O MESMO - Conto Fantástico - Roberto Prado Barbosa Junior
O MESMO
Roberto
Prado Barbosa Junior
O
despertador toca às seis horas em ponto.
Mais
um dia, um dia igual ao de ontem, em suas alegrias e tristezas, o mesmo Sol, as
mesmas nuvens no mesmo lugar, como se fossem pintadas na tela azul do céu. O
canto dos pássaros como num disco de vinil arranhado. E ele que gostava do
canto dos sanhaços...
A
campainha da porta toca.
—
Mauro, passe amanhã — grita da cozinha sem se dar ao trabalho de ver quem é.
—
Mas você disse isso ontem – responde Mauro.
—
E direi o mesmo amanhã e depois de amanhã —responde passando manteiga no pão, o
mesmo pão de ontem, que será também o de amanhã.
Os
passos de Mauro descendo as escadas, a porta da rua batendo, os pneus do carro
derrapando na rua e quase atropelando Mauro, que escapa por um triz. Antes ele
corria à janela para ver o que havia acontecido...
O
mesmo dia se repetindo.
Ele
abre o jornal, ainda quente, o cheiro da tinta, dobrado sobre a mesa. Na
manchete a mesma tragédia, o mesmo número de mortos, seu horóscopo com a mesma
previsão, “cuidado com a alimentação e
falsos amigos, aproveite seu dia como se fosse o último”.
—
Antes fosse! — pensou alto num longo suspiro.
O
mesmo dia de trabalho, aquele processo sem solução, a mesma bronca do chefe na
mesma hora da tarde — 15h30s no relógio da praça, onde mostrava ainda a
temperatura, 32º —, o mesmo telefonema
atrás da funcionária Madalena da Silva – Tia Dadá do café, a mesma resposta:
—Ela
está de férias.
E
pensou: “longas férias...”
De
volta à sua casa, a mesma dose de formicida, as mesmas dores nas tripas sendo dissolvidas,
o desmaio, o baque no chão quadriculado e frio, o acordar na cama no dia
seguinte com despertador tocando às seis horas em ponto...
O
mesmo dia se repetindo.
Se
ao menos ele se lembrasse de trocar a folhinha ao acordar...
Imagem:
Edvard Munch
Amo ler você meu amigo!
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