip, consternado. — Sou um pobre homem inofensivo cá da terra, leal súdito do Rei Jorge, que Deus abençoe!

Uma grita ergueu-se em redor: "Tory! Um tory!... Espião! Refugiado! Rua com ele! Fora daqui!..." Foi com muita dificuldade que o homem importante de chapéu de dois bicos restaurou a ordem; e fechando ainda mais a carranca, perguntou de novo ao culpado o que viera fazer ali e o que queria. O pobre Rip humildemente lhe assegurou que não queria fazer nada de mau; chegara até ali apenas para ver se encontrava algum dos velhos vizinhos, fregueses da taverna.

Muito bem. E quem são eles? Diga os nomes.

Rip considerou um momento e:

—Onde está Nicholas Vedder?

Fez-se o silêncio por uns instantes; depois um velho respondeu em voz sibilante:

— Nicholas Vedder? Oh, faleceu há 18 anos! Havia uma tábua no cemitério com a história dele, mas já apodreceu e se foi.

— E Brom Dutcher?

— Oh, esse engajou-se no exército logo no começo da guerra. Dizem que foi morto no assalto a Stony Point; outros querem que se tenha afogado num temporal em Antony's Nose... Não sei. Nunca mais apareceu por aqui.

— E onde anda van Brummel, o professor?

— Foi também para a guerra, virou grande general de milícia e agora está no congresso.

O coração de Rip esmorecia mais e mais à proporção que o informavam daquelas mudanças. Sim, estava só no mundo. Cada resposta o surpreendia não apenas revelando enormes lapsos de tempo como dizendo respeito a coisas acima da sua compreensão — guerra — congresso — Stony Point; e não tendo mais coragem de perguntar pelos velhos amigos, gritou com desespero:

— E será que ninguém conhece aqui Rip van Winkle?

— Oh, certamente! — exclamaram dois ou três. — É aquele que está lá longe, encostado àquela árvore — e apontaram.

Rip olhou e viu-se a si mesmo como era na véspera, quando partiu com Wolf e a espingarda para a montanha — o mesmo ar negligente, a mesma roupa esfarrapada. E sentiu-se completamente tonto. Duvidava da sua própria identidade — se era ele mesmo ou outro homem. E estava naquilo quando o homem importante de chapéu de dois bicos perguntou-lhe quem era e como se chamava.

— Como me chamo? Deus sabe! Não sou mais eu mesmo... sou outro... eu estou lá naquela árvore... não... é alguém vestido como eu. Eu ainda era eu mesmo ontem, mas dormi na serra e eles me trocaram a espingarda e tudo mudou, de modo que já não posso dizer quem sou nem como me chamo.

Os circunstantes começaram a entreolhar-se, a sacudir a cabeça, a piscar significativamente, com pancadinhas de ponta do dedo na testa. Um murmúrio correu: era preciso tomar-lhe a espingarda antes que saísse distúrbio — e ao ouvir o homem importante de chapéu de dois bicos afastou-se com certa precipitação. Nesse momento uma bonita mulher ainda bem moça varou a multidão para dar uma olhada de perto. Trazia nos braços uma criança gorducha que, assustada com o aspecto do velho barbaças, se pôs a chorar.

— Sossega, Rip... bobinho!... Ele não vai te comer.

O nome da criança e mais o tom da voz e o ar da mãe buliram com as memórias de van Winkle.

— Como é seu nome, moça bonita? perguntou ele.

— Judith Gardenier.

— E quem era seu pai?

— Ah, coitado! Chamava-se Rip van Winkle, mas há vinte anos que saiu de casa com a caçadeira e nunca mais voltou; o cachorro reapareceu sozinho, mas ele suicidou-se no mato ou foi levado pelos índios, ninguém sabe. Eu era então uma pequenitota.

Rip só tinha mais uma pergunta a fazer, e fê-la com voz vacilante:

— E... e... sua mãe?

— Também morreu, faz muito tempo. Rebentou-lhe uma veia num acesso de cólera por causa de um mascate de New England.

