A JOVEM DAMA ESTRANGULADA PELO DIABO - Conto Clássico de Terror - Charles Nodier
A JOVEM DAMA
ESTRANGULADA PELO DIABO
Charles Nodier
(1870 – 1844)
Tradução de Paulo Soriano
A
seguinte história aconteceu no dia vinte e sete de maio de 1582. Vivia em
Antuérpia uma jovem e bela dama, amável, rica e de boa família; como isto a
deixava altiva e orgulhosa, ela dedicava-se apenas, dia após dia, a encontrar
um meio de agradar, com suas roupas suntuosas, a uma infinidade de jovens
elegantes que a cortejavam.
Essa
donzela foi convidada, segundo o costume, para o casamento de um amigo de seu
pai. Como ela não queria estar ausente, e estava ansiosa para comparecer à festa para superar em beleza e graça todas as outras
damas e donzelas presentes às bodas, preparou seus mais ricos vestidos, providenciou
o ruge com o qual desejava se maquiar à maneira das italianas, e — como as flamengas gostam especialmente de
linho fino — mandou fazer quatro ou cinco golas rufadas, cujo aune[1]
custava nove coroas. Quando estavam prontas, ela mandou chamar uma habilidosa passadeira
e ordenou que engomasse duas golas para o dia do casamento e o seguinte,
prometendo-lhe o pagamento de vinte e quatro soldos.
A
passadeira fez o que pôde, mas as golas não agradaram à jovem dama. Assim,
convocou outra profissional, a quem entregou as golas e o chapéu para serem
engomados, prometendo-lhe um escudo se tudo ficasse a seu gosto. Esta segunda
engomadeira usou toda sua habilidade para obter um bom resultado; todavia, não
conseguiu satisfazer à jovem, que, irritada e furiosa, rasgou e atirou pela sala
suas golas e chapéus, blasfemando o nome
de Deus, e jurando que preferia que o diabo a levasse a ter que ir ao casamento
vestida daquela maneira.
Mal
acabara a pobre garota de proferir estas palavras, o diabo, que estava à
espreita, tendo assumido a aparência de um de seus mais queridos admiradores, apresentou-se
a ela com um rufo maravilhosamente engomado em torno do pescoço, e vestido da
última moda. A jovem, enganada, e acreditando que estava falando a um de seus favoritos,
disse-lhe gentilmente:
—
Meu amigo, quem preparou tão bem os seus rufos? Era assim que eu queria os meus.
O espírito maligno respondeu que ele mesmo os havia preparado e, depois, os tirou do pescoço e os colocou graciosamente em torno do da donzela, que não conseguiu conter sua alegria de ver-se assim tão bem adornada. Depois de ter abraçado a pobre garota pela cintura, como se fosse beijá-la, o perverso demônio soltou um grito horrível, torceu miseravelmente o seu pescoço e deixou-a, sem vida, no chão.
O
grito foi tão terrível que o pai da jovem dama e todos aqueles que estavam na
casa conceberam, ao ouvi-lo, o presságio de algum infortúnio.
Correram
todos ao quarto, onde encontraram a donzela rígida e morta, com a face e o
pescoço negros e feridos. Sua boca, azulada, estava desfigurada de tal forma
que todos recuaram de horror.
O
pai e a mãe, depois de terem-se lamentado, aos prantos, por um longo tempo,
ordenaram que sua filha fosse colocada em um caixão e, para evitar a desonra
que temiam, deram a entender que sua filha havia morrido, repentinamente, de
apoplexia. Mas tal incidente não poderia ser mantido em segredo. Pelo
contrário, era necessário que a verdade se manifestasse a todos, a fim de
servir de exemplo. Tendo o pai realizado todos os preparativos para o enterro da
filha, descobriu que quatro homens fortes e robustos não conseguiam erguer, nem mesmo mover, o caixão em que jazia aquele
cadáver infeliz.
Dois
outros carregadores robustos foram trazidos para juntar-se aos quatro primeiros;
mas em vão, pois o caixão era tão pesado que não permitia o mínimo movimento:
era como se tivesse sido pregado firmemente ao chão. Os circunstantes, apavorados,
pediram que o caixão fosse aberto, o que foi feito imediatamente.
Então
— oh, prodígio terrível! —, nada encontraram no caixão, salvo um gato preto,
que fugiu à pressa e desapareceu, sem que ninguém soubesse que destino tomou. O
caixão permaneceu vazio; a desgraça da jovem mundana foi revelada, e a Igreja
não lhe concedeu as orações devidas aos defuntos.
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