POE POE NOEL - Conto de Terror - Karoline Thomaz

 


POE POE NOEL

Karoline Thomaz

 

Anoiteceu.

O lúgubre sino bateu.

Anunciando a noite de Natal. 

Uma ocasião em que eu saio para realizar os sonhos juvenis de amor e esperança envolto em minha capa rubra.

Nesta noite eu carrego um saco que pesa mais que a própria culpa. Não é um simples presente; é um fardo, um segredo obscuro que levo entre as dobras vermelhas do manto que me envolve.

Adentro a modesta moradia não por uma chaminé, mas pela porta que se encontra entreaberta. No quarto, o pequeno órfão anseia pelo impossível: a presença materna que a morte lhe roubou.

Mantendo o silêncio e deposito o presente inerte debaixo da árvore enfeitada. A cabeça se recusa a se ajeitar, tomba desamparada para o lado diversas vezes antes de aceitar seu destino. Enquanto arrumo o fardo, próximo a uma poltrona desgastada, um gato preto me observa em silêncio com seu único olho brilhando na escuridão.

Ignoro o julgamento do maldito felino e removo os vermes da face cadavérica, cobrindo parte do crânio exposto com os tufos de cabelo que restaram.

Finalizo o serviço e vou pelo mesmo caminho por onde entrei, deixando para trás o presente que o jovem em fervor me pediu durante o ano e que, em meu ofício, não me permito recusar.

Enquanto voo pelo céu, tomando distância da pequena casa, ouço um grito ecoando pela noite adentro, é o choro aterrorizado da criança. Suponho que não tenha gostado do presente.

No meio do voo um corvo pousa ao meu lado e grasnando em escárnio repete: "Criança ingrata, crianças ingratas e nada mais". Tenho que concordar.

Me distancio o mais rápido que consigo, ainda tenho sonhos para realizar. 


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