Um orvalho de alívio caiu afinal na alma de van Winkle, e o pobre homem não pôde conter-se mais tempo. Abriu os braços para a filha e o netinho choramingão, exclamando:
— Sou teu pai, minha filha! Fui o jovem Rip van Winkle e sou agora o velho Rip van Winkle! Ninguém conhece aqui o pobre Rip van Winkle?

Todos se quedaram assombrados, até que uma trêmula velhinha se destacou da multidão e, levando a mão à sobrancelha para ver melhor, encarou-o por uns instantes.

— Sim, sim, é Rip van Winkle... é ele mesmo. Bem-vindo seja, velho vizinho. Por onde andou todo esse tempo?

A história de Rip era bem curta, pois os vinte anos se reduziam a uma noite, e os vizinhos arregalaram os olhos ao ouvi-la; alguns piscavam incredulamente; ou estufavam uma bochecha com a língua; e o homem importante de chapéu de dois bicos, que ao ver tudo em paz havia voltado, torceu a boca e sacudiu a cabeça — determinando um geral sacudimento de cabeça na assistência.

Resolveu-se afinal ouvir o parecer do velho Peter Vanderdonk, que vinha vindo arrastando o pé. Era descendente do historiador do mesmo nome, autor de uma das primeiras histórias da província. Peter gozava a fama de ser o homem mais velho da aldeia e muito versado em coisas antigas e tradições.

Chegou e imediatamente reconheceu Rip van Winkle, corroborando o seu caso da maneira mais decisiva. Assegurou à assistência ser fato conhecido de seu antepassado historiador que a Serra de Kaatskill sempre fora enfeitiçada por estranhos duendes. De vinte em vinte anos Hendrick Hudson, o descobridor do rio e da região, aparecia por lá com os tripulantes do Half Moon, e desse modo visitava os sítios de suas façanhas e mantinha de olho o rio e a grande cidade que trazia seu nome. Disse ainda que o pai tinha-os visto uma vez, entrajados à antiga moda dos holandeses e entretidos no jogo dos nove-paus numa buraqueira na serra — e que ele próprio havia ouvido, certa tarde de verão, o som da bola a rolar — tal qual um trovão distante.

Para resumir a história: o grupo dispersou-se, indo todos cuidar da eleição. A filha de Rip levou-o para casa, a viver com ela — uma casinha cômoda e bem mobiliada; tinha um marido forte e bom trabalhador da terra — um daqueles antigos moleques que perseguiam Rip e trepavam-lhe às costas; quanto ao filho e herdeiro de Rip, justamente aquele moço que ele vira encostado à árvore e era a cara do pai, também estava empregado no amanho da propriedade e tinha disposição para atender a tudo, menos ao seu trabalho.

E Rip afinal retomou os seus velhos hábitos e velhos passeios; descobriu alguns dos camaradas antigos, mas tão deteriorados pelo decurso do tempo que preferiu arranjar amigos na nova geração, dos quais passou a ser muito querido.

Nada tendo a fazer em casa, e havendo chegado à feliz idade em que um homem pode vadiar impunemente, retomou o seu lugar no banco da hospedaria, onde todos o reverenciavam como um dos patriarcas da aldeia e a crônica viva dos velhos tempos de "antes da guerra". Algumas semanas correram antes que ele se pusesse em dia com a mexericagem do lugarejo e ficasse bem a par dos estranhos acontecimentos ocorridos durante os vinte anos de torpor. Soube que tinha havido uma revolução e que o país se libertara do jugo da Inglaterra; e que em vez dele ser súdito de S. M. Jorge III era agora cidadão dos Estados Unidos. Rip nunca fora político; as mudanças nos estados e impérios não buliam com a sua curiosidade; mas certa espécie de despotismo não tolerava — ah, isso não!

O despotismo da saia... Felizmente também esse despotismo desaparecera; estava ele com o pescoço fora da canga matrimonial, podendo ir para onde quisesse, sem aquele antigo pavor da tirania de D ame van Winkle. Apesar disso, sempre que o nome da esposa era mencionado, ele sacudia a cabeça ou dava de ombros e levantava os olhos — gestos que tanto podem significar resignação ao destino como alegria de ver-nos livre de alguém.

