A BRUXA FANTASMA - Conto Clássico de Terror - Bob W. Holland

 


A BRUXA FANTASMA

Bob W. Holland

(1868 – 1932)

Tradução de Paulo Soriano

 

Certa noite, num velho castelo, a conversa girava em torno de aparições fantasmagóricas, e cada um dos participantes contava a sua uma história. À medida que os relatos ficavam mais terríveis, as jovens mais se aconchegavam.

— Você já teve uma aventura com um fantasma? — elas me perguntaram. — Conhece uma história que nos faça estremecer? Vamos, conte-nos alguma coisa!

— Estou bastante disposto a atendê-las — respondi.  — Vou contar-lhes um incidente acontecido comigo.

No final do outono de 1858, visitei um de meus amigos, subprefeito de uma cidadezinha no centro da França. Albert era um velho companheiro de minha juventude e eu estivera presente no seu casamento. Sua encantadora mulher era cheia de bondade e graça. Meu amigo queria mostrar-me seu lar feliz e me apresentar às suas duas lindas filhinhas.  Fui muito bem acolhido e recebi um ótimo tratamento. Três dias depois da minha chegada, eu já conhecia toda a cidade, curiosidades, castelos antigos, ruínas etc. Todos os dias, por volta das quatro horas, Albert encomendava o faetone, e nós fazíamos um longa viagem, voltando para casa à noite.

Certa noite, meu amigo me disse:

— Amanhã iremos mais longe do que de costume. Eu quero levá-lo às Pedras Negras. São velhas e curiosas pedras druídicas, situadas numa planície selvagem e desolada. Elas vão despertar o seu interesse. A minha mulher ainda não as conhece; assim, vamos levá-la conosco.

No dia seguinte, partimos na hora costumeira. A esposa de Albert sentou-se ao seu lado. Eu ocupei o banco de trás, sozinho. O tempo estava cinzento e sombrio naquela tarde e a viagem não foi muito agradável. Quando chegamos às Pedras Negras, o Sol já se punha.  Saímos do faetone e Albert cuidou dos cavalos.

Caminhamos um pouco pelos campos antes de chegar aos gigantescos resquícios da antiga religião druídica. A mulher de Albert quis subir ao topo do altar e eu a ajudei. Ainda posso ver sua graciosa figura, envolta num xale vermelho, com o véu flutuando ao seu redor.

— Como é belo! Mas não nos deixa um tanto melancólicos? — disse ela, estendendo a mão em direção ao horizonte sombrio, semi-iluminado pelos últimos raios do Sol.

O vento da tarde soprava violentamente e suspirava por entre as árvores raquíticas, que cresciam ao redor dos cromeleques de pedra. Não havia uma habitação e nem um ser humano à vista. Apressamo-nos para descer e, em silêncio, refizemos nossos passos até a carruagem.

— Precisamos nos apressar — disse Albert. — Vejo o tempo ameaçador, e mal conseguiremos chegar em casa antes que anoiteça.

Envolvemos cuidadosamente o xale em torno de sua esposa. Ela amarrou o véu em volta do rosto e os cavalos puseram-se a trotar rapidamente. Escurecia: a paisagem ao nosso redor estava nua e desolada; aqui e ali, aglomerados de abetos e sarças de tojo formavam a única vegetação. Começamos a sentir frio, pois o vento soprava furiosamente. O único som que ser ouvia era o trote constante dos cavalos e o tilintar nítido e agudo de seus sinos.

De repente, senti o aperto de uma mão em meu ombro. Virei a cabeça rapidamente. Uma horrível aparição se apresentou diante de meus olhos. No lugar vazio ao meu lado, estava uma mulher horrível. Tentei gritar. O fantasma colocou os dedos sobre os lábios para me impor silêncio. Não consegui emitir um ruído sequer. A mulher, de cabeça coberta, vestia-se de linho branco. Em seu rosto grassava uma lividez cadavérica e, no lugar dos olhos, havia horrendas cavidades negras.

