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Mostrando postagens de fevereiro, 2025

A DAMA DA MORTALHA - Conto de Terror - Paulo Soriano

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A DAMA DA MORTALHA Paulo Soriano     O bebê de tarlatana rosa emborcara no chão  com a caveira voltada para mim, num choro que lhe arregaçava o beiço,  mostrando singularmente abaixo do buraco do nariz os dentes alvos. João do Rio   — Ah, meu jovem Saul! Você é advogado e sabe muito dessa coisa injusta à qual chamamos Direito — disse-me o velho Roberval, numa Terça-Feira de Carnaval. — Deve ter estudado História do Direito, não é mesmo? — Somente um pouco de Direito Romano, confesso. — Sim, sim! — prosseguiu Roberval. — Os jovens não estudam mais essas coisas enfadonhas e antiquadas. Mas estou certo de que você pouco sabe da real “prática jurídica” de outrora. — Isso é verdade. Mas o que tem isto a ver com o Carnaval? — indaguei. — Bem — prosseguiu o ancião, bebericando a cervejinha —, tudo aconteceu, justamente, numa Terça-Feira Gorda. O bloco descera a Federação e passava, agora, à frente do  Campo Santo, o cemitério mais circu...

O BREJO DAS ALMAS - Conto de Terror - Paulo Soriano

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  O BREJO DAS ALMAS Paulo Soriano   O alfange rútilo da lua, Por degolar a nuca nua Que me alucina e que eu não domo!… Evoé Momo! Manuel Bandeira.   Era o anoitecer da Segunda-Feira de Carnaval. Eu estava, de passeio, no Brejo das Almas. — Não há mesmo ninguém na vila? — perguntei. O cego Gumercindo respondeu-me, extraindo um fiapo de fumaça de seu cachimbo de barro: — Não, não há. Faz mais de setenta anos que não há vivalma no velho Brejo das Almas.   — Mas a vila me parece bem conservada. — É verdade. Todos os anos, em janeiro e junho, as Senhoras dos Lilases cuidam de lavar todas as casas e de varrer, cuidadosamente, os paralelepípedos das ruas. A cada cinco anos, em dezembro, tratam de pintar as fachadas, consertar os telhados e reforçar as vigas e caibros das casas. E levam belas flores e água perfumada à igrejinha e ao cemitério. São mesmo devotas, essas pobres senhoras negras. Eu já ouvira rumores acerca de eventos sobrenaturais n...

O BEBÊ DE TARLATANA ROSA - Conto Clássico de Horror - João do Rio

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O BEBÊ DE TARLATANA ROSA João do Rio (1881 – 1921)     — Oh! uma história de máscaras! quem não a tem na sua vida? O carnaval só é interessante porque nos dá essa sensação de angustioso imprevisto... Francamente. Toda a gente tem a sua história de carnaval, deliciosa ou macabra, álgida ou cheia de luxúrias atrozes. Um carnaval sem aventuras não é carnaval. Eu mesmo este ano tive uma aventura... E Heitor de Alencar esticava-se preguiçosamente no divã, gozando a nossa curiosidade. Havia no gabinete o barão Belfort, Anatólio de Azambuja de que as mulheres tinham tanta implicância, Maria de Flor, a extravagante boêmia, e todos ardiam por saber a aventura de Heitor. O silêncio tombou expectante. Heitor, fumando um gianaclis autêntico, parecia absorto. — É uma aventura alegre? — indagou Maria. — Conforme os temperamentos. — Suja? — Pavorosa ao menos. — De dia? — Não. Pela madrugada. — Mas, homem de Deus, conta! — suplicava Anatólio. —...

DESFILE FÚNEBRE - Conto de Terror - Maycon Guedes

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  DESFILE FÚNEBRE Maycon Guedes     A terra das covas movimenta-se, abrindo passagem para que os pútridos defuntos retornem à superfície depois de anos de sono lúgubre. A população de Franco da Rocha, cidade marcada por inúmeros mistérios, foi avisada sobre uma maldição carnavalesca: jamais festejar o carnaval durante a noite de Quarta-Feira de Cinzas. O problema é que, de geração em geração, a tal lenda foi ficando esquecida, e cá estamos, nesse relato onde a mais fúnebre das festas aconteceu. No centro da cidade, três escolas de samba se preparam para começar o desfile, enquanto que, no cemitério não muito longe dali, defuntos macabros se aprontam para a nefasta folia.      Ninguém poderia imaginar que uma linda noite fresca, de céu tão limpo e repleto de estrelas, reservava um acontecimento amedrontador que faria o mundo virar pelo avesso, trazendo o inferno e seus demônios às ruas para participarem do primeiro dia de Quaresma. Folia na cidade; show de h...

O DIABO EM PARIS - Conto Humorístico de Horror - Escritor anônimo do século XIX

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O DIABO EM PARIS Anônimo do séc. XIX Chegando pelo Carnaval a Paris, um jovem provinciano acomodou-se em uma das hospedarias principais. Querendo tomar parte no divertimento dos mascarados, logo que anoiteceu saiu da hospedaria e foi comprar máscara e vestuário correspondente à figura do diabo. Vestindo-se na loja em que tais objeto se vendiam, saiu para o baile do mais próximo teatro, onde se divertiu até as três horas da madrugada, e então regressou à hospedaria sem se lembrar da figura que fazia. Chegou à porta e bateu. Veio uma criada sabor quem era. Porém, assim que viu o hóspede, deitou a fugir assustadíssima, de maneira que não foi possível conseguir que se abrisse a porta. O provinciano, apertado pelo frio, foi rua abaixo, e, vendo uma porta aberta e luz na sala, entrou. Estava no meio da sala um defunto circundado de tochas acesas, e um clérigo assentado em uma cadeira com um rapazinho a seu lado, dormindo ambos ao calor de um braseiro que tinham diante d...

O BARRIL DE AMONTILLADO - Conto Clássico de Horror - Edgar Allan Poe

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  O BARRIL DE AMONTILLADO Edgar Allan Pöe (1809 – 1849) Tradução de Paulo Soriano   Suportei o melhor que pude as mil injúrias de Fortunato; mas, quando estas se convolaram em insulto, eu jurei vingança. Vós, que tão bem conheceis a natureza de minha alma, não havereis de supor, todavia, que eu lhe tenha proferido uma única ameaça. Finalmente, eu me vingaria. E esta era uma resolução definitivamente tomada. Mas tal deliberação, porque definitiva, excluía a ideia de riscos. Eu não deveria apenas puni-lo, mas puni-lo impunemente. Um mal não está definitivamente reparado se a retribuição recai sobre aquele que se vinga. De igual modo, o mal não estará reparado se aquele que se desforra se revela àquele contra quem pratica a vingança. É preciso que se entenda que, nem por palavras nem por atos, dei a Fortunato qualquer motivo para duvidar da minha aparente boa vontade. Continuei, como era meu costume, a sorrir-lhe, sem que ele, todavia, percebesse que, agora, o meu sor...