Gostava de repetir sua história a todos os viajantes alojados no hotel de Mr. Uoolittle. No começo, o caso variava em alguns pontos cada vez que era contado, circunstância evidentemente devida ao tão recente despertar de Rip. Por fim se cristalizou na forma como a narrei, não havendo homem, mulher ou criança as redondezas que a não soubesse de cor. Alguns pretendiam duvidar da realidade da história, achando que Rip estivera muito tempo transtornado da cabeça e isso e ponto que sempre permanecerá em dúvida. Os velhos moradores holandeses, entretanto, eram quase unânimes em dar-lhe crédito. Ainda hoje nunca ouvem o rolar dum trovão na serra de Kaatskill sem que digam: "Hendrick Hudson e sua gente lá está a jogar o nove-paus" - e não há marido atormentado pela mulher que não suspire por um gole da pichorra de Rip van Winkle.


Post-scriptum

São estas as notas do livro de Mr. Knickerbocker:

"A serra de Kaatskill, ou Catskil, sempre foi uma região lendária. Os índios tinham-na como a morada de espíritos que influenciavam o tempo, espalhavam sobre a paisagem a luz do sol ou nuvens, e tornavam boas ou más as estações de caça. Esses espíritos eram governados pelo de uma velha índia que se dizia mãe de todos. Morava no pico mais alto da serra, e tinha a seu cargo abrir e fechar em horas certas as portas do dia e da noite. Era quem pendurava no céu as luas novas e picava as velhas para fazer estrelas. Se a propiciavam devidamente em tempo de estiagem, a velha índia fiava leves nuvens de verão com fios de orvalho matutino, e do alto da serra os ia espalhando, froco após froco, como chumaços de algodão cardado, para que flutuassem no ar e por fim se fundissem em chuva ao calor do sol, molhando a terra, amadurecendo as frutas e fazendo o milho crescer uma polegada por hora. Se estava zangada, produzia nuvens negras como tinta e sentava-se no meio delas como aranha no aranhol; e quando essas nuvens se rompiam, ai das terras embaixo!

"Nos velhos tempos - diziam as tradições dos índios - houve uma espécie de Manitu ou Espírito que guardava os ásperos recessos da serra do Catskil e regalava-se de atormentar os homens de pele vermelha com toda sorte de maldades. Às vezes assumia a forma dum urso, ou duma onça, ou dum veado - e arrastava o caçador a uma exaustiva caçada por aquelas padranceiras, até que, gritando 'Ho! Ho!', deixava-o de cabelos em pé à beira dum precipício ou torrente.

A morada favorita desse manitu ainda hoje é mostrada: um grande pedronço na parte mais solitária da serra, conhecida como Garden Rock, por causa das muitas trepadeiras que retrancam o pedrouço e das flores silvestres do sítio. Ao sopé da pedranceira há um pequeno lago, refúgio do triste alcaravão e de cobras d'água que tomam sol sobre as folhas das plantas aquáticas. Esse lugar causava grande pavor aos índios, a ponto de nem os mais atrevidos se atreverem a perseguir a caça até ali. Certa vez, entretanto, um caçador extraviado foi até lá e viu um certo número de cabaças na forquilha das árvores. Tomou uma e quis afastar-se com ela, mas na precipitação deixou-a cair entre as pedras — e uma poderosa torrente brotou e arrastou-o para o precipício, fazendo-o em postas. A torrente seguiu caminho rumo ao Hudson - e nunca mais deixou de fluir, sendo conhecida pelo nome de Kaaters-kill."


Comentários

  1. Lembro que qdo criança, lá nos 70's, num sabado às 17h ter visto no programa Disneylândia, uma animação contando a estória do Rip e de como dormiu na floresta e acordou 20 anos depois, bem como descrito, com gnomos e pichorra.

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  2. Vim ler o conto, pois o Spotify me recomendou uma música muito boa chamada Rip Van Winkle, da banda Witch, e quis saber mais

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