SEXTA FACE - Conto Fantástico - Conto de Terror - Victoria Garbayo dos Santos Ferreira
SEXTA
FACE
(Victoria Garbayo dos Santos
Ferreira - 13º Lugar no Concurso Bram Stoker de Contos de Terror)
Acenando
para o jovem que passava, chamou:
— Ei,
moleque! Você, de camisa azul, venha cá.
O
rapaz, aturdido pelo chamado repentino e um pouco ofendido por ser chamado de
‘moleque’, tirou os olhos do Iphone e o guardou no bolso da frente.
Virou-se na direção do som e viu o velho no palanque, rodeado por uma pequena
multidão que agora dava meia-volta para encará-lo. Apertou o passo, tirou a
carteira do bolso de trás e guardou junto do celular. ‘Não devia ter entrado
aqui’, pensou, ‘devia ter pedido um Uber quando tive chance’.
— Garoto,
você é surdo? Venha até aqui, vou te mostrar um truque. Eu pago.
A
aglomeração abriu um pequeno corredor para que passasse e alguém o puxou para
dentro. Vendo que a saída já se fechava atrás dele, o garoto chegou à conclusão
de que dinheiro nunca é demais. Ainda, se fosse roubado, seu pai lhe compraria
o Iphone mais recente e poderia se livrar da tralha que levava no bolso.
Subiu
no tablado rústico, que bambeou levemente quando apoiou o peso na outra perna.
O velho perguntou seu nome, ao que respondeu apenas Luís. Ficou em dúvida se
devia incluir o sobrenome, para impor respeito, mas não lhe pareceu adequado. O
bairro não era dos melhores; alguém na multidão certamente o assaltaria quando
estivesse saindo, se soubesse a qual família pertencia.
— Deixa eu
ver sua carteira.
— Para você
pegar e sair correndo? Sem chance. Você falou que me pagava. Quero adiantado.
— É para isso
que preciso da carteira, garoto. Sou um velho mago, multiplico dinheiro. Toda
essa gente quer um pouco, mas não é assim fácil: eu que acho você, você nunca
me acha. Esse é o trato: me dá uma moeda e transformo em quatro. Duas para cá,
duas para lá, nunca mais vejo você, 'tu' nunca mais me vê.
— Só quatro
moedas? Não dá nem para comprar uma Coca. Estou fora, tenho coisa melhor para
fazer. Dá licença, por favor.
Ia
descendo, quando o velho murmurou:
— Se não quiser
parar aí, tem outra opção. Mas saiba que a ganância corrói o coração. Tenho
esse dado, até seis vezes pode rolar. Por cada algarismo vou multiplicar. Mas
se cair o mesmo número, você vai se arrepender. Quem avisa amigo é; melhor você
correr.
Luís
fez as contas. A chance de cair o mesmo número era mínima, podia ganhar muito
dinheiro. Poderia ele mesmo comprar o Iphone X. A última parte do
versinho? Certamente só para rimar.
Seis.
Sorriu,
e jogou de novo.
Seis.
Surpreso,
lançou o dado outra vez.
Seis.
Feliz,
todavia desconfiado, rolou o dado de novo. Agora era impossível tirar mais um
Seis,
a
não ser que estivesse viciado. Como não pensou nisso antes? A ansiedade
embrulhou seu estômago e um calafrio subiu pelo pescoço.
— Este dado
está viciado — disse, trêmulo. — Não vou mais, não vou mais jogar... me deixa
sair... quero ir para casa. Você é um velho charlatão. Me deixa sair, ou te
quebro na porrada.
O
velho apenas sorriu. A mão do garoto abriu contra a vontade. O dado caiu no
chão.
Seis.
As pernas bambearam. Avançou para cima do velho, mas não saiu do
lugar. Tentou correr, mas estava grudado no chão, a respiração acelerada.
Tentou gritar, mas sua boca não se mexeu. Apenas podia assistir a si mesmo
pegando o dado do chão e jogando novamente. Não queria olhar, mas não podia
fechar os olhos.
Seis.
Quando
seus olhos piscaram, viu a si mesmo descendo do palanque e indo para casa. Se
viu alongando as costas, ajeitando o cabelo e rindo. Tentou ir atrás de si, mas
seus joelhos estavam fracos e caiu no chão. Tentou descer do palco e não
conseguia. Suas pernas não obedeciam. Viu seu corpo atravessando a massa de
pessoas e desparecendo na esquina.
A
multidão vibrou.
Victoria Garbayo dos
Santos Ferreira é uma jovem estudante — tem apenas 16 anos — e planeja estudar Biologia
na faculdade, mas sempre se interessou por Literatura e pela escrita. Pensa em
fazer curso superior em Portugal, onde se encontra no momento.
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