O PRÍNCIPE E A OGRA - Conto Clássico de Terror - Autor Anônimo

 

O PRÍNCIPE E A OGRA

(Das Mil e Uma noite)

Autor anônimo

 

Um certo rei, cujo filho era muito dado à caça e à caça, ordenou que um de seus vizires o acompanhasse aonde quer que ele fosse.

Um dia, o jovem partiu à caça, acompanhado pelo ministro de seu pai. Corriam juntos quando um grande animal selvagem apareceu.

— Avante!  Persegue a tua nobre presa! — gritou o vizir ao filho do rei: 

O príncipe seguiu a caça até não mais alcançá-la de vista e, nesta perseguição, perdeu-se em meio à selva.

Confuso, o príncipe não sabia para onde ir.

Todavia, de súbito, apareceu à sua frente uma donzela, que chorava.

 

 


 

— Quem és tu? — perguntou o filho do rei.

— Sou — respondeu a jovem — filha de um rei entre os reis de Hind e viajava numa caravana no deserto quando a sonolência me dominou; então, caí da minha mula involuntariamente, razão por que me encontro isolada do meu povo e profundamente desorientada.

O príncipe, ouvindo tais palavras, compadeceu-se da jovem mulher.  Montando-a na garupa de seu cavalo, seguiu viagem. Ao passar por uma antiga ruína, disse-lhe a donzela:

— Ó, meu amo, desejo obedecer a um chamado da natureza.

O príncipe levou-a à ruína; ela, contudo, demorou tanto que o filho do soberano imaginou que a donzela perdia tempo demais.

Sem que ela soubesse, o príncipe a procurou.

O que encontrou foi um ghulah[1], uma ogra perversa, que dizia à sua prole:

 — Ó meus filhos, hoje lhes trago um belo e rechonchudo jovem para o jantar.

— Traga-o rapidamente para nós, ó nossa mãe — responderam os filhos —, para que, devorando-o, possamos ficar com a barriga cheia.

O príncipe, ouvindo aquela conversa, a tremer de medo, certificou-se da morte certa.

Virando-se, resolveu escapar às carreiras.

O ghulah voltou e, vendo-o muito assustado — pois ele todo tremia —, gritou:

— Por que tens medo?

 — Deparei-me com um inimigo a quem temo muito — respondeu.

— Não dissestes que eras filho do rei? — perguntou-lhe a ghulah.

— Sou. Todavia, ainda assim, corro perigo.

— Não há por que temer. Dá a ele dinheiro e ele ficará satisfeito — disse-lhe o ghulah.

— O meu inimigo não ficará satisfeito com a minha bolsa, mas, somente, com a minha vida. Eu o temo mortalmente e me vergo de diante de tanta opressão.

— Ora, se estás, como achas, deveras angustiado, pede ajuda a Alá, que certamente irá protegê-lo das más ações de teu inimigo e do mal do qual tens medo.

Então o Príncipe ergueu os olhos para o céu e clamou:

— Ó Tu, que atendes ao necessitado, quando ele Te invoca, e dissipas a sua angústia; ó, meu Deus, concede-me a vitória sobre meu inimigo e afasta-o de mim, pois Tu és Todo-Poderoso, e estás acima de todas as coisas!

O ghulah, ouvindo aquela oração, afastou-se dele.

O príncipe voltou para o seu pai e contou-lhe toda a história, inclusive o que sucedera entre ele o ministro. Então o rei convocou o ministro à sua presença e prontamente mandou executá-lo.

 

Versão em português de Paulo Soriano a partir da tradução de Richard Francis Burton (1821 – 1890).

Imagem: PS/Copilot e H. J. Ford (1860 - 1941).



[1] Feminino de ghoul.


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