O SONHO DE SCHUMANN - Conto de Ficção Científica - José Ángel Conde
O
SONHO DE SCHUMANN
José
Ángel Conde
Tradução
de Paulo Soriano
Quase
todas as civilizações haviam vaticinado que o futuro irromperia com um brusco
incidente que rebentaria o fluxo de sua história. A cadência harmônica de picos
e vales no gráfico de ondas teta do eletroencefalograma confirmou, mais uma vez,
a Ryn quanta histeria e fatalismo havia na escatologia. Além da janela
panorâmica do edifício do laboratório, os relâmpagos azuis nasciam e morriam
com suas linhas fractais no céu de metal. Depois daquele allegro
climático, viria a neve, sublinhando as pausas elétricas, como vinha fazendo há
tantos imprevistos dias. A tormenta de suas pesquisas havia dado lugar ao
arco-íris da descoberta: a mudança ou mudanças estavam acontecendo o tempo
todo. Era o presente, não o futuro, que era a cadência que operava tão
invisível e efetiva como um vírus, tão somente silenciosa para a arrogante
surdez de nossa espécie. O espectro ondulatório de nosso planeta tinha uma
existência independente dos dispositivos e engenhos que tínhamos desenvolvido
para tentar controlá-lo. Já nem sequer estávamos na posse de nossos próprios
corpos. Ryn e sua equipe tiveram que desenvolver esses implantes nanorrobóticos
para alcançar estas mínimas conclusões com a tecnologia disponível, porque a
mutação, que já afetava a percepção, também estava propiciando o crescimento de
nossos membros. A natureza havia até decidido, com o ímpeto de seu magnetismo,
que o fio musical selecionaria os acordes da Träumerei, de Schumann.
E
se o Apocalipse era certo, por que não poderia significar uma nova
oportunidade? A evolução, bela e espontânea como a música, e igualmente inapreensível.
Ryn saiu para sonhar no terraço, sobre a paisagem branca, sentindo uma
sinestesia que não era tal, mas a vibração do planeta assentindo
inconscientemente. Os filamentos azuis saíram de suas mãos como se suas veias
quisessem escapar ao firmamento, de onde os dedos olímpicos da ionosfera premiam
o teclado da crosta terrestre. Um piano anunciando que as crianças poderiam voltar a nascer e se tornar gigantes do gelo.
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