FLORES DAS TREVAS - Conto Clássico Macabro - Villiers de L’Isle Adam
FLORES DAS
TREVAS
Villiers de L’Isle Adam (1828 – 1889)
Tradução de Paulo Soriano
Ao Sr. Léon
Dierx.
Boa gente, vós que por aqui passais,
Orai
pelos defuntos!
Inscrição
à beira de uma estrada principal.
Oh, belas noites! Diante dos resplandecentes
cafés dos bulevares, nos terraços das renomadas sorveterias, quantas mulheres
com modelitos vistosos, quantos elegantes flâneurs a vaguear!
Aqui
estão as pequenas vendedoras de flores, circulando com suas cestinhas.
As
belas ociosas aceitam essas flores que passam, todas apanhadas... em mistério.
—
Em mistério?
—
Sim, em mistério.
Saibam,
sorridentes leitoras, que existe em Paris certa obscura agência que compactua
com várias funerárias de luxo, e até mesmo com coveiros, a fim de despojar os
mortos pela manhã, impedindo que murchem inutilmente sobre os túmulos frescos
todos esses esplêndidos ramalhetes de flores, essas coroas fúnebres, todas
essas rosas com as quais, às centenas, a piedade filial ou conjugal diariamente
sobrecarrega os catafalcos.
Essas
flores são quase sempre esquecidas após as cerimônias fúnebres. Ninguém mais
pensa nelas; todos têm pressa em partir — é compreensível!...
É
quando os nossos amáveis coveiros se mostram mais alegres. Não esquecem as
flores, esses senhores! Eles não estão nas nuvens. São pessoas pragmáticas. Em
silêncio, arrebatam-nas a braçadas. Atirá-las apressadamente por sobre o muro
em uma propícia carroça é para eles coisa de um instante.
Dois
ou três dos mais travessos e atrevidos transportam a preciosa carga às
floristas amigas que, graças a seus dedos de fada, arranjam de mil maneiras, em
ramalhetes de corpete e de mão, e mesmo em rosas isoladas, esses melancólicos
despojos.
Chegam
então as pequenas floristas noturnas, cada uma com as suas cestinhas. Elas
circulam, como dissemos, às primeiras luzes dos lampiões, pelos bulevares,
diante dos terraços resplandecentes e por mil lugares de prazer.
E
os jovens entediados, desejosos de atraírem as moças elegantes, pelas quais
sentem alguma inclinação, compram essas flores a preços elevados e as oferecem
estas damas.
Estas,
de maquiagem branca, aceitam-nas com um sorriso indiferente e as conservam nas
mãos, ou as enfiam nos seus corpetes.
E
os reflexos dos lampiões empalidecem os seus rostos.
De
sorte que essas criaturas-espectros, assim adornadas com flores da Morte,
carregam, sem saber, o emblema do amor que elas oferecem e do amor que recebem.
Texto integrante da revista bilíngue (português e espanhol) “Relatos Fantásticos”, vol. II. Para acessá-la na íntegra, clique aqui.
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