HAN PING E SUA MULHER - Conto Clássico Sobrenatural - Gan Bao


 

HAN PING E SUA MULHER

Gan Bao

(? - 336)


 

Han Ping, mordomo do rei Kang, casou-se com uma bela mulher chamada He. Certa feita, o rei a viu. Sentindo-se atraído por ela, o rei tomou-a à força. Han Ping, muito ressentido, foi posto na prisão. Foi, ainda, condenado a trabalhar como moço de recados na construção da muralha da cidade. A mulher de Han mandou-lhe, em segredo, uma carta, escrita deliberadamente de forma obscura. Dizia a carta:

“Chove continuamente e o rio torna-se largo e profundo. Tenha cuidado quando o Sol nascer”.

O rei, tendo-a obtido, mostrou a missiva aos seus circundantes ministros. Um deles, chamado Su He, explicou-lhes:

—"Chove continuamente”: significa que ela se encontra muito triste. "O rio torna-se largo e profundo": significa que eles estão agora separados um do outro. "Tenha cuidado quando o Sol nascer": significa que ela está determinada a morrer. Han Ping pensou que ela podia ter morrido e, por isto, suicidou-se.

He, mulher de Han Ping deixou, secretamente, suas roupas apodrecerem. Um dia, o rei levou-a um terraço alto. Prontamente, ela se atirou dali. As pessoas que a rodeavam tentaram segurar-lhe; mas, como as roupas estavam apodrecidas, o pano não resistiu aos puxões.  Rebentando-se no chão, He morreu prontamente.

Em seu cinto, encontraram um bilhete suicida, que dizia:

 "Vossa Majestade quer que eu esteja viva para acompanhá-lo, mas eu prefiro a morte. Gostaria que me enterrassem junto a Han Ping."

Furioso, o rei recusou-se a atender àquele derradeiro pedido. Ordenou aos habitantes locais que a enterrassem, deliberadamente, em frente ao túmulo do marido, mas não juntamente com ele.

— Você e sua esposa se amam infinitamente — disse o rei ao falecido Han Ping. — Se pudessem juntar os seus túmulos, eu não os impediria.

Sucedeu que, de um dia para o outro, duas grandes catalpas brotaram, separadamente, no cimo dos dois túmulos. Em dez dias, aquelas árvores cresceram tão firmemente, que não era possível abraçar qualquer uma delas. As árvores se inclinaram e se tocaram. As raízes entrelaçaram-se por baixo; por cima, os ramos lançaram-se uns aos outros e interpenetraram-se.

Havia dois patos mandarins que pousavam nas árvores dia e noite, sem dali arredar. Entrelaçavam-se pelo pescoço e cantavam tristemente.  O som que as aves faziam era comovente. As pessoas da dinastia Han[1] lamentaram aquele incidente, e deram às árvores o nome de “Árvores do Amor". O nome que se dá a esta espécie de planta tem origem neste fato. As gentes do Sul diziam que os dois pássaros eram as almas de Han Ping e da sua mulher.

Em Suiyang[2] ainda existe um lugar chamado Han Pingheng.  As cantigas sobre esta história de amor ainda se ouvem hoje.

 

Versão em português de Paulo Soriano.



[1] A dinastia Han durou de 206 a.C. até 220 d.C.

[2] Capital da dinastia Song. Hoje, corresponde à cidade de Shangqiu, província de Hanan.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O GATO PRETO - Conto Clássico de Terror - Edgar Allan Poe

O RETRATO OVAL - Conto Clássico de Terror - Edgar Allan Poe

A MÁSCARA DA MORTE ESCARLATE - Conto de Terror - Edgar Allan Poe

BERENICE - Conto Clássico de Terror - Edgar Allan Poe