Ali permaneci sentado, imóvel, dominado pelo terror.

 De repente, o fantasma se ergueu e se inclinou sobre a jovem esposa. O espectro a envolveu com os braços e baixou a hedionda cabeça, como se fosse beijar-lhe a testa.

— Que vento! — gritou Madame Albert, virando-se precipitadamente para mim. — Meu véu está rasgado.

Quando ela se virou, senti a mesma pressão infernal no meu ombro, mas o lugar ocupado pelo fantasma estava vazio. Olhei para a direita e para a esquerda — a estrada estava deserta, nenhum objeto à vista.

— Que vendaval terrível! — disse Madame Albert.  — Você o sentiu? Não consigo explicar o terror que se apoderou de mim. Meu véu foi rasgado pelo vento, como se por uma mão invisível. Ainda estou tremendo.

— Deixe para lá — disse Albert, sorrindo. — Embrulhe-se, minha querida. Em breve estaremos nos aquecendo com um bom lume em casa. Eu estou faminto.

Uma transpiração fria cobriu minha testa. Um arrepio percorreu-me o corpo. Minha língua cravou-se no céu da boca e não consegui articular um som. A dor aguda no ombro era a única evidência palpável de que eu não fora vítima de uma alucinação. Pondo a minha mão em meu ombro dolorido, senti um rasgão no sobretudo que o cobria. Eu olhei para o pano: havia cinco buracos perfeitamente distintos — vestígios visíveis da constrição aplicada pelo fantasma hediondo. Pensei por um momento que iria morrer ou que minha razão iria me abandonar. Foi — creio eu — o momento mais terrível da minha vida.

Finalmente, acalmei-me um pouco. Aquela aflição sem nome havia durado apenas alguns minutos. Não creio que seja possível a um ser humano sofrer mais do que sofri naquele dia. Assim que recuperei meus sentidos, pensei, a princípio, em contar a meus amigos tudo o que havia acontecido, mas hesitei. Por fim, não o fiz, receoso de que a minha história assustasse Madame Albert. Além disto, eu tinha a certeza de que meu amigo não acreditaria em mim. As luzes da cidadezinha me reanimaram e, aos poucos, a opressão do terror, que me dominava, se tornou mais suave.

Assim que chegamos em casa, Madame Albert desatou o véu. Estava ele literalmente em pedaços. Eu esperava encontrar minhas roupas inteiras e provar a mim mesmo que fora tudo produto de minha imaginação. Mas não: o pano estava rasgado em cinco lugares, exatamente onde os dedos agarraram o meu ombro. Não havia nenhuma marca em meu corpo, embora, em minha carne, perdurasse uma dor monótona.

Voltei a Paris no dia seguinte. Lá, eu me empenhei em esquecer a estranha aventura. Ou, pelo menos, quando me vinha à memória o acontecido, eu me forçava a acreditar em que tudo não passara de uma alucinação.

No dia seguinte ao meu retorno, recebi uma carta de meu amigo Albert. Estava com a borda preta. Abri o envelope com um vago temor.

Sua esposa havia morrido no dia em que eu retornei a Paris.

 


Comentários

  1. Muito boa a tradução e o conto, aqui é o Roger! Este é o conto de terror clássico no formato, tamanho e essência! A bruxa ficou com raiva da moça que ficou em cima do altar...

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Gosto muito deste conto. Você disse tudo. Daria, além disso, uma boa adaptação para HQ.

      Excluir
  2. Que elementos presentes no texto faz dele uma história assustadora?

    Minha professora me perguntou isso e eu não sei responder Kkkkkkk ��

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

A MÁSCARA DA MORTE ESCARLATE - Conto de Terror - Edgar Allan Poe

O RETRATO OVAL - Conto Clássico de Terror - Edgar Allan Poe

A MULHER ALTA - Conto Clássico de Terror - Pedro de Alarcón

O CORAÇÃO DELATOR. Conto clássico de terror. Edgar Allan Poe