A PUNIÇÃO DO BLASFEMO - Narrativa Clássica de Terror - Antonio de Torquemada


A PUNIÇÃO DO BLASFEMO
Antonio de Torquemada
(c. 1507 – 1569)

Haverá dezessete ou dezoito anos, passou-se um acontecimento perto de uma vila chamada Benavides.

Vindo dois homens pelo campo, em um dia que se fazia tempestuoso, de mui grandes ventos, levantou-se um torvelinho tão grande e tão forte que causou assombro em muitos que o viam.

Estes dois homens, querendo fugir do torvelinho, que vinha em sua direção, e para que redemoinho não os alcançasse, puseram-se a correr apressadamente. Mas a carreira não foi suficiente a evitar que o torvelinho os apanhasse e os envolvesse em seu interior.

E, temendo que fossem arrebatados aos ares, eles estiraram-se no chão, onde o torvelinho permaneceu uns bons instantes sobre eles.
 
Depois, passando adiante o redemoinho, um dos que estavam estendidos no chão se levantou tão fatigado e atormentado que mal podia manter-se de pé. Seguiu direto para onde estavam os que o observavam. Estes, vendo que o outro homem não fazia mostra de se levantar, nem de se mexer, foram ver o que se passava, porque o encontraram morto e com sinais dignos de admiração: tinha os ossos todos tão moídos que era coisa fácil revirar as canelas nas pernas e nos braços de um lado para os outros. Todo o seu corpo parecia feito de massa. E, demais disto, não tinha língua, arrancada que fora desde a raiz. Procurada, a língua não foi encontrada. 

Houve alguns inquéritos judiciais sobre este incidente e, enfim, todos vieram a decidir que este homem jurava e blasfemava muitas vezes e que, por causa disto, Deus permitira que morresse antes que mais o ofendesse com blasfêmias da língua. Pode meio daquela língua, quis dar mostra de um sinal, visto como foi arrancada e nunca pôde ser achada.

Narrativa constante do Jardín de Flores Curiosas, 1575.


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