O VAMPIRO ARNALD PAUL - Narrativa Clássica Sobrenatural - Augustin Calmet
O
VAMPIRO ARNALD PAUL
Augustin Calmet
(1672 – 1757)
Tradução de
Paulo Soriano
Há
cerca de cinco anos, um certo heiduque[1],
que vivia em Medreiga, chamado Arnald Paul, foi esmagado, numa
queda, por uma carroça de feno.
Trinta
dias após sua morte, quatro pessoas morreram repentinamente, e da mesma maneira
que, segundo a tradição do país, falecem os que são atacados por vampiros.
Lembraram,
então, que Arnald Paul costumava contar que, nos arredores de Caslova, perto da
fronteira da Sérvia Otomana, havia sido atormentado por um vampiro turco.
Acreditavam as pessoas que aqueles que eram vampiros passivos durante sua vida
tornavam-se vampiros ativos após a morte; ou seja: os que foram sugados em vida,
passavam a sugar o sangue dos vivos, quando mortos. Arnald Paul acreditava que
houvera encontrado uma maneira de curar-se comendo a terra do sepulcro do
vampiro e esfregando-se com seu sangue. Mas esta precaução que não o impediu de
tornar-se vampiro após sua morte, já que foi exumado quarenta dias após seu
sepultamento, e todos os indícios de um arquivampiro foram encontradas em seu
corpo. O seu cadáver estava corado; seus cabelos, suas unhas e sua barba
estavam crescidos e as suas veias repletas de um sangue fluido, que escorria de
todas as partes de seu corpo e tisnava a mortalha na qual estava envolvido.
O
hadnagi, ou o magistrado do lugar, na presença de quem a exumação
ocorreu, e que era especialista em vampirismo, trazia, de acordo com o costume,
uma estaca muito afiada, que foi cravada no coração do falecido Arnald Paul. A
estaca traspassou completamente o seu corpo, o que — dizem — o fez soltar um
grito terrível, como se vivo estivesse.
Depois
disto, a sua cabeça foi cortada e o cadáver queimado. Em sequência, o mesmo
procedimento foi realizado nos cadáveres das outras quatro pessoas que haviam
morrido de vampirismo, pois receavam que estas pudessem converter em vampiro
outras pessoas.
No
entanto, todas essas cautelas não puderam evitar que, no final do ano passado —
ou seja, ao cabo de cinco anos —, estas calamidades desastrosa recomeçassem e
que vários habitantes da mesma aldeia viessem a morrer.
No
espaço de três meses, quinze pessoas de diferentes idades e sexo morrem de
vampirismo, alguns sem doença alguma e outros após dois ou três dias de definhamento.
Relata-se,
entre outros casos, o de uma jovem chamada Stanoska, filha do heiduque
Jotuïtzo, que fora dormir em perfeito estado de saúde. Contudo, acordou no meio
da noite, completamente trêmula e soltando gritos terríveis. Dizia que o filho
do heiduque Millo, falecido há nove semanas, tentara estrangulá-la enquanto
dormia. A partir deste momento, a moça só fez definhar e, ao fim de três dias,
feneceu. O que dissera a moça acerca do filho de Millo induziu a que este fosse
reconhecido como um morto-vivo. Tendo sido exumado, verificaram que, de fato,
tratava-se de um vampiro.
Os
governantes locais, os médicos e os cirurgiões investigaram o ocorrido,
procurando descobrir como o vampirismo havia conseguido renascer, mesmo diante
das precauções tomadas alguns anos antes.
Descobriram,
finalmente, depois de intensas investigações, que o falecido Arnald Paul não matara
apenas as quatro mencionadas pessoas, mas também vários animais. Estes, por sua
vez, haviam sido comidos pelas pessoas, que se tornaram novos vampiros, dentre
elas o filho de Millo. Com base nessas provas, deliberaram desenterrar todos
aqueles que já estavam mortos há um determinado tempo. Encontraram-se dezessete
corpos com todos os mais evidentes sinais de vampirismo. Esses cadáveres também
tiveram os corações traspassados e suas cabeças cortadas; depois, foram
queimados, e suas cinzas jogadas ao rio.
Todos
os procedimentos e execuções, de que falamos, foram realizados legal e
escorreitamente, sendo atestados por vários oficiais que estavam em serviço na
região, pelos principais cirurgiões dos regimentos e pelos principais
habitantes do local. As atas foram enviadas no final de janeiro passado para o
Conselho de Guerra Imperial em Viena, que havia estabelecido uma comissão
militar para investigar a veracidade de todos esses fatos.
Foi
o que o declararam o hadnagi Barriarar e os velhos heiduques, em
documento assinado por Battuer, primeiro-tenente do regimento de Alexandre de
Virtemberg, Clickſtenger, major-cirurgião do regimento de Frustemburch, outros
três outros cirurgiões da Companhia, Guoichitz, capitão em Stallath.
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