UM CRIME ATERRORIZANTE - Narrativa Clássica de Horror - Collin de Plancy

 


UM CRIME ATERRORIZANTE

Collin de Plancy

(1794 – 1881)

Tradução de Paulo Soriano

 

O Tribunal de Justiça de Haute-Marne julgou, em fevereiro de 1857, um caso que tem sua raiz em uma horrível superstição.

 Segundo a acusação, agricultores da comuna de Heuillez-le-Grand viviam numa fazenda isolada e, devido a esse mesmo isolamento, numa tranquilidade que nada parecia perturbar. Todavia, em 21 de janeiro, um crime horrível, talvez único nos anais da justiça, veio a lançá-los no luto e na desolação.

O marido, Jean-Baptiste Pinot, saíra para o trabalho de manhã cedo, e sua esposa, depois de certificar-se de que seu filho de onze meses, que estava deitado em seu berço, dormia profundamente, juntou-se a ele.  Como o celeiro aonde ela iria trabalhar ficava a apenas alguns passos da casa de sua casa, não se preocupou em trancar as portas.

Os afazeres duraram algum tempo. A Sra. Pinot foi primeiro para casa, para se certificar de que a criança ainda dormia. Quão apavorada ela ficou quando viu que o berço estava vazio!

Fizeram-se, imediatamente, buscas, que resultaram inúteis.  Somente no dia seguinte, à tarde, descobriu-se, escondido sob feixes de palha, num estábulo da fazenda, o corpo completamente nu da criança, terrivelmente mutilado.

A cabeça, que havia sido separada do corpo por um instrumento afiado, não pôde ser encontrada. Cortes profundos, feitos em um dos ombros, indicavam que o assassino pretendera cortar o corpo em pedaços, para fazê-lo desaparecer.

O crime fora constatado, mas quem seria o assassino, e que objetivo conduzira o seu braço? A pobre vítima mal tinha onze meses; a suspeita logo recaiu sobre um homem que estava a serviço da fazenda. Os seus antecedentes despertaram aquela desconfiança. Ladrão habitual desde a infância, fora condenado, por furto, a dois anos de prisão e, para escapar à Justiça, mudara de nome; ele havia substituído seu nome de Vautrin por Morisot. Este homem tinha vinte e quatro anos. Era taciturno, buscava o isolamento e havia repetidamente dado provas de fria crueldade. Com a notícia do desaparecimento da criança, Vautrin empalideceu; e, em vez de se lançar ativamente às buscas, como os demais, mostrou-se sombrio e preocupado, tentando direcionar as suspeitas a um criado de seu empregador, que teria raptado a criança para cortar-lhe a cabeça e lavar consigo aquele crânio para os castelos.

Mas essa estranha declaração, feita antes de que alguém soubesse que a cabeça da criança havia sido mutilada, foi uma revelação. Ela indicava o móvel e o objetivo do crime.

Vautrin admitiu, no dia seguinte, que ouvira dizer que o crânio de uma criança assassinada tinha a propriedade de tornar o portador invisível e de permitir que um ladrão, usando aquele crânio como uma lanterna, penetrasse impunemente nas casas. Vautrin acreditava nessa odiosa superstição; assim, ficou explicado o motivo do crime e da mutilação.

Vautrin foi preso. O esclarecedor interrogatório que se seguiu confirmou as suspeitas que pesavam sobre ele. As investigações, ademais, revelaram que, por trás dos arbustos, havia restos de camisas e calças sujas de sangue e lama pertencentes a Vautrin, que as reconheceu como suas. A cabeça da vítima também foi encontrada em um bosque próximo e, a poucos metros de distância, uma velha boina listrada que pertencera ao acusado. Na audiência judicial, Vautrin se fechou, completa e sistematicamente, em negações. Mas os depoimentos das testemunhas foram tão contundentes que o veredicto do júri foi afirmativo e sem atenuantes, pelo que Vautrin foi condenado à pena de morte. 


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