A ESTRANHA DESPEDIDA - Narrativa Sobrenatural - Paulo Soriano
A
ESTRANHA DESPEDIDA
Paulo Soriano
Não
tenho como saber se os fatos que me foram relatados realmente aconteceram. O
que posso afirmar é que a pessoa que me contou a história estava convencida de
sua realidade.
Também
estou certo de que Helguita Alves me falara com absoluta sinceridade. Ela foi a
pessoa mais pura e honesta que já conheci. Bondosa e altruísta, era uma santa.
Santa mesmo.
Os
fatos extraordinários aconteceram em 1988. Dizia-me Helguita que não poderia,
jamais, esquecê-lo: foi no final daquele ano que ela perdeu o filho mais velho,
vítima de um acidente de carro em Minas Gerais.
Contou-me
ela que, como de costume, fora dormir cedo. Alta madrugada, contudo, foi
acordada pela campainha do telefone.
Imediatamente,
levantou-se e correu à sala, sem nem mesmo acender a luz. Assim que segurou o
aparelho, o telefone parou de tocar. Ciente de que, àquelas horas, uma chamada
telefônica era o prenúncio de graves notícias, acendeu a luz e sentou-se ao
lado do aparelho. Esperou com o coração aos pulos.
Mal
o telefone voltou a tocar, Helguita tirou-o do gancho. Então ouviu:
—
Helguita?
—
Quem fala?
—
Sou eu, Sara.
—
Sara? O que houve? Você está bem?
Houve
um profundo silêncio. A voz do outro lado da linha continuou:
—Você,
Helguita, é a minha melhor amiga. Mais que isto, somos irmãs. Desde crianças,
nós nos devotamos uma à outra...
—
Sarinha, o que houve?
—
Peço-lhe desculpas, mas não havia como avisá-la antes. Precisei viajar. Uma
longa viagem. Assim, de repente... Mas não pude deixar de partir...
—
Onde você está, Sarinha? O que houve? Você está bem, amiga?
—
Estou bem. Muito bem, para falar a verdade. Mas não esqueça: eu a amo muito.
Lamento que não tenha podido despedir-me pessoalmente de você. Lembre-se: eu a
amo de todo coração. Adeus...
A
ligação caiu. Helguita esperou, mas Sara não voltou a telefonar. Então, resolveu
ligar de volta. O telefone chamou, chamou, mas ninguém atendeu. Repetiu a
ligação várias vezes. Ninguém atendia ao seu chamado.
Quando
voltou ao quarto, já amanhecia.
Menos
de uma hora depois, o telefone tocou novamente. Era Carlos, marido de Sara.
—
Helguita?
—
Carlos? Como está Sarinha? Ela me ligou agorinha. Disse-me que precisou viajar.
Ligou-me para despedir-se. Para onde foram? Onde vocês estão?
Helguita
escutou um longo suspiro.
—
Helguita, o que você me diz é impossível. Estou no São Lucas. Trago-lhe uma
triste notícia. Sara sentiu-se mal ontem à noite, após o jantar. Corremos ao
hospital. Era um enfarto. Foi socorrida prontamente, mas faleceu às duas horas
da manhã.
Tenho
certeza de que Helguita me não inventaria uma coisa assim, especialmente porque
ligada a um acontecimento sobremodo grave — e delicado — que é morte de um ente
muito querido.
Muitos
anos depois, conheci Carlos. Com muita cautela, abordei o assunto. Carlos
corroborou a história. Absurdamente, Sara conversara mesmo com Helguita, por
telefone, na madrugada em que morrera.
—
Eu estou convencido — disse-me Carlos — de que Sara ligou, do além, para a
nossa amiga. Ela já era falecida
há, pelo menos, duas horas, quando o telefone de Helguita tocou. Estou certo
disto. Foi o espírito de Sara que lhe falou, por telefone, naquela madrugada e
somente para fazer o que não pudera em vida, de tão súbita que fora a sua morte: despedir-se da melhor amiga.
Telefonemas
de além-túmulo são raros, mas — especula-se — acontecem. Foi por meio de um deles
que o famoso escritor Coelho Neto (1864 – 1934), até então um cético
empedernido, converteu-se ao espiritismo. Leia
aqui.
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