O VENTRÍLOCO - Conto Clássico de Mistério - Joseph Taylor e Adrianus Turnebus
O VENTRÍLOCO
Joseph Taylor (séc. XIX) e Adrianus
Turnebus (1512 – 1565)
Tradução de Paulo Soriano
O
fato seguinte é relatado por Adrianus Turnebus, o maior crítico do século XVI,
e que era admirado e respeitado por todos os eruditos da Europa.
“Havia
um sujeito astuto — diz ele — chamado Petrus Brabantius, que, quantas vezes
quisesse, falava a partir do ventre, com a boca de fato entreaberta, mas conservando
os lábios imóveis. Eu mesmo testemunhei tal artimanha com olhos e ouvidos.
Desta forma, ele induzia à fraude, constantemente, diversas pessoas. Dentre outras, o engodo que se segue é muito
conhecido.
Havia
um comerciante de Lyon, há pouco falecido, que havia adquirido uma grande
fortuna por meio de negócios escusos. Brabantius, estando em Lyon, e sabendo
disto, foi, certo dia, ao encontro de Cornutus, filho e herdeiro do finado,
enquanto este caminhava sob um pórtico, atrás do pátio da igreja.
Brabantius
disse a Cornutus que havia sido enviado para informá-lo sobre o que deveria ser
feito em prol do pai falecido, afirmando-lhe que era necessário pensar em sua
alma e reputação, e não estar a vagar pelo adro, lamentando a sua morte.
Num
instante, enquanto conversavam, ouviu-se uma voz, como se fosse a do pai,
embora, na verdade, procedesse do peito do embusteiro. Brabantius parecia
terrivelmente assustado. A voz informou ao filho o estado em que o seu pai
estava por causa de sua injustiça em vida; que torturas suportava no
purgatório, tanto por conta própria, quanto por conta de seu filho, a quem ele
havia instituído como herdeiro de bens ilicitamente obtidos; que nenhuma
liberdade esperava, até que a justa expiação fosse feita, mediante donativos
aos mais necessitados, e estes seriam os cristãos sequestrados pelos turcos.
Disse que o filho deveria depositar toda a confiança no homem que, por especial
providência, agora vinha até ele, para que o dinheiro fosse empregado por
pessoas pias no resgate de tantos cativos em Constantinopla.
Cornutus,
que era um bom homem, mas permanecia relutante em se desfazer de seu dinheiro,
disse a Brabantius que meditaria sobre tudo aquilo, e que desejava encontrá-lo,
no dia seguinte, no mesmo lugar.
Nesse
meio tempo, começou a suspeitar que poderia haver alguma fraude no local, pois
era um antro sombrio, escuro e propício a ecos e outros delírios.
No
dia seguinte, portanto, Cornutus levou Brabantius a uma planície aberta, onde
não havia arbustos ou urzes. Mas, apesar de todas aquelas precauções, voltou a
ouvir a mesma história, salvo por um acréscimo: que deveria entregar
imediatamente a Brabantius seis mil francos e mandar rezar três missas diárias
em prol de seu pai. Se não o fizesse, a miserável alma do finado comerciante
jamais poderia ser libertada.
Cornutus,
assim obrigado pela consciência, senso de dever e religião, mas com relutância,
entregou-lhe o dinheiro. Contudo, não exigiu recibo ou a presença de qualquer
testemunha do pagamento que fizera.
Tendo-o
assim dispensado, e não tendo mais notícias de seu pai, Cornutus tornou-se um
pouco mais airoso.
Um
dia, alguns amigos, que jantavam em sua casa, observaram aquela mudança. O
anfitrião lhes contou o que lhe havia acontecido. Quando os amigos escarneceram
de tamanha credulidade, já que o anfitrião fora pura e simplesmente enganado —
entregando assim, por nada, o seu dinheiro —, Cornutus, triste e contrariado,
faleceu poucos dias depois do incidente.”
Fonte:
“Apparitions; or, The Mystery of Ghosts, Hobgoblins, and Haunted Houses
Developed”, Lackington, Allen, and Co., Londres, 1815.
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