SOCORRO NA NEVE - Narrativa Clássica Sobrenatural - Horace Bushnell
SOCORRO NA NEVE
Horace Bushnell
(1802 – 1876)
Tradução de Paulo Soriano
Eu
estava sentado perto da lareira, numa noite tempestuosa de novembro, no salão
de um hotel em Napa Valley, Califórnia, quando entrou um senhor muito venerável
e de benigna aparência, acompanhado pela esposa. Reuniram-se eles ao nosso
círculo.
O estranho, como soube mais tarde, era o
capitão Yount, que viera à Califórnia, como caçador, há mais de quarenta anos.
Ali
ele viveu, afastado do grande mundo e de seus problemas, adquirindo uma imensa
propriedade fundiária, e tornando-se uma espécie de venerável patriarca na
região. Sua figura era alta e viril, e seu olhar era gracioso e paternal. Aquela
fisionomia pouco sofisticada — como se ele, em sua vida, jamais tivesse ouvido
falar de dúvida ou questão filosófica — marcava-o como um verdadeiro patriarca.
Não
sei por que motivo, a conversa girou sobre o espiritismo e a necromancia
moderna. Ele revelava uma certa inclinação à crença nos mistérios relatados. A
sua mulher — bem mais jovem que ele e aparentemente cristã — insinuou que,
provavelmente, o marido estava predisposto a essa espécie de crença devido a uma
experiência própria muito peculiar; evidentemente, exprimiu o desejo de que ele
fosse convidado a uma discussão inteligente, dirimente de certas dúvidas.
A
meu pedido, ele me contou sua história.
Há
cerca de seis ou sete anos, numa noite de pleno inverno, ele tivera um sonho em
que descortinava o que parecia ser um grupo de emigrantes preso pelas neves das
montanhas. Pereciam rapidamente de frio e fome.
Viu
que o ambiente era marcado por uma enorme elevação perpendicular, formando um penhasco
de rocha branca. Viu os homens cortando o que pareciam ser copas de árvores,
que saíam de profundos golfos de neve. Distinguiu, mesmo, as características
das pessoas, e, em cada uma delas, imprimia-se uma expressão angustiosa. Acordou
profundamente impressionado com a clareza e a aparente realidade de seu sonho.
Por fim, adormeceu. Mas aquele mesmo sonho se repetiu.
De
manhã, não tendo conseguido livrar-se do sonho, o capitão procurou expulsá-lo da
mente.
Pouco
depois, encontrou-se com um velho amigo, e lhe narrou o que sonhara. O camarada
ficou profundamente impressionado por reconhecer, sem hesitação, o cenário
descrito naquele sonho. Com efeito, o amigo, que já havia atravessado a serra pela
passagem de Carson Valley, declarou que um ponto daquele trecho correspondia
exatamente à sua descrição. Com isso, o patriarca — homem simples — tomou uma
decisão. Imediatamente, reuniu um grupo de homens, com mulas e cobertores,
munido de todas as provisões necessárias.
Os
vizinhos, entretanto, riam-se da sua credulidade.
—
Não importa — disse ele. — Eu sou bem capaz de realizar o que preciso fazer. E
o farei. Sem dúvida, realmente acredito que o perigoso incidente está de
plenamente de acordo com meu sonho.
Os
homens foram enviados para as montanhas, a cento e cinquenta milhas de
distância, diretamente para Carson Valley Pass. Lá, encontraram o grupo, que
exibia, exatamente, as mesmas condições retratadas no sonho.
O grupo foi resgatado com vida.
Fonte: Nature and
the Supernatural, citado por Robert Dale Owen em Footfalls on the
Boundary of Another World, de 1865.
Ilustrações: Caspar
David Friedrich (1774 – 1840) e Francisco Goya (1746 – 1828